Conseguíamos dinâmicos de R$15 ou R$20. Hoje, mal chegam a R$2 ou R$3: como é ser motorista de app em Vitória?

Ser motorista de aplicativo em Vitória, Espírito Santo, é um desafio que exige dedicação e planejamento.

ponto de exclamacao .png
Entrevista
Conversas com especialistas, gestores e profissionais do setor, com perguntas conduzidas pela equipe do 55content.
Homem sorridente de barba e cabelo curto, vestindo camisa preta com listras finas brancas, posando em frente a uma cortina branca.
Foto: Lincoln Lima para 55content

Ser motorista de aplicativo em Vitória, Espírito Santo, é um desafio que exige dedicação e planejamento. Lincoln Lima, que atua nessa área há dois anos e meio, compartilhou sua rotina, estratégias de trabalho e as dificuldades enfrentadas no dia a dia. 

Em um cenário onde os custos aumentam e as tarifas permanecem estagnadas, ele reflete sobre as mudanças no setor, as expectativas para o futuro e os desafios de quem busca sustentar-se com esse trabalho. Confira abaixo a entrevista completa:

Para começar, há quanto tempo você trabalha como motorista de aplicativo e como foi a sua trajetória até chegar a esse trabalho?

Lincoln: Eu trabalho como motorista de aplicativo aqui em Vitória há dois anos e meio. Antes disso, eu tinha uma loja na Bahia. Depois, me mudei para o Espírito Santo e comecei a trabalhar nessa área.

Agora, conta um pouco sobre sua rotina. Quais são seus horários de trabalho? Você tem algum dia fixo de folga?

Lincoln: Geralmente, trabalho das 8h da manhã até às 8h da noite, com uma pausa de mais ou menos uma hora e meia para o almoço. Costumo folgar às quartas-feiras.

E sobre a organização do seu trabalho? Você tem algum ponto estratégico na cidade onde se posiciona para captar mais corridas?

Lincoln: Vitória é uma cidade pequena. Como moro em um bairro de pouca movimentação, costumo sair de manhã já com uma viagem programada. Sempre procuro corridas para regiões de maior demanda. É difícil estar constantemente em áreas com alta procura, mas faço o possível para trabalhar onde há mais movimento.

E suas metas de trabalho? Você define metas baseadas no número de corridas ou em valores?

Lincoln: Minha meta é baseada no valor. Costumo buscar alcançar R$300 por dia. Esse valor é bruto, pois é difícil fazer isso líquido, especialmente aqui em Vitória. O único dia da semana em que é mais viável atingir metas melhores é o sábado. Janeiro, por exemplo, é um mês complicado, o pior do ano. A partir de março, as coisas costumam melhorar um pouco, embora fevereiro também não seja um mês muito bom.

Na sua opinião, Vitória é uma cidade segura para trabalhar como motorista de aplicativo?

Lincoln: Em parte. Quando falamos de Vitória, incluímos também a Grande Vitória, que abrange cidades como Vila Velha, Cariacica e Serra. Prefiro trabalhar mais em Vitória e em algumas partes de Serra. Já evito Cariacica, pois é uma região mais perigosa. Dentro de Vitória, também há áreas que prefiro evitar, não porque sejam extremamente perigosas, mas por serem mais arriscadas.

Considerando que você mencionou um rendimento diário bruto de R$300, qual é a sua média mensal de ganhos?

Lincoln: Em média, faço entre R$7 mil e R$8 mil por mês, valores brutos, sem descontar os custos.

Você começou a trabalhar como motorista há dois anos e meio, certo? Isso foi por volta de 2022. Na sua opinião, os ganhos eram melhores naquela época?

Lincoln: Sim, 2022 foi um pouco melhor, mas nada extraordinário. De lá para cá, os ganhos vêm diminuindo. Meu cunhado, que trabalha com aplicativos há mais tempo aqui em Vitória, comenta que os valores antigamente eram bem melhores. Hoje, tanto a Uber quanto a 99 têm tarifas muito menores. Eu já comecei no que podemos chamar de “época de vacas magras”, mas percebo que a situação só piora. Os custos aumentaram, como gasolina e custo de vida, mas as tarifas continuam as mesmas de dois anos e meio atrás. Isso torna o trabalho cada vez mais desafiador.

