O juiz do Trabalho Paulo Roberto Dornelles Júnior defendeu uma abordagem flexível e gradual para a regulação do trabalho por aplicativos durante audiência realizada na última quarta-feira (8) na Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados. Mestre em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universitat Pompeu Fabra (Espanha) e autor do livro A Plataformização das Relações de Trabalho, Dornelles Júnior afirmou que não existe um único tipo de plataforma nem um único tipo de trabalhador plataformizado, e que qualquer lei precisa reconhecer essa diversidade.
“Não existe uma plataforma. Existem várias plataformas, com diferentes modos de atuação. E não existe um trabalhador plataformizado — existem vários. Alguns dependem exclusivamente disso, outros usam como complemento de renda. Não dá para colocar todos no mesmo rótulo”, explicou.
Paulo Roberto Dornelles Júnior alerta para os riscos de generalizações
Dornelles Júnior destacou que o debate sobre a natureza jurídica do trabalho por aplicativos é complexo e multifacetado. Para ele, enquadrar todos os motoristas e entregadores como empregados ou autônomos cria distorções e insegurança jurídica.
“A gente cria talvez um problema no sistema quando escolhe um dos polos sem considerar as diferenças. Esses trabalhadores quebram três paradigmas clássicos do emprego: o trabalho é externo, a jornada é flexível e a subordinação é atípica”, afirmou.
O juiz explicou que, diferentemente do trabalho tradicional, o serviço prestado nas plataformas não é interno, nem totalmente controlável, e muitas vezes não é exclusivo, já que um mesmo motorista ou entregador pode atuar em diferentes aplicativos. Para ele, o desafio está em compatibilizar o novo modelo digital com as estruturas jurídicas tradicionais.
Paulo Roberto Dornelles Júnior avalia as opções de regulação
Dornelles Júnior afirmou que o Congresso tem diante de si três caminhos possíveis: não fazer nada e manter o cenário atual de incerteza; declarar todos os trabalhadores como empregados; ou criar uma terceira categoria jurídica. Segundo ele, nenhuma das opções é perfeita, mas o projeto em discussão na Comissão “tenta resolver de forma elegante” o impasse.
“O projeto traz a ideia de que o trabalhador precisa ser autônomo, de fato. Se houver uma plataforma que não respeite isso, que seja uma ‘plataforma fake’, então ela deve responder como empregadora. A lei não resolve tudo, mas oferece uma diretriz”, observou.
O juiz ressaltou que o texto em debate avança ao prever contribuições previdenciárias por parte das plataformas, reduzindo lacunas de proteção social, mas ainda precisa evoluir na questão de acidentes de trabalho.
“Talvez tenhamos que refletir sobre uma proteção para acidentes, mas o importante é que o projeto já estabelece um princípio de responsabilidade previdenciária. Isso é um passo importante”, avaliou.
Paulo Roberto Dornelles Júnior defende atuação da Justiça do Trabalho
Dornelles Júnior reforçou que eventuais conflitos entre motoristas e plataformas devem ser solucionados pela Justiça do Trabalho, por ser o ramo do Judiciário com maior expertise em relações laborais complexas.
“As controvérsias precisam ser resolvidas pela Justiça do Trabalho. Temos experiência para isso, e certamente será útil”, defendeu.
O magistrado mencionou o trabalho da professora Tatiana Ferraz, que sustenta a mesma posição, e destacou que a especialização da Justiça do Trabalho garante uma aplicação mais técnica e equilibrada da futura lei.
Paulo Roberto Dornelles Júnior propõe revisão periódica da legislação
Dornelles Júnior também sugeriu que o Congresso inclua no projeto uma cláusula de transitoriedade ou revisão periódica, permitindo ajustes à medida que o setor evolui. Para ele, a lei pode errar, mas precisa estar aberta a correções.
“O Congresso pode errar ou acertar nessa solução, mas ninguém pode dizer que foi omisso. É melhor agir, ouvir e legislar do que se omitir diante de um dos temas mais difíceis do mundo do trabalho”, afirmou.
O juiz elogiou a postura do Legislativo em enfrentar um tema novo e globalmente desafiador, destacando a importância de ouvir a sociedade e especialistas para construir uma legislação que equilibre proteção social e liberdade econômica.
“O que o Brasil precisa é de uma Câmara atuante, que ouça, legisle e busque soluções possíveis. Esse é o caminho da responsabilidade”, concluiu.