Motorista fez 83,61 km em 1h08min e recebeu R$136,24. Pelo PLP 536, deveria ganhar R$181,94 — prejuízo de R$45, ou 25,11%

Pelo cálculo justo do PLP 536, que considera os custos específicos do carro do motorista — R$1,68 por km e R$0,61 por minuto — ele deveria receber R$181,94. Mas ganhou só R$136,24 e perdeu R$45.

ponto de exclamacao .png
Opinião
Textos assinados que refletem o ponto de vista do autor, não necessariamente da equipe do 55content.
Homem com barba curta e cabelo escuro, vestindo camiseta cinza, fala diretamente para a câmera em um ambiente doméstico. No canto da imagem, há uma arte com dados sobre o motorista Paulo Reis, da cidade de São Paulo/SP, incluindo logotipo da FPMA (Federação Paulista dos Motoristas por Aplicativo), informações sobre valores por quilômetro e minuto, além de indicadores visuais com velocímetros de ganhos.
Foto: Ian Rocha para 55content

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do 55content

Salve, meus amigos! Hoje eu vou explodir a cabeça de vocês, porque vou mostrar um método simples de como, de verdade, os aplicativos deveriam calcular o valor das nossas corridas. Esse cálculo leva em consideração a sua cidade, seu estado, seu carro — e não somente aquelas categorias malucas que os aplicativos inventam — e, acima de tudo, todos os nossos custos.

Estamos vendo aí o retorno do PLP 12 de 2024. Estamos sem força nenhuma, porque não elegemos ninguém. O sindicato que nos vendeu está lá nos representando, tentando empurrar esse projeto goela abaixo, e o governo só quer arrecadar o dele. Eles não aceitaram uma das propostas que a gente tentou apresentar, que é o PLP 536, criado pela Frente Parlamentar. E eu vou mostrar para vocês como foi feito o estudo, como foi feito o cálculo, para que você saiba de fato que não vai tomar prejuízo na corrida. E isso vale para qualquer carro, em qualquer cidade.

Pensa comigo: se toca uma corrida onde a gente fica no negativo, ou seja, toma prejuízo, é óbvio que tem alguma coisa errada. E, para mim, também é óbvio que o governo não deveria deixar isso acontecer. O cálculo que vou apresentar para vocês mostra, de forma simples e didática, todos os custos de todos os carros em todas as cidades. A partir disso, jogamos nossa margem de lucro em cima. Quanto o aplicativo quer ganhar? Isso é problema deles, desde que nos paguem o mínimo — custo mais margem de lucro — está tudo certo.

Vamos começar considerando mais ou menos sete categorias que as plataformas deveriam adotar. Ou seja, Uber, 99, inDrive… tanto faz. Elas deveriam separar os carros por categoria. Hoje vemos uma loucura: um Argo fazendo parte do Comfort, mas ao mesmo tempo um Onix não. Me fala: em que o Onix perde para o Argo? Na minha opinião, são carros totalmente parecidos.

Então, por que cargas d’água o Argo está no Comfort e o Onix não? A gente vê essas loucuras. Amanhã os aplicativos, como a Uber, podem simplesmente decidir tirar tal carro do Black ou do Comfort. E o motorista que entrou num financiamento de dois, três, quatro, às vezes cinco anos, fica enrolado. Ou ele se desfaz do carro, ou assume o prejuízo para continuar com ele. Isso é totalmente injusto. Ficamos nas mãos dos aplicativos.

Essas sete categorias que vou apresentar já começam a simplificar isso. Lembrando: essa não é uma ideia minha, é uma ideia do projeto 536, criado pela Frente Parlamentar, que tentamos apresentar ao governo, mas eles nem quiseram saber. Só querem saber do que é bom para eles.

A primeira categoria seria a subcompacto — entenda aqui como carros tipo Mobi, Kwid, por exemplo. A segunda, os hatches. Aí entram carros como Argo, Onix, HB20 hatch, entre outros.

Depois vêm os sedãs: sedã pequeno, sedã médio, sedã grande. Por exemplo, eu tenho um BYD King, que é um sedã médio. Sedã grande seria um Fusion, por exemplo. Sedã pequeno seriam carros como o Onix sedã, HB20 sedã — beleza?

Acima disso, temos a categoria SUV. E a sétima categoria seriam as minivans e carros de sete lugares, como a Commander, entre outros. Você percebe que, ao subir de categoria, o preço precisa subir. Não só porque o carro é maior ou melhor, mas porque os custos aumentam.

Normalmente, você compra um carro subcompacto — como o Kwid, o mais barato do mercado — e, por outro lado, um carro de sete lugares, como a Commander, é muito mais caro. O passageiro escolhe qual carro quer, e consequentemente paga por esse serviço.

