A Uber do Brasil foi condenada ao pagamento de indenização a uma passageira que teve uma bolsa esquecida em um veículo e não conseguiu reavê-la. A condenação foi mantida, por unanimidade, pela Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal. Conforme decisão proferida no processo nº 0777382-71.2024.8.07.0016, a Corte reconheceu falha na prestação de serviço por parte da plataforma e aplicou a chamada “teoria do desvio produtivo do consumidor”, já consolidada na jurisprudência brasileira. A informação está detalhada no portal oficial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT).
Segundo o voto do relator, juiz Daniel Felipe Machado, a Uber foi omissa ao não adotar providências eficazes para garantir a devolução do item, mesmo após o motorista parceiro confirmar que estava de posse da bolsa. Diante disso, a empresa foi condenada ao pagamento de R$2.500 por danos morais, além de ser obrigada a devolver a bolsa no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária limitada a R$1 mil. Na hipótese de a devolução não ser mais possível, deverá ser pago à consumidora o valor equivalente ao bem extraviado, conforme informações do TJDFT.
Ainda de acordo com o documento da decisão, a alegação da Uber de ilegitimidade passiva foi rejeitada. A empresa sustentava que atua apenas como intermediadora entre motoristas e usuários, sem responsabilidade direta sobre condutas dos condutores. No entanto, o juiz relator afirmou que a Uber exerce controle relevante sobre o serviço prestado, incluindo credenciamento, precificação, repasses financeiros e mediação da comunicação entre as partes. Diante disso, aplicou-se a responsabilidade objetiva prevista nos artigos 7º, parágrafo único, e 14 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), conforme destacado no voto disponível no site do TJDFT.
Além disso, o magistrado fundamentou a indenização na teoria do desvio produtivo do consumidor, desenvolvida originalmente pelo jurista Marcos Dessaune e reconhecida por diversos tribunais, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Essa teoria estabelece que a perda de tempo injustificada do consumidor, causada pela necessidade de insistir junto ao fornecedor para ter seus direitos respeitados, representa dano moral. Conforme explicou o relator, no voto publicado pelo TJDFT, “o que se indeniza, nesse caso, não é o descumprimento contratual, mas a desnecessária perda de tempo útil imposta ao consumidor”, tempo este que poderia ser empregado em atividades pessoais, profissionais ou de lazer.
Em relação à conduta da empresa no caso concreto, os autos demonstram que a Uber chegou a confirmar à usuária que o motorista parceiro estava com a bolsa e que aguardava contato para devolução. Ainda assim, a devolução não ocorreu, e a plataforma não forneceu solução concreta. Essas informações constam dos registros internos de atendimento e foram analisadas pelo juízo. Segundo a decisão do tribunal publicada pelo TJDFT, não houve contestação por parte da Uber quanto ao não retorno do motorista, o que tornou o fato incontroverso.
No tocante às orientações da própria empresa, segundo informações disponibilizadas pela Uber em sua Central de Ajuda, em situações de objetos esquecidos, a orientação é que o usuário tente contato direto com o motorista parceiro pelo aplicativo. Caso o item seja recuperado, pode haver cobrança de uma taxa de devolução, como compensação pelo tempo e deslocamento do motorista. A empresa, no entanto, esclarece que “não pode garantir que você irá recuperar seus itens, já que os motoristas são contratantes independentes”.
Apesar dessa política interna, a decisão do TJDFT reforça o entendimento de que a Uber integra a cadeia de fornecimento de serviços e, por isso, responde solidariamente pelos danos causados no contexto da relação de consumo. De acordo com a interpretação do magistrado, descrita no voto publicado pelo TJDFT, as obrigações da empresa com seus usuários não se encerram com o término da corrida, especialmente quando há falhas na resolução de problemas subsequentes.