Ser motorista de aplicativo em Fortaleza é mais do que uma profissão para Robinho Patrício, vice presidente do Sindiaplic, o Sindicato dos Motoristas de Aplicativos de Fortaleza e região metropolitana.
Desde 2019, ele equilibra a rotina nas plataformas de transporte com a liderança sindical, um papel que abraçou para dar voz à categoria e buscar melhorias para os trabalhadores do setor.
Antes de ingressar no transporte por aplicativos, Robinho já tinha experiência com causas coletivas como diretor do Sindicato dos Músicos. Essa vivência o preparou para atuar em favor dos motoristas de Fortaleza. Inspirado pela necessidade de regulamentação e pela luta por melhores condições de trabalho, ele tem liderado esforços que vão desde a alteração de leis locais até ações judiciais contra empresas como Uber e 99.
Neste diálogo, ele compartilha sua história, os desafios enfrentados e as conquistas alcançadas pelo Sindiaplic.
Você é o líder do Sindicato dos Motoristas de App de Fortaleza, certo?
Robinho: Eu sou vice presidente do Sindiaplic, o Sindicato dos Motoristas de Aplicativos de Fortaleza e região metropolitana.
E você continua sendo motorista de aplicativo?
Robinho: Sim, desde 2019.
Então eu queria saber como você se tornou motorista e como decidiu se envolver com as atividades sindicais. Você sempre teve esse desejo de ser sindicalista? Conta um pouco pra mim sobre a sua história.
Robinho: Eu já venho de outro sindicato. Sou músico, na realidade, e teve um tempo aqui em Fortaleza que viver de música ficou difícil. Como a minha prioridade era a música, procurei uma atividade que me deixasse livre, para que eu pudesse fazer os shows quando eles aparecessem. Entre 2010 e 2012, surgiu aqui em Fortaleza uma modalidade chamada Táxi Amigo, que era antes dos aplicativos.
Tinha centrais nos bairros que divulgavam telefones de contato, e as pessoas pediam o carro direto pela central. Comecei assim, em 2010, nesse sistema de transporte individual que ainda não era regulamentado. Depois, com o tempo, a Uber chegou, e tudo foi regulamentado. Aí acabou o Tax Amigo, porque não dava para concorrer com os aplicativos, já que a concorrência era muito pesada.
Eu era diretor do Sindicato dos Músicos e, na época, havia muitas demandas. O sindicato tinha um bom conhecimento com um vereador influente na Câmara, e conseguimos várias vitórias para os músicos. Alteramos leis e, na pandemia, distribuímos mais de 40 mil cestas básicas, praticamente sem recurso algum. O mais importante foi a mudança em uma lei que beneficiou a categoria.
Quando comecei como motorista de aplicativo, percebi que havia muita coisa faltando para a categoria. Havia um grupo de motoristas que se reunia para discutir pautas, e fui convidado a participar. Como eu já tinha força política, levei essas pautas para um vereador, e ele atendeu. Conseguimos aumentar o limite de idade dos veículos, que era de cinco anos e passou para oito. Na pandemia, distribuímos oito mil cestas básicas para os motoristas e prorrogamos os prazos de vistoria.
Assim que entrei na categoria, comecei a me envolver com esse trabalho coletivo. Desde então, temos trabalhado muito, mas a situação em Fortaleza é difícil, assim como no restante do Brasil.
E como foi a transição para o sindicato dos motoristas?
Robinho: Eu era do Sindicato dos Músicos, mas, quando entrei no grupo de motoristas, fui diretor de uma associação. Foi por meio dessa associação que conseguimos mudar a lei, pois estávamos organizados, com pautas claras. Apresentei essas demandas ao vereador, e alcançamos algumas vitórias. Depois disso, passei para o sindicato dos motoristas de aplicativos.
E qual você diria que é a maior dificuldade em estar dentro de um sindicato?