Agora vou mostrar como o cálculo é feito. Tenham em mente que a ideia desses cálculos é apontar o custo. O PLP 536 está mastigado para o governo. Ele diz assim: “Este é o custo.” Vou usar o exemplo de um Versa 2016 em São Paulo (SP). O Versa 2016, para rodar, deve ter no mínimo 20% de lucro.

Então, vamos calcular os custos e depois aplicar os 20% de lucro. O cálculo leva em consideração, por exemplo: ISS da cidade, ICMS do estado, IPCA (inflação em relação ao ano anterior) — ou seja, todo ano precisa haver reajuste, por conta da inflação. Não adianta fazer um custo hoje e daqui cinco anos estar sofrendo, como acontece hoje, porque não há reajuste.

Considera também a tabela Fipe do veículo, IPVA do estado — por exemplo, em Belo Horizonte é 4%, em outras cidades pode ser 3% ou 2% —, licenciamento, DPVAT, parcela do carro, seguro, média de quilômetros rodados. Também se considera o consumo por litro daquele carro, o preço da gasolina na região, lavagem do carro (de uma a quatro por mês), custo de lavagem semanal, troca de óleo, custo dos pneus (a cada 60 mil quilômetros), manutenção preventiva mensal…

A gente leva em conta tudo isso, porque o governo e as plataformas vivem dizendo: “Vocês são autônomos.” Isso chega a ser piada. Somos autônomos só para escolher quando trabalhar. A gente não define o preço, não define quanto o aplicativo vai tirar da corrida e quanto vai nos repassar.

A gente não tem autonomia nenhuma. Não temos o direito nem o benefício de sermos, de fato, autônomos. Se eu abro uma barraquinha de cachorro-quente, sou eu quem escolhe onde vou trabalhar e por quanto vou vender. Eu defino meu custo e meu preço.

Isso é ser autônomo: definir o preço, escolher a hora e o dia de trabalhar, onde trabalhar, e ninguém manda em mim, ninguém me demite. Isso é autonomia. A Uber é uma intermediária, mas quer fazer tudo e ainda dizer: “Você trabalha se quiser, então é autônomo.”

E o governo está abraçando essa ideia absurda. Então, não somos autônomos. Somos “autônomos”, entre aspas.

Mas beleza, vamos deixar isso de lado e comparar com o que o governo quer fazer. O governo diz que quer garantir direitos. Essa é a ideia do PLP 12: garantir direitos — férias, por exemplo.

Um trabalhador com carteira assinada tem vale-combustível. Aqui, entra o custo do combustível. Ou vale-transporte. Também tem auxílio-alimentação. Quando ele está trabalhando, a empresa paga pela alimentação.

Aqui, entra o custo da nossa alimentação. É custo. Estamos na rua, precisamos comer.

A manutenção do carro, tudo isso são custos. Isso foi listado. E, por exemplo, no caso do Paulo Reis, chegou-se à definição de que, no trajeto urbano, o valor do quilômetro rodado dele é de R$ 1,68 e o valor do minuto é R$ 0,61. Se for transporte intermunicipal, é R$ 1,77 e R$ 0,65.

Isso é o mínimo. É a base para o motorista começar a receber. Ou seja, o aplicativo nunca poderia oferecer uma corrida para o Paulo por menos de R$ 1,68 por quilômetro.

Pegaram a visão?

Se o aplicativo quiser cobrar R$500 mil do passageiro, tudo bem — desde que nos paguem, no mínimo, R$1,68 por quilômetro. Assim, a gente não toma prejuízo e ainda garante no mínimo 20% de lucro. E aí entra a questão da oferta e demanda: subiu o preço, entra tarifa dinâmica, entre outros mecanismos.

Quer incentivar o motorista a aceitar a corrida? Quer que o passageiro pague mais caro pela viagem? Então repassa isso corretamente para o motorista.

Um exemplo prático para vocês entenderem: o Paulo fez uma corrida de 83,61 quilômetros, que durou 1 hora e 8 minutos. O aplicativo pagou R$136,24. O aplicativo simplesmente decidiu quanto pagar com base no algoritmo dele. Mas se fosse usado o sistema do PLP 536 — chamado de Marcap — olha quanto o Paulo teria recebido:

83,61 km multiplicado por R$1,68 dá R$140,46. Isso é apenas pelo quilômetro. Agora, acrescentando o tempo da corrida — 1 hora e 8 minutos — multiplicado por R$0,61 por minuto, dá cerca de R$41,00. O total seria R$181,94.

Esse era o valor mínimo que o Paulo deveria ter recebido por essa corrida. Mas ele recebeu apenas R$136,00. A diferença é de R$45,00. Isso representa um ganho real de 25,11% a mais sobre o que as empresas pagam atualmente.

Agora quero que vocês comecem a refletir sobre isso.

