Faço R$ 8 mil trabalhando 4 dias da semana. Meu custo operacional é de 25%, ou seja, lucro R$ 6 mil

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Entrevista
Conversas com especialistas, gestores e profissionais do setor, com perguntas conduzidas pela equipe do 55content.
Homem dentro de um carro com expressão séria, encostando a mão no rosto e olhando diretamente para a câmera.
Foto: Reprodução/ Gustavo, Uber do Varão

Gustavo Oliveira, conhecido como Uber do Varão, começou sua trajetória como motorista de aplicativo em busca de uma solução para realizar o sonho de ter um carro próprio. O que começou como uma forma de complementar sua renda logo se transformou em sua principal atividade. Com o tempo, ele percebeu que o sucesso na profissão dependia não apenas de esforço, mas também de entender os algoritmos e estratégias que influenciam os ganhos dos motoristas.

Ao identificar que muitos profissionais enfrentavam dificuldades por falta de conhecimento, Gustavo decidiu compartilhar suas experiências por meio de conteúdos digitais. Criou um canal no YouTube e expandiu sua atuação para o Instagram, com o objetivo de ensinar boas práticas e auxiliar os motoristas a alcançarem melhores resultados. 

Nesta entrevista, ele fala sobre os desafios da profissão, sua rotina como influenciador e a importância de trabalhar com planejamento e critério no setor de aplicativos de transporte.

Gustavo, nossa conversa tem como objetivo entender um pouco sobre o trabalho dos influenciadores. Então, para começar, como você se tornou motorista de aplicativo?

Gustavo: Bom, minha entrada como motorista de aplicativo aconteceu em um momento em que eu trabalhava como encarregado de logística, minha área de formação. Na época, eu queria muito ter um carro próprio, mas o meu salário não permitia pagar as parcelas sem pesar no orçamento. Foi aí que conversei com minha esposa e decidi começar a trabalhar como motorista de app. Meu plano era usar o dinheiro das viagens para pagar o carro, sem depender do meu salário principal.

Com o tempo, fui percebendo que esse trabalho era melhor do que eu imaginava. É comum ver mais críticas do que elogios sobre a profissão, especialmente nas redes sociais. Mas, na prática, as coisas não são bem assim. Muitas pessoas falam mal porque não entendem como trabalhar de forma eficiente. Não existe uma fórmula mágica; o segredo está em aprender a lidar com os algoritmos das plataformas. Quando você entende como eles funcionam, sua rotina melhora: você trabalha menos e ganha mais.

E o que te levou a se tornar influenciador?

Gustavo: Percebi que muitos motoristas iniciantes não têm ideia de como o sistema funciona, e isso acaba impactando negativamente até quem trabalha de forma correta. Como mencionei, os algoritmos das plataformas influenciam diretamente no rendimento, seja pelo desempenho individual ou coletivo. Quando alguém trabalha de forma errada, isso pode prejudicar a média geral da região, afetando os demais motoristas.

Então, decidi criar um canal no YouTube para compartilhar meu conhecimento e ajudar outros motoristas a entenderem como trabalhar da maneira certa. Meu objetivo nunca foi ser influenciador, mas sim ensinar. Depois, migrei para o Instagram, onde o alcance das postagens é maior e mais dinâmico. As coisas acabaram acontecendo naturalmente, e minha intenção principal sempre foi ajudar a categoria.

E como você equilibra sua rotina entre gravar vídeos e trabalhar como motorista de app?

Gustavo: Geralmente, separo um dia da semana para gravar. Hoje em dia, com a prática, o processo ficou bem mais rápido. Antigamente, levaria até 15 dias para finalizar um vídeo, mas agora consigo gravar dois vídeos em um único dia e usar outro para edição.

Para o YouTube, o processo é mais trabalhoso, pois envolve cortes e uma edição mais elaborada. Já os vídeos para o Instagram são curtos e exigem edições simples, o que facilita bastante. Isso permite que eu mantenha um bom fluxo de postagens, mesmo com uma rotina puxada. A prática faz toda a diferença; depois que você pega o jeito, tudo fica mais simples. Às vezes, consigo editar ou postar algo até em momentos mais descontraídos, como quando estou no banheiro!

Gustavo, atualmente, quantas horas você trabalha como motorista? Você segue alguma meta diária?

Gustavo: Minha meta diária aqui em Recife é de R$400 a R$500 nos dias em que trabalho. Costumo trabalhar de segunda, sexta, sábado e domingo, e folgo na terça, quarta e quinta. Essas folgas são importantes porque tenho compromissos na igreja — sou cristão — e também preciso de tempo para gravar e editar conteúdos.

