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André Gomide: “Quero que os ganhos com a publicidade nos veículos sejam 100% dos motoristas”

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Entrevista
Conversas com especialistas, gestores e profissionais do setor, com perguntas conduzidas pela equipe do 55content.
Uma foto de André Gomide, um homem barbudo com óculos e cabeça calva, vestindo uma camisa clara com botões. Ele parece estar em pé diante de um fundo claro e neutro, olhando diretamente para a câmera com uma expressão neutra.
Foto: Reprodução/ Arquivo Pessoal.

Pré-candidato a vereador em Porto Alegre planeja lutar por uma renda justa e digna para a classe.

André Gomide é pré-candidato a vereador em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, e promete sair em defesa dos motoristas de aplicativo. As plataformas surgiram em sua vida como um complemento de renda inicialmente, e hoje fazem parte de sua campanha eleitoral.

Ele conta que com o tempo o transporte se tornou sua renda principal. Com mais de 18 mil corridas como motorista, André afirma: “Me sinto capacitado, porque entendo a cidade, sofro nas mãos do algoritmo e sempre estou buscando soluções para buscar uma renda justa e digna.”

O pré-candidato também contou ao 55content que por muito tempo a bicicleta foi seu meio principal de transporte: “O que me permitiu ter um olhar diferente sobre a cidade e as relações humanas no trânsito. Nessa fase, ajudei a organizar os ciclistas para que a gente conseguisse ser reconhecido como pessoas que estão no trânsito e a lutar pelo espaço compartilhado.”

Como surgiu o convite para entrar na política?

“Bom, eu tenho um passado combativo. Nunca consegui assistir a uma cena onde alguém fosse explorado e ignorado, mesmo na época da escola. Participei de todo tipo de organização social, como movimento católico, movimento de ciclistas ou de organização no meu trabalho formal.

Há cerca de 20 anos, pelo menos, recebo convites dos mais diversos partidos para que eu colocasse meu nome para a sociedade, o que sempre me deixava honrado, mas não via necessidade ou mesmo condições.

As pessoas têm uma ideia errônea dos motoristas de aplicativos. Somos seres políticos tão capazes quanto os que dizem nos representar. A oportunidade justamente surge desse momento necessário de luta e busca de visibilidade para nossa categoria. A Rede Sustentabilidade me permitiu dialogar com toda a categoria e tentar, humildemente, abrir um espaço sério e legítimo para que nossas necessidades sejam ouvidas.”

E o que pesou para aceitar ser pré-candidato a vereador?

“É urgente que os trabalhadores ganhem ferramentas para enfrentar as empresas donas dos algoritmos que nos colocam contra a parede todos os dias. As empresas nos escravizam através do algoritmo. Eu realmente estou cansado de ser maltratado por quem, quando convém, me chama de parceiro em uma bela peça publicitária, mas que na verdade me joga contra os usuários o tempo todo. Chega.

É preciso enfrentar essa situação. Muitos colegas que me conhecem sabem o quanto tenho gana por essa chance de virar o jogo. Tenho as armas certas para enfrentar esse gigante. Precisamos estar organizados o tempo todo. Por fim, o apoio de amigos/colegas motoristas pesou totalmente. Assistir eles sendo bloqueados sem chance alguma de defesa sempre me deixou indignado. Nunca somos ouvidos. De certa forma, somos descartáveis. Mas essa ‘corrida’ chegou ao destino final. E nós não vamos deixar pra próxima.”

Quais são suas principais propostas, caso eleito vereador?

“São tantas, mas vou tentar resumir rapidamente. Primeiro, o foco na regulamentação de espaços para descanso dos motoristas (popularmente conhecidos como pontos de apoio); tornar obrigatório que toda casa de show ou grande evento tenha pontos de embarques e desembarque (extensivamente identificados); uma definição e demarcação de locais para estacionamento nas ruas da capital, preferencialmente em espaços de Zona Azul (assim contribuindo com o uso compartilhado do automóvel).

Estipular uma disciplina e permitir que haja publicidade nos veículos de quem desejar, com esse novo recurso indo integralmente para o custeio da atividade do motorista (se organizado e bem explorado, esse valor poderia ser suficiente para mensalmente arcar com os custos da previdência dos motoristas e entregadores);

Apoiar o surgimento do trabalho cooperado nos aplicativos, com apoio às cooperativas, buscando o diálogo com o Executivo para zerar os impostos municipais. Legislar na direção de que a Guarda Municipal tenha a atribuição de auxiliar na segurança das viagens contratadas via aplicativos de transporte.

Através de lei municipal, pretendo determinar um tempo mínimo maior para motoristas cadastrados junto aos shoppings poderem permanecer nos estacionamentos (aumento da tolerância nesses locais antes das cobranças).

