Se você é motorista de aplicativo, tem uma obrigação por lei que muita gente ainda ignora: transportar passageiro com deficiência visual junto com o cão-guia. Não é “favor”, não é “se quiser”. É lei. A Lei 11.126/2005 determina que transporte público, táxis e também nós, motoristas de aplicativo, precisamos aceitar o cão-guia no carro.
A Uber já começou a deixar isso bem claro no app: quando o passageiro está com cão-guia, aparece uma mensagem logo abaixo do nome avisando que ele embarca com o animal. A partir desse momento, a regra é simples: tem que fazer a corrida. Se você tentar cancelar, o sistema ainda mostra um aviso com o texto da lei. Ou seja: a empresa deixa claro que a responsabilidade é sua.
Agora, é importante separar as coisas. Cão-guia é uma situação. Uber Pet ou passageiro com “qualquer bichinho” é outra. Se for cachorro comum, gato, ou outro animal de estimação, você pode recusar sem problema — desde que não seja corrida na categoria específica de pet, ou que fuja do combinado (animal solto, muitos bichos, animal grande sem caixa de transporte etc.). Nesse caso, é direito seu dizer não.
Mas cão-guia é diferente. Ele não entra nessa lógica de “aceito se quiser”. É garantido por lei.
Muitos motoristas questionam:
“E se eu for alérgico?”
“E se o cachorro sujar o carro?”
“E se ele não tiver focinheira?”
Aqui entram alguns pontos importantes:
- Cão-guia (em geral Golden Retriever ou Labrador) é selecionado e treinado justamente por ser dócil, calmo e acostumado a conviver em espaços públicos.
- Esses animais são preparados para andar em ônibus, táxis, carros, shoppings e elevadores sem causar confusão.
- A chance de ele vomitar, fazer necessidades ou destruir o carro é mínima — bem menor, inclusive, do que com passageiro bêbado de madrugada.
Mas claro, problema pode acontecer com qualquer pessoa ou animal. E se acontecer, o procedimento é o mesmo de qualquer sujeira grave dentro do carro: você para de trabalhar e aciona a plataforma pedindo taxa de limpeza. Para isso, precisa seguir alguns passos básicos:
• Parar de fazer corridas depois do incidente.
• Tirar fotos e, se possível, gravar um vídeo mostrando a sujeira dentro do carro.
• Levar o veículo para uma empresa de lavagem com CNPJ.
• Pedir nota fiscal com seus dados e os dados do carro.
• Enviar tudo pelo app para solicitar o reembolso da limpeza.
A plataforma vai cobrar do passageiro e, em tese, repassar o valor para você.
Outra dúvida frequente: “E se eu precisar cancelar por outro motivo, tipo passageiro não apareceu?”.
Aí o ideal é você se proteger, principalmente quando há a marcação de cão-guia na corrida. Algo simples, mas que te ajuda muito se um dia tiver problema:
• Fazer um vídeo rápido dentro do carro, mostrando a rua/local e explicando que esperou e o passageiro não apareceu.
• Tirar uma foto do ponto de encontro.
• Escolher o motivo correto de cancelamento dentro do app e guardar esse material, caso precise provar depois.
Isso tudo não é paranoia: é proteção. A gente sabe que, do mesmo jeito que existem motoristas errados, também existem passageiros que podem fazer denúncias injustas — por raiva, má interpretação ou até má-fé.
Sobre alergia, o melhor caminho é conversar com respeito. Explique para o passageiro que tem alergia forte, ande com os vidros um pouco abertos, tente reduzir o contato direto. Mas usar isso como desculpa para simplesmente negar corrida de cão-guia pode te colocar em problema jurídico sério, porque a legislação é clara: o direito de locomoção da pessoa com deficiência visual vem primeiro — e o cão-guia faz parte disso.
No fim das contas, a mensagem é direta: transporte com cão-guia não é opcional. É obrigação legal, é questão de respeito e também de humanidade. A boa notícia é que, na prática, são corridas normalmente tranquilas, geralmente curtas ou médias, com passageiros que mais do que ninguém dependem do nosso trabalho para se deslocar com dignidade pela cidade.
Cumprir a lei, evitar dor de cabeça e ainda fazer uma corrida segura e correta é o mínimo. O resto é desculpa.