Robinho: A maior dificuldade é a falta de consciência de classe. Como você luta por benefícios sem representação? Com a reforma trabalhista, foi implantada a ideia de que não é necessário contribuir com os sindicatos. Essa estratégia enfraqueceu os sindicatos de trabalhadores, enquanto os patronais continuam fortes, com recursos, advogados e estrutura.
O trabalhador, por outro lado, parou de contribuir. Hoje, muitos sindicatos não têm nem dinheiro para contratar um advogado que proteja a categoria. Além disso, algumas pessoas se aproveitam desse cenário. Desde o início da categoria, tem gente que se deu bem explorando essa desorganização.
E por que você acha que muitos motoristas não acreditam nos sindicatos?
Robinho: Primeiro, desinformação. Muitos motoristas são contra a regulamentação sem nunca terem lido o projeto de lei. Eles não entendem como as coisas funcionam. Além disso, influenciadores, associações e parlamentares, principalmente de direita, têm trabalhado contra a regulamentação.
Eles se uniram em pautas políticas, lançaram candidatos e travaram o processo de regulamentação. Caso o PL12 fosse aprovado neste ano, já teríamos negociações coletivas e um aumento nos ganhos dos motoristas.
Como funcionaria essa regulamentação?
Robinho: O governo chamou motoristas e empresas para discutir a regulamentação. Se não houvesse acordo, o governo redigiria o projeto, e foi isso que aconteceu. Apresentamos pautas, e uma delas foi acatada: 75% do que o motorista ganha seria considerado como gasto. Se o motorista fatura R$ 10 mil, ele declararia à Previdência apenas R$ 2.500.
Apesar disso, há muitas mentiras sendo espalhadas. Dizem que o motorista ganha R$ 5 mil, mas não consideram os gastos. Com base nesse cálculo, quem fatura R$ 10 mil fica com R$ 2.500 líquidos.
E por que há tanta resistência?
Robinho: Influenciadores e associações usaram a regulamentação como pauta política durante as eleições. Fizeram confusão nas audiências e não apresentaram propostas concretas. No final, quem propôs as mudanças foram os sindicatos.
Muitos influenciadores mudam de opinião dependendo do engajamento. Falam uma coisa hoje e outra amanhã. Isso confunde os motoristas, que acabam protegendo as empresas sem perceber. A categoria precisa se conscientizar.
Falta consciência de classe. O sindicato representa os trabalhadores, mas precisa da união de todos. Se quisermos mudanças, temos que estar organizados e conscientes do nosso papel.
Robinho, quais são os maiores desafios que os motoristas de aplicativo enfrentam atualmente e que a categoria deveria lutar? Você poderia também falar um pouco sobre as conquistas do sindicato?
Robinho: Primeiro, o que a categoria precisa fazer é ser reconhecida. Hoje, os taxistas têm benefícios como isenção de IPVA, porque eles são reconhecidos como uma categoria. Os motoristas de aplicativo reclamam, mas o que eles são hoje, formalmente? Não são considerados uma profissão.
Com a regulamentação, os motoristas se tornam profissionais. A partir disso, podem lutar por direitos. É difícil entender por que, muitas vezes, a categoria luta até inconscientemente contra isso. Por exemplo, se a regulamentação tivesse sido aprovada no ano passado, já teríamos negociações coletivas para aumentar nossos ganhos, ajustar tarifas e melhorar várias condições. Mas isso não aconteceu.
E quais foram as principais conquistas do Sindiaplic?
Robinho: O Sindiaplic foi pioneiro em algumas vitórias judiciais contra a Uber e a 99. Por exemplo, não sei se você lembra, mas antes os aplicativos cobravam taxa de aceitação. Eu fiquei mais de um ano bloqueado na 99 por baixa aceitação. O sindicato entrou com uma ação e, se não me engano, foi um desembargador que determinou que existia vínculo empregatício.
Com isso, as empresas pararam de cobrar taxas de aceitação. Hoje, por exemplo, minha taxa de aceitação é de apenas 1%, porque eu seleciono bastante as viagens que quero fazer. Isso só foi possível graças à ação do sindicato de Fortaleza.
