A maioria dos motoristas por aplicativos rejeita o vínculo empregatício com as plataformas, defende a flexibilidade neste tipo de trabalho e considera que o mais importante na regulamentação da atividade é ter auxílio do poder público para trocar de veículo. É o que aponta um estudo do Instituto de Pesquisas Datafolha, encomendado pela Uber, que indica ainda o aumento do custo de vida e a flexibilidade como principais motivos pelos quais os trabalhadores exercem a atividade.
A pesquisa mostra que seis em cada dez motoristas não gostariam de ser empregados pelo modelo CLT para dirigir por aplicativos (60%), enquanto 25% gostariam e 14% não souberam responder. Considerando apenas os respondentes, a rejeição ao enquadramento celetista chega a sete em cada dez trabalhadores. Em relação à modalidade intermitente, inserida na CLT em 2017, o sentimento é ainda mais negativo: 66% dos motoristas disseram que o modelo não se adequa às suas necessidades e, considerando somente quem soube responder, o percentual de rejeição à modalidade intermitente sobe para 76%.
O Datafolha fez ainda uma terceira pergunta sobre o tema, questionando se os motoristas aceitariam mudar para um emprego CLT ganhando o mesmo valor líquido que recebem atualmente. A maioria (54%) respondeu que não e, excluindo aqueles que não souberam responder (18%), 66% dos motoristas descartam mudar para a CLT ainda que ganhando igual.
O levantamento ouviu aleatoriamente 1.800 motoristas com cadastro ativo na plataforma da Uber, em todas as regiões do país, entre os meses de maio e agosto de 2025.
Regulamentação e expectativas
Em meio às discussões sobre a regulação do trabalho dos motoristas por aplicativos, em andamento na Câmara dos Deputados, a pesquisa avaliou as ações que os profissionais esperam do governo. A maioria (52%) afirma desejar auxílio para a compra de veículos, com linhas de financiamento ou incentivos. Para 17%, a medida mais importante está relacionada à Previdência; 7% esperam programas de capacitação; e 1% cita a melhora da remuneração ou a definição de uma tarifa mínima por quilômetro. Já 21% preferem que não haja nenhuma intervenção do poder público, e outro 1% diz esperar apenas que não sejam cobradas taxas ou impostos da categoria.
Em relação à proteção previdenciária, ponto central nos debates em Brasília, 60% dos motoristas declaram estar cobertos pela previdência pública ou por planos privados. Desse total, a maioria contribui ao INSS por ser empregado de empresa privada ou pública (33%), enquanto 18% estão cobertos como profissionais autônomos e 9% possuem apenas previdência privada. Entre os que não estão cobertos por nenhum tipo de previdência, os motivos mais citados são o custo (32%), a incompatibilidade do sistema atual para a realidade do motorista (23%) e a alta burocracia (17%).
Os custos relacionados ao veículo, como manutenção e conserto, aparecem como as maiores preocupações de médio e longo prazo para os motoristas (49%). Na sequência estão o medo de assaltos (37%), o receio de perder a renda por não poder dirigir por causa de acidentes (36%) e o risco de afastamento por doenças (31%).
Insegurança jurídica
O enquadramento jurídico do trabalho intermediado por aplicativos está sendo discutido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que desde março de 2024 definiu que um processo envolvendo a Uber tem repercussão geral, o chamado “Tema 1291”, ou seja, a decisão será aplicada por todas as instâncias. Em outubro, depois de ouvir argumentos das partes e entidades admitidas no processo, o caso foi suspenso e ainda não tem data para ser retomado.
O Datafolha aponta que 56% dos motoristas concordam que a falta de uma definição sobre o tema pelo Poder Judiciário causa insegurança sobre o próprio futuro. Segundo o levantamento, a maioria procuraria outra atividade como autônomo (50%) ou empregado (16%) em caso de uma decisão que determine que todos os motoristas tenham vínculo de emprego com as plataformas.
Perfil dos motoristas
De acordo com a pesquisa, a maioria dos motoristas é chefe de família (90%), tem ensino médio completo (58%), fica até 20 horas por semana online nas plataformas (60%), possui outra fonte de renda além dos aplicativos (58%), dirige com mais de um app no dia a dia (74%) e pretende continuar trabalhando com as plataformas (72%).
Os principais motivos para atuar nas plataformas são o aumento do custo de vida no Brasil (87%), seguido pela flexibilidade e autonomia para definir quando e onde trabalhar (84%), a possibilidade de ganhar dinheiro e realizar projetos pessoais ou de familiares (80%) e a necessidade de complementar uma renda insuficiente (79%).
Debate regulatório
Para o diretor de Políticas Públicas da Uber, Ricardo Leite Ribeiro, a pesquisa oferece novos dados para ampliar a compreensão sobre a realidade do trabalho por meio de plataformas e traz informações importantes sobre as preferências dos trabalhadores. “Os dados mostram que o motorista valoriza a flexibilidade e rejeita modelos que restrinjam sua liberdade ou engessem a dinâmica atual”, afirma. Segundo ele, “é preciso ter cuidado no debate regulatório para que as eventuais mudanças não acabem por comprometer o modelo justamente naquilo que os trabalhadores efetivamente valorizam nele hoje”.
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