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“O motorista de app deveria ganhar pelo menos R$ 5.648 para contribuir com a Previdência”, diz Procuradora de Joinville

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Audiencia Publica Joinville
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A procuradora afirma que motoristas não deveriam trabalhar 12 horas para ganhar o mínimo, e sim 8 horas: “A remuneração deve ser suficiente para que trabalhem apenas oito horas por dia e ainda tenham descanso semanal remunerado.”

Na última sexta-feira (21), a Câmara de Vereadores de Joinville foi palco de uma audiência pública para discutir a regulamentação do trabalho dos motoristas de aplicativos. Representando a Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes Trabalhistas, a Procuradora do Trabalho Ana Carolina Martinhago Balam trouxe à tona preocupações cruciais do Ministério Público do Trabalho (MPT) em relação ao projeto de lei em pauta.

“A ideia aqui é analisar o PLP sob a ótica do direito dos trabalhadores, visando resguardar condições mais justas e equitativas de trabalho”, iniciou a Procuradora. Em nome do coordenador doutor Renan Kalil, Ana Carolina destacou a necessidade de um olhar crítico sobre o projeto, considerando suas implicações trabalhistas, tributárias e consumeristas.

A Procuradora ressaltou cinco pontos centrais pelos quais o Ministério Público entende que o projeto de lei precisa ser rediscutido. “O Ministério Público acredita que este projeto de lei precisa ser rediscutido, pois, da forma como está, não merece ser aprovado”, afirmou.

Primeiro, o projeto atual caracteriza as empresas de aplicativos como intermediadoras de viagens, e não como empresas de transporte público. “Quando você contrata um motorista através do Uber, por exemplo, você não busca um motorista específico, mas sim um serviço de transporte. Essas empresas são, na verdade, empresas de transporte e assim estão cadastradas no INPI, no registro de marcas”, explicou. A Procuradora enfatizou que essa definição tem consequências importantes, especialmente no direito do consumidor, onde a responsabilidade por falhas no serviço recairia injustamente sobre os motoristas.

Segundo, Ana Carolina criticou a classificação dos motoristas como autônomos com base na liberdade de escolha sobre quando trabalhar e a ausência de exclusividade. “Para que fossem considerados autônomos, os motoristas deveriam poder definir o preço das corridas, não serem punidos por rejeitarem viagens e não serem excluídos por avaliações baixas ou metas não alcançadas”, argumentou. Ela apontou que essas condições os deixam subordinados às plataformas, desmistificando a ideia de autonomia.

O terceiro ponto abordado foi a existência de um artigo no projeto que impede o reconhecimento de vínculo empregatício, mesmo com práticas de controle pelas plataformas. “O artigo estabelece que não será reconhecida a relação de emprego, mesmo que a plataforma adote normas de segurança e qualidade, utilize sistemas de avaliação e fixe unilateralmente o preço do trabalho”, disse a Procuradora, ressaltando que regulamentações em outras partes do mundo seguem uma abordagem contrária.

Ela ressaltou que, em outras partes do mundo, como na Europa e em países da América Latina, há reconhecimento da laboralidade, ou seja, da existência de uma relação de trabalho com subordinação, atribuindo à plataforma a necessidade de provar que os trabalhadores são autônomos. “Se houver medidas de controle, isso indicaria que os trabalhadores teriam direito a benefícios trabalhistas maiores”, complementou.

Ana Carolina destacou que tratar igualmente todas as plataformas pode desfavorecer aquelas que garantem maior autonomia aos motoristas, geralmente menores em tamanho. “Existem várias plataformas de transporte e algumas realmente garantem essa autonomia para o motorista, enquanto outras, como a Uber, não. Tratar de forma igual essas plataformas pode desfavorecer as que oferecem mais vantagens”, alertou.

O quarto ponto em relação aos direitos do trabalhador autônomo de plataforma envolve duas questões principais. Primeiramente, há uma permissão para que os trabalhadores fiquem conectados por até 12 horas. “Entendemos que isso não significa que vocês estarão dirigindo durante todas essas 12 horas, mas é importante destacar que a Constituição Federal e as normas internacionais estabelecem um limite de jornada de trabalho de 8 horas. Isso implica que a remuneração deve ser suficiente para que vocês possam trabalhar apenas oito horas por dia e ainda usufruir de um descanso semanal remunerado”, explicou a Procuradora. Ela ressaltou que pesquisas mostram que, para obter uma remuneração justa e equitativa, muitos trabalhadores precisam trabalhar muito mais do que oito horas, incluindo fins de semana e horários noturnos. Portanto, ela enfatizou a necessidade de melhorar a questão da remuneração e os aspectos de negociação para que os motoristas possam trabalhar dentro dos limites estabelecidos.

Quanto à inserção previdenciária, a Procuradora destacou que, embora haja a previsão de que o motorista recolherá 7,5% e a empresa 20% sobre 25% do salário bruto, muitas vezes essa contribuição seria feita sobre um valor menor que o salário mínimo. “Isso não seria considerado para o cálculo de contribuição e carência na análise de benefícios previdenciários. Para que essa contribuição fosse levada em conta, o motorista teria que ganhar pelo menos R$ 5.648. Se ele contribuir para a Previdência ganhando menos desse valor, a contribuição não será considerada para efeitos previdenciários”, detalhou.

Outra situação preocupante no substitutivo é a obrigação de descanso interjornada de 11 horas. “O descanso nunca foi um dever, mas sim um direito, e o substitutivo ainda prevê uma penalidade para o motorista que não descansar as 11 horas, incluindo a suspensão da plataforma. Isso inverte a lógica dos direitos dos motoristas, tornando o descanso um dever”, alertou a Procuradora.

Concluindo sua participação, Ana Carolina reafirmou a posição do Ministério Público do Trabalho. “O MPT entende que o PLP, tal como está, não merece ser aprovado. É necessário adequar, amadurecer, dialogar e construir pontos de consenso para garantir os direitos dos trabalhadores e condições justas e razoáveis de trabalho”, concluiu.

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Redação 55content

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