Quero garantir através de lei que os motoristas participem de conselhos que tratem dos temas de urbanização, mobilidade urbana (temos muito a contribuir com soluções para a cidade); garantir junto ao poder público a capacitação de nossa categoria para atuar como agente promotor do turismo (permitindo a criação de um serviço de intermediação entre o turista e o motorista cadastrado junto à Secretaria de Turismo).

Há muitas possibilidades não exploradas na nossa cidade que podem trazer mais dignidade para nós que estamos todos os dias fazendo a cidade se movimentar. E, por fim, há a necessidade de se padronizar através de lei a forma, tamanho, local e luminosidade das numerações de casas e edifícios. Facilitaria e ajudaria a evitar acidentes, a fluidez no trânsito e o fato de termos uma padronização dos números das casas/edifícios, pois tanto nós quanto os entregadores localizaríamos de forma mais ágil o endereço que buscamos.”

Por qual partido você irá concorrer e como definiria seu posicionamento político?

“Concorro pela Rede Sustentabilidade, o que me permite diálogo com todos, por sermos um partido jovem, sem muitos vícios daqueles que nos antecederam. Me considero uma pessoa progressista e de diálogo. Fazer política é ter a capacidade primeira de ouvir a todos. Nunca negarei minha origem humanística, pois é ela que me capacita e não deixa que eu seja indiferente à dor do meu colega motorista.”

Atualmente, apenas o vereador Marlon Luz está eleito com a bandeira da representação dos motoristas de aplicativo. Nas últimas eleições, outros motoristas de app tentaram e não conseguiram. O que faz você acreditar que será diferente em 2024?

“Bom, não fujo de um bom combate. Primeiramente é preciso dizer que reconheço o trabalho do vereador Marlon, embora discorde constantemente da forma que ele conduz a situação, muitas vezes mais preocupado com suas redes sociais do que realmente com quem está nas ruas dia e noite, faça frio ou calor. Entendo como importante a atuação do mesmo na CPI que foi instalada em SP, mas na prática, no que isso resultou para o motorista na vida real? Quase nada. Infelizmente, hoje ele não é mais motorista de app. É um influenciador.

Eu assumo o compromisso e vou registrar em cartório que mesmo eleito, no mínimo 20 horas semanais, permanecerei dirigindo como meus colegas. Não posso me encastelar e achar que continuarei sentindo na pele sem estar na linha de frente.

Eu preciso sentir o que realmente meu colega sente, no calor muitas vezes, pois ele não pode ligar o ar para tentar economizar, no frio e chuva sem nem um banheiro público para ele usar, dependendo muitas vezes do comércio local para nos ajudar. Se eu me distanciar dos meus colegas, estarei realmente traindo a categoria. Meu gabinete vai estar na rua. E garanto pra vocês que no mínimo 25% de quem comigo trabalhar também terá que estar na rua o tempo todo, atento às nossas necessidades.”

Como pretende usar um possível cargo de vereador para modificar a regulamentação federal?

“Bom, sou estudante de direito e servidor da Justiça há quase 20 anos. E mesmo assim tenho mais de 18 mil viagens nos aplicativos. Isso me deu a capacidade de ter opiniões diferentes do que vejo ser debatido até o momento. Temos um projeto de lei em tramitação, permitindo ainda contribuições, mas a capacidade de um vereador influenciar diretamente no Congresso é pequena. Quem diz o contrário mente, ou para se eleger, ou para se manter.

Eu não sei fazer política dessa forma, e nem pretendo aprender. Entender como funcionam as leis e a burocracia interna dos poderes me capacitaria a buscar o diálogo quando possível, mas me colocaria numa posição de buscar aglutinar os meus colegas motoristas para aí sim, juntos, pressionarmos de forma incisiva o poder executivo e as empresas.

O lobby que essas empresas exercem sobre o legislativo é muito forte. Eu mesmo presenciei a covardia ou, digamos, ‘esperteza’ de um vereador que após encontrar-se às escondidas com representantes da Uber, retirou a sua assinatura da CPI que trataria do tema aplicativos em Porto Alegre.

Com um vereador aqui, tenho certeza que isso não teria acontecido tão facilmente. Organizar meus colegas e principalmente capacitar a todos para que entendam seus direitos é uma forma de pressionar este ou qualquer outro governo que no poder estiver futuramente a nos ouvir.

Há outros temas que ali na frente as cidades terão que enfrentar também, como se permitiremos que carros autônomos transportem livremente passageiros pelas cidades (pode parecer distante esse tema, mas afetará toda nossa categoria logo ali).”

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