Nos dias em que trabalho, procuro alcançar essa média de R$450 a R$500 por dia, o que me dá cerca de R$2.000 na semana. No mês, isso resulta em aproximadamente R$8.000 brutos. Meu custo operacional gira em torno de 25%, então, líquido, consigo cerca de R$6.000 por mês. Claro que isso pode variar; já tive semanas em que fiz R$2.500 ou R$2.800, mas mantenho essa meta de R$500 nos dias em que trabalho.

E quantas horas por dia você costuma trabalhar?

Gustavo: Geralmente, trabalho cerca de 12 horas por dia. Dependendo do dia, pode ser mais ou menos. Por exemplo, no domingo passado, trabalhei 8 horas, no sábado umas 10, e na segunda foram 13 horas. Faço um controle financeiro rigoroso e, em média, chego a 12 horas diárias.

Você é motorista desde quando?

Gustavo: Comecei no final de 2017, mas considero oficialmente a partir de 2018, para arredondar.

Você acha que era mais fácil ser motorista no passado? Era mais lucrativo?

Gustavo: Não, e vou te explicar por quê. No passado, eu não tinha o conhecimento que tenho hoje. Muitos motoristas, tanto os que começaram antes quanto os que começam agora, enfrentam dificuldades para fazer dinheiro porque não sabem como o sistema funciona.

Hoje, o algoritmo da Uber está muito mais inteligente. Se um motorista começa a aceitar corridas ruins repetidamente, ele acaba “ensinando” o algoritmo a enviar apenas esse tipo de corrida para ele. Isso prejudica os ganhos a longo prazo. É por isso que sempre falo que o motorista precisa ter critério ao escolher as corridas.

Que tipo de critério você utiliza para escolher as corridas?

Gustavo: O critério principal é manter meu custo operacional abaixo de 30%. Por exemplo, se faço R$100, o custo para isso não pode ultrapassar R$30. Meu lucro líquido deve ser de pelo menos 70%. Isso envolve escolher bem as corridas, se posicionar de forma estratégica e ter um bom controle financeiro.

Se o motorista trabalha dessa forma desde o início, ele evita muitos problemas e pode crescer no longo prazo. Quando comecei, tive que aprender tudo na prática, mas se eu tivesse o conhecimento que tenho hoje, com certeza já estaria na categoria Black e com outro carro.

Entendi. Então, o principal desafio para quem está começando é lidar com a quantidade de informações e aprender a trabalhar da maneira correta?

Gustavo: Exatamente. Hoje, tem muita informação na internet, e isso pode confundir quem está começando. O motorista precisa saber filtrar o que é verdadeiro e útil. Para quem entra no ramo sem experiência e sem orientação, é muito fácil tomar decisões que prejudicam os ganhos a longo prazo. É por isso que sempre enfatizo a importância do planejamento e do aprendizado contínuo.

Gustavo, quais são os maiores desafios de ser influenciador? Você diria que é conciliar o tempo, lidar com as críticas ou manter a criatividade para criar novos vídeos?

Gustavo: O maior desafio como influenciador é falar a verdade e perceber que muitas pessoas simplesmente não acreditam. Isso está diretamente ligado às críticas. Concilio bem o tempo, consigo criar conteúdos gratuitos para o público e organizar minha rotina. No entanto, na nossa classe de motoristas de aplicativo, há uma resistência grande.

Muitos acham que sabem tudo, mesmo que estejam trabalhando de forma errada. Por exemplo, o cara começa a trabalhar, faz R$300 ou R$400 em um dia, mas gasta R$200 com combustível e acha que está ganhando muito dinheiro. Quando você tenta explicar que o custo operacional está levando metade do que ele ganha, ele resiste em aceitar.

Outro ponto difícil é a quantidade de críticas que recebo. Recentemente, postei um vídeo no Instagram que já ultrapassou 4 mil comentários. Muitos são comentários absurdos, e, quando converso diretamente com essas pessoas, percebo que algumas nem sequer sabem o que estão fazendo. Isso complica, porque tentamos compartilhar conhecimento, aprendendo e filtrando o que é útil, mas uma boa parte do público rejeita.

Motoristas de aplicativo, em especial, são muito resistentes a aprender e evoluir. Vejo influenciadores de outras áreas, como editores de vídeo e foto, que não enfrentam esse tipo de resistência. Por isso, a crítica, muitas vezes sem fundamento, é o maior obstáculo.

E quais você considera as maiores dificuldades enfrentadas pelos motoristas de aplicativo hoje? Estou falando sobre taxas, mudanças no sistema da Uber e a questão da dinâmica, que muitos dizem ser menos frequente agora.

Gustavo: Essa é uma ótima pergunta. Eu dividiria em duas partes: as dificuldades do trabalho em si e os desafios operacionais dos aplicativos.