Vou dar outro exemplo para reforçar: um motorista de Vitória, no Espírito Santo, usa outro tipo de carro — não é mais o Versa —, então o valor do quilômetro sobe. Digamos que ele use um sedã médio, por exemplo. O custo do quilômetro pode ser R$1,95 e o minuto R$1,81. No caso de transporte intermunicipal, sobe para R$2,19 o km e R$1,91 o minuto.

Esse motorista fez uma corrida de 16,4 km em 45 minutos e recebeu R$50,00. Se fosse pelo sistema do Marcap, ele teria recebido R$68,33 — ou seja, R$18,00 de diferença numa única corrida.

Agora imagine você, que faz 400 corridas por mês. E olha que o valor que estamos considerando aqui — R$1,95 por km — ainda é baixo. Nem chegou a R$2,00. E veja quanto ele deixou de ganhar. Isso mostra o quanto os aplicativos estão nos pagando de forma absurda.

É por isso que precisamos conscientizar as pessoas sobre o quanto estamos sendo explorados.

Mais um exemplo, só para não passar batido: um motorista de Juiz de Fora. O valor do quilômetro dele ficou em R$2,37, e o minuto, R$0,59. Isso varia conforme o carro dele, o consumo urbano, o valor do IPVA, o valor na tabela Fipe, o número de quilômetros rodados, custo de troca de óleo, pneus… Todos os custos dele foram colocados na conta.

Ou seja, ele precisa receber R$2,37 por quilômetro rodado para fazer sentido continuar trabalhando com os aplicativos. Melhor dizendo, nenhuma corrida deveria tocar para ele por menos de R$2,37 o km — caso contrário, ele trabalha no prejuízo. Isso é um fator de motivação também.

Tem ainda o caso de um motorista de Palmas, no Tocantins. Para ele, o quilômetro ficou em R$0,66 e o minuto, R$0,10. Não sei exatamente qual é o carro, mas o cálculo leva em consideração cidade, estado, tipo de carro… tudo.

Tudo isso varia. Por isso definimos as classes dos carros — como falei antes: do subcompacto até a minivan ou carro de sete lugares. Definimos também a cidade e o estado, porque muda o IPVA, muda o consumo, mudam outros custos. E, a partir daí, calculamos os custos médios.

Com base nesse custo médio, definimos o valor mínimo que o motorista deveria receber para não ter prejuízo.

E aí eu te pergunto: você acha difícil implementar isso no PLP 12 de 2024? Não é. Basta querer. O problema é que a gente não tem apoio. Temos sindicatos que nos vendem para os interesses das empresas. E agora, como não elegemos ninguém, algo que poderia garantir reajustes anuais e começar a nos dar um pouco de dignidade fica engavetado.

E dignidade é o mínimo que deveríamos receber. Com alta demanda, com tarifa dinâmica, tudo bem que suba — mas o mínimo tem que estar garantido.

O problema é que agora estamos largados, vendidos, e seja o que Deus quiser. Vamos torcer para que nós e outras pessoas que ainda têm garra para lutar consigamos fazer isso acontecer.

E aí? Você curtiu esse método de cálculo das corridas? Você acha que tem alguma furada nele ou prefere o jeito que a Uber faz?

E não me venha com aquele papo de “ah, trabalha quem quer”, porque eu detesto esse tipo de discurso. Quero que você entenda o seguinte: a sua conta chega. Seu aluguel chega. Você precisa comprar comida, precisa lavar roupa, precisa de água, energia, internet… e tudo isso custa.

Então não é “trabalha quem quer”. Se fosse fácil assim, todos nós sairíamos da Uber e iríamos fazer outra coisa, se existisse algo muito melhor. Se o país fosse simples, se largar tudo fosse fácil.

Aí eu te pergunto: se sua conta da Uber fosse banida hoje, você estaria ferrado? Então por que você insiste nesse discurso de “trabalha quem quer”? Se não quiser, é só sair?

Entenda: o que estamos buscando é dignidade. Não estamos buscando ganhar fortunas ou ficar ricos com os aplicativos. Queremos apenas não ser explorados, como vem acontecendo. Mas o governo entra no meio e parece que não quer nem saber. Só quer arrecadar o dele.

Então, deixa aqui seu comentário. Um abração. É nóis!

Foto de Ian Rocha
Ian Rocha

Ian Rocha começou a trabalhar como motorista de aplicativo em busca de uma nova oportunidade e logo percebeu a importância de entender melhor a dinâmica do setor. Estudou estratégias, analisou os melhores horários e locais para otimizar seus ganhos e passou a compartilhar suas descobertas com outros motoristas. Ao notar a falta de conteúdo informativo sobre a profissão, criou um canal no YouTube para dividir suas experiências. Com o tempo, tornou-se uma referência no segmento, ajudando motoristas a trabalharem de forma mais eficiente e informada.

Pesquisar