Outra conquista importante foi durante a pandemia. Você deve lembrar que, todos os meses, a Uber enviava R$ 40 para ajudar com produtos de limpeza, como álcool em gel e máscaras. Também havia um programa em que o motorista, ao apresentar atestados médicos, recebia diárias enquanto estivesse afastado. Tudo isso foi resultado de uma ação movida pelo sindicato do Ceará contra a Uber.
Infelizmente, a 99 não seguiu o mesmo exemplo, e estamos com uma ação em segunda instância contra a empresa. Estamos próximos de vencer, e isso deve beneficiar ainda mais a categoria.
Então, essas conquistas mostram a importância de uma representação coletiva, certo?
Robinho: Exatamente. É por isso que sempre digo: uma representação coletiva é fundamental. Hoje, o motorista tem todas as obrigações de um empregado, mas não tem os direitos. Por outro lado, as empresas têm os bônus de um empregador, mas sem os ônus, ou seja, sem cumprir as obrigações legais.
Os aplicativos precificam o serviço, aplicam advertências quando o motorista recebe uma estrela negativa e até podem bloquear o motorista por “tratamento rude”. Isso é a mesma coisa que um processo de justa causa em uma empresa. Claramente, existe um vínculo empregatício.
Participamos de vários trabalhos com o Ministério Público do Trabalho, além de estudos apresentados por juízes e procuradores. Não faltam dados e pesquisas sobre nossa categoria no Brasil. O que falta é o motorista ter consciência e se interessar em entender seu trabalho. Trabalhar não é apenas dirigir e dividir o dinheiro da corrida.
Como os motoristas podem se filiar ao sindicato em Fortaleza?
Robinho: Qualquer motorista da cidade ou da região metropolitana pode entrar em contato com o sindicato pelo perfil @sindiaplic no Instagram. Temos uma sede na Rua Padre Mororó, 1055, no Centro da cidade. Mesmo sem muitos recursos, conseguimos montar uma estrutura sindical completa com a ajuda da federação.
Estamos alinhados com as gestões municipal, estadual e federal. Já enviamos projetos sobre isenção de IPVA, criação de pontos de apoio para embarque e desembarque, além de outras pautas importantes. Por exemplo, estamos lutando para evitar multas no centro da cidade por falta de locais adequados para parada.
No âmbito federal, estamos empenhados em garantir a isenção do IPI. Já no âmbito estadual, buscamos assegurar benefícios como a redução do ICMS sobre combustíveis para os motoristas. Apresentamos projetos, e agora cabe ao Congresso colocá-los em pauta.
E qual a sua mensagem final para os motoristas?
Robinho: O que eu quero pedir aos motoristas é que pesquisem. Não basta dizer “o sindicato não me representa”. Vá atrás, estude o que é um sindicato e veja as ações realizadas na sua cidade. Não acredite apenas em boatos ou em quem tem interesses contrários à categoria.
Por exemplo, na pandemia, conseguimos articular a distribuição de oito mil cestas básicas. Mas a oposição fez campanha contra, e muitos motoristas não foram buscar os benefícios por falta de conhecimento ou por ideologia política. No final, essas cestas básicas sobraram e foram direcionadas para outros fins, enquanto muitos motoristas continuaram precisando de ajuda.
Outro exemplo é a mudança na lei da idade veicular, que aumentou o limite de cinco para oito anos. Foi uma conquista minha em parceria com um vereador, mas outras pessoas usaram a vitória para fazer propaganda política. Isso mostra como é importante que o motorista entenda quem realmente está trabalhando por ele.
Então, minha mensagem final é: pesquise, participe e apoie quem está lutando pela categoria. O sindicato não é feito só de diretores; ele é composto pelos trabalhadores. Se algo está errado, denuncie. Se está certo, apoie. Só com união e conscientização conseguiremos alcançar os direitos que todos merecem.