No dia a dia, a maior dificuldade é a segurança. Infelizmente, plataformas como Uber e 99 não oferecem informações ou suporte suficientes para trabalharmos de forma segura. Um exemplo recente: um passageiro vomitou no meu carro. Mesmo com a filmagem como prova, a Uber não me reembolsou. Só conseguiria algo entrando na Justiça, o que é um grande transtorno.

Além disso, há problemas no trânsito e situações absurdas com passageiros. Já vi casos em que passageiros exigiam que o motorista os deixasse dentro do prédio, mesmo sem justificativa, como idade avançada ou problemas de mobilidade.

Quanto aos desafios operacionais, um dos maiores problemas é a falta de paciência dos motoristas. Muitos não esperam por corridas que valem a pena. Se passam 10 minutos sem corrida, aceitam qualquer coisa, mesmo sabendo que isso prejudica seus ganhos. Até motoristas experientes cedem à pressão dos aplicativos.

Se todos os motoristas fossem mais seletivos, a própria plataforma aumentaria os valores das corridas. O algoritmo da Uber reajusta automaticamente o preço quando muitos motoristas rejeitam uma viagem. Já conversei com passageiros que confirmam isso: quando uma corrida não é aceita, ela é cancelada e, ao ser solicitada novamente, o valor aumenta.

Infelizmente, muitos motoristas aceitam viagens com tarifas muito baixas, o que acaba prejudicando toda a categoria. Se houvesse mais paciência e critérios para escolher corridas, nossa realidade seria completamente diferente. Por isso, insisto que aprender a trabalhar com o algoritmo é fundamental.

Então, a paciência e o conhecimento sobre como o algoritmo funciona são fundamentais para o sucesso no trabalho?

Gustavo: Exatamente. A Uber trabalha com algoritmos. Se ninguém aceitar corridas com valores baixos, o sistema ajustará o preço. É simples assim. Hoje, a falta de dinâmicas e promoções se deve ao fato de que muitos motoristas aceitam qualquer corrida, sem avaliar o custo-benefício.

Se todos escolhessem melhor, recusassem viagens que não valem a pena e tivessem mais paciência, o mercado seria mais vantajoso para todos. Mas, enquanto isso não acontece, continuaremos enfrentando essas dificuldades operacionais.

Gustavo, para finalizarmos a nossa conversa, que dica você daria para quem está começando a trabalhar como motorista de aplicativo? E poderia deixar também uma mensagem final para os motoristas?

Gustavo: Minha principal mensagem para os motoristas, tanto os que estão começando quanto os mais experientes, é: não ceda à pressão. As plataformas, como Uber, 99 e inDrive, sempre criam atualizações e mecanismos que, psicologicamente, forçam os motoristas a aceitar corridas ruins.

Um exemplo é o programa Uber Pro, que usa gatilhos mentais para criar a sensação de valorização com títulos como “Diamante”, “Platinum” ou “Ouro”. No entanto, esses programas não trazem reais benefícios. Muitos motoristas, principalmente os menos experientes ou mais idosos, acabam aceitando corridas de baixo valor por acharem que estão sendo recompensados de alguma forma.

Minha dica é: sejam pacientes, escolham as melhores corridas e aprendam a se posicionar. O segredo não está apenas no valor da corrida, mas em avaliar se aquela viagem vai te colocar em uma boa região para novas oportunidades. Esse cuidado faz uma diferença enorme no faturamento ao final do dia.

Para quem está começando, eu diria: siga influenciadores que trabalham com aplicativos e absorva o máximo de conhecimento possível, mas sempre filtre o que é dito e veja o que se aplica à sua realidade. Além disso, tenha paciência, controle financeiro e use aplicativos para gerenciar seus ganhos e custos. Com essas ferramentas e aprendendo a trabalhar da forma correta, você conseguirá obter bons resultados e evitará pagar para trabalhar, que é o que acontece com quem entra despreparado.

Para você, ainda vale a pena ser motorista de aplicativo?

Gustavo: Sem dúvida. Hoje, recebo propostas de empresas multinacionais para trabalhar em outros estados, mas nenhuma delas compensa. Por exemplo, já me ofereceram um cargo na área de gestão com salário de R$2.800. Comparando isso com o que ganho como motorista, cerca de R$6.000 líquidos por mês — mesmo descontando os custos operacionais —, não faz sentido.

Além disso, a flexibilidade que o trabalho oferece é algo que não tem preço. Posso folgar quando quiser, ajustar meus horários e até tirar uma semana inteira de folga, como fiz em janeiro, sem comprometer meus ganhos mensais. Para mim, considerando a situação econômica do Brasil, ser motorista de aplicativo ainda é uma das melhores opções, desde que você saiba trabalhar corretamente.

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Giulia Lang

Giulia Lang é líder de conteúdo do 55content e graduada em jornalismo pela Fundação Cásper Líbero.

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