E como é sua relação com os passageiros em Vitória?

Lincoln: No geral, os passageiros aqui de Vitória são bem tranquilos. O pessoal do Espírito Santo é mais fechado, sabe? Não são muito de conversar. Normalmente, entram no carro, dão um “bom dia” ou “boa noite”, que é sempre com muita educação, mas ficam calados durante o trajeto. Nunca tive problemas com passageiros, graças a Deus. É um público discreto e tranquilo.

Lincoln, na sua opinião, quais são os maiores desafios para quem trabalha como motorista de aplicativo?

Lincoln: Acho que o maior desafio hoje são os altos custos para trabalhar. Está muito complicado conciliar os gastos com o que ganhamos. As plataformas repassam valores muito baixos, com corridas mínimas de R$5,85. É praticamente impossível equilibrar os custos operacionais com esse tipo de repasse. Cada dia fica mais difícil.

E o que você diria para alguém que está pensando em começar a trabalhar como motorista de aplicativo? Você acha que vale a pena?

Lincoln: Para ser sincero, eu não encorajo. Se a pessoa tiver outra opção, recomendo que siga outro caminho. É um trabalho muito pesado e desafiador, especialmente se você precisar comprar um carro financiado, como foi o meu caso. As parcelas são altas, e isso aumenta muito a pressão financeira. Quem já tem um carro quitado pode conseguir algum lucro, mas mesmo assim, o esforço é grande. Não é nada parecido com um emprego CLT, onde você trabalha 8 ou 9 horas por dia. Aqui, você precisa se dedicar muito mais para alcançar qualquer meta.

E como funcionam os dinâmicos em Vitória? Eles ajudam a melhorar os ganhos?

Lincoln: Até o ano passado, os dinâmicos ajudavam bastante. Mas neste ano, a Uber, por exemplo, mudou a metodologia, e os valores dos dinâmicos caíram drasticamente. Antes, conseguíamos dinâmicos de R$15 ou R$20. Hoje, mal chegam a R$2 ou R$3. Parece que os dinâmicos estão morrendo.

Quais são suas expectativas para este ano?

Lincoln: Para ser honesto, não tenho muitas esperanças de melhorias. Até comentei com colegas que a situação parece piorar a cada ano. Os dinâmicos praticamente sumiram, e os valores das corridas também diminuíram. Isso torna ainda mais difícil manter um carro em boas condições, pagar por manutenção e lidar com os altos custos. As plataformas não parecem se importar com a nossa situação. Sinto que estamos sendo tratados apenas como ferramentas, sem nenhuma consideração pelo que enfrentamos no dia a dia. Minha perspectiva é, na verdade, conseguir outra fonte de renda e sair desse trabalho com aplicativos.

Qual é o app mais utilizado pelos passageiros em Vitória, e qual você prefere usar?

Lincoln: Trabalho pouco com o inDrive, mas já utilizei bastante a Uber. Ultimamente, a 99 tem oferecido promoções fortes, talvez por ser janeiro, um mês mais fraco. Por isso, tenho rodado mais com a 99. Mas, olhando para minha trajetória, a maior parte das corridas ainda é pela Uber. Tenho cerca de 19 mil viagens com a Uber, enquanto na 99 são bem menos. Os passageiros chamam muito mais pela Uber aqui.

Certo. Para finalizar, você gostaria de acrescentar algo?

Lincoln: Apenas reforçar a insatisfação da categoria, que acredito ser uma realidade em todo o Brasil. Nossos ganhos estão caindo cada vez mais, enquanto os custos continuam subindo. A gente torce para que as coisas melhorem, mas, sinceramente, não vejo muitas perspectivas. Espero estar errado, mas seguimos na luta.

Foto de Giulia Lang
Giulia Lang

Giulia Lang é líder de conteúdo do 55content e graduada em jornalismo pela Fundação Cásper Líbero.

Pesquisar