Motoristas reclamam dos valores baixos das corridas nos modelos de leilão da inDrive e 99Negocia, mas passageiros aprovam: “Quero pagar menos.”
Publicado em 29/05/2024 – Atualizado em 20/06/2024
Nos últimos anos, observou-se uma evolução nos modelos de negócios de aplicativos de transporte.
Tradicionalmente dominado por empresas como Uber, 99 e Lyft, que possuem um sistema de precificação dinâmica baseado na demanda, o mercado está se adaptando com a introdução dos modelos de leilão, como 99Negocia, inDrive e Uber Acuerdos (este ainda não disponível no Brasil).
No país, a primeira empresa que ganhou espaço com este modelo foi a inDrive, que chegou por aqui em 2020.

inDrive: o que é e como funciona?
A inDrive é um aplicativo de transporte concorrente direto da Uber e 99 no Brasil e que funciona no modelo de leilão de corridas.
O passageiro seleciona sua origem e destino e define quanto deseja pagar pelo trajeto.
No entanto, ele não pode definir qualquer valor, pois a empresa estipula um preço mínimo e sugere um valor.
No exemplo abaixo, a inDrive sugere para esta corrida o valor de R$ 13 e o passageiro pode oferecer, no mínimo, R$ 10 para o motorista.

Antes de pedir a corrida e procurar pelo motorista, o passageiro pode selecionar duas opções adicionais (mais de 4 passageiros e Assento do carro) ou inserir um comentário para o motorista, caso precise informá-lo de algo a mais.
O passageiro também pode selecionar a opção de aceitar automaticamente a oferta do preço que estipulou. Isso porque, assim como ele sugere um preço pelo serviço, o motorista pode realizar uma contraproposta.
Caso a corrida não seja aceita, a inDrive sugere que o passageiro aumente o preço da proposta.
As corridas são pagas diretamente ao motorista, em dinheiro, pix ou maquininha. Em 2023, a inDrive anunciou que estava testando o pagamento no cartão no app.
A taxa do aplicativo para o motorista é de 9,5% e é descontada de forma pré-paga, ou seja, o motorista recarrega e vai sendo descontado de acordo com a realização das viagens.
99Negocia: o que é e como funciona?
O 99Negocia é a categoria da 99 para negociação do preço da corrida entre o motorista e o passageiro.
Após um período de teste, a empresa anunciou em junho de 2023 que estava levando o modelo para 200 municípios do Brasil. Em janeiro de 2024, ele chegou à cidade de São Paulo.
Ele funciona de maneira similar à inDrive e o passageiro pode negociar o preço da corrida com o motorista.
As corridas, por padrão, são mais baratas do que no 99Pop.
No exemplo abaixo, a corrida no 99Pop está R$ 20,80 – com preço dinâmico – e o passageiro pode oferecer de R$ 16,47 a R$ 36,60. O valor sugerido pela empresa é de R$ 18,30.

Motoristas Reclamam: Corridas Mais Baratas e Ganhos Reduzidos
Esses modelos permitem que motoristas e passageiros negociem diretamente o preço das corridas, o que pode representar uma mudança nas estratégias de precificação e na experiência do usuário. No entanto, alguns motoristas alegam que a estratégia, que inicialmente seria para garantir mais independência para o motorista, acaba diminuindo ainda mais seus ganhos, com corridas ainda mais baratas.
É o caso de Deivys Vieira dos Santos, motorista de app que atua em Ribeirão Preto. Ele conta que os passageiros estão usando o 99Negocia para diminuir ainda mais o valor das corridas e exemplifica que se uma corrida de R$ 17,00 não é aceita por ninguém, o passageiro baixa ainda mais o valor da viagem.
“O 99Negocia piorou meu trabalho e a maioria das viagens são péssimas, pois muitas pessoas acabam diminuindo ainda mais o valor das corridas. São muito poucas as viagens em que os passageiros colocam um valor justo. Nos aplicativos que não trabalham com leilão, os valores são ‘melhores’. Exemplo: quando estou em um horário de pico, que geralmente é difícil encontrar motorista, o certo seria aumentar um pouco o valor para valer a pena. No entanto, muitas pessoas acabam baixando os valores das viagens. Uma viagem com o dinâmico daria uns R$ 30, mas com a negociação esse valor chega a ser 25% menor. Então, no horário de pico, que seria um horário para a gente ganhar um dinheiro a mais, acabamos diminuindo o ganho, pois muitos passageiros diminuem o valor”, lamenta o motorista.
Ele dá mais um exemplo, contando que de sua casa até o shopping mais próximo, que fica em torno de 10 km, a 99 Pop cobra R$ 16,30: “No 99 Negocia, eles já sugerem um valor mais baixo que o normal. Quando clico em negociar o valor, consigo abaixar esse valor para até R$ 13,95. Ou seja, uma corrida de R$ 16,30, que já é baixa, as pessoas conseguem baixar ainda mais, e isso complica para a gente. Eu não aceito, mas tem motoristas que aceitam, o que nos prejudica muito. Na minha opinião, deveria haver um limite, para não ser mais barato do que o Pop.”
Ele finaliza dizendo que, em sua visão, a intenção do 99 Negocia é oferecer um valor a mais para que os motoristas cheguem mais rápido. Só que os passageiros estão abaixando os valores.
“Quando oferecemos um valor razoavelmente bom, eles cancelam a oferta e a corrida aparece duas, três, quatro, cinco vezes para nós com um valor baixo. Aí, quando aumentam, é só em 10 centavos, o que é ridículo”, descreve Deivys.
Por outro lado, o motorista conta que, com a inDrive, é difícil os passageiros diminuírem o preço que está estipulado no UberX ou no 99Pop: “Apesar de não rodar tanto pela inDrive, eles tendem a aumentar um pouco mais.”
Ian Rocha, influenciador e motorista de app, também relata sua decepção com os modelos de leilão. Segundo ele, o início do 99Negocia chegou com taxas menores do que a corrida normal do 99Pop.
“A princípio parecia atrativo, pois havia taxas menores. No entanto, ao analisar o 99 Negocia, percebi que, apesar das taxas menores, as corridas não eram melhores e muitas vezes eram equivalentes ou até piores do que as corridas já existentes. Sabendo que essas taxas menores eram por um período definido, eu sabia que esse modelo ia prejudicar nossos ganhos. Com base na experiência do inDrive, percebo o seguinte: quando existem três modelos de tarifação, sempre tento pegar a intermediária ou a mais cara. A cada 100 tentativas, conseguir duas ou três corridas melhores é muito, resultando em um sucesso de apenas 2 a 3%. A maioria das corridas sai pelo preço mais barato, que geralmente é menor do que o das corridas normalmente ofertadas.”
Ian diz que, para ele, não faz sentido trabalhar com um leilão de corrida: “Quando há leilão de corrida, como nos modelos do inDrive e do 99Negocia, o passageiro tenta pagar o mínimo possível. Embora haja situações em que o passageiro pague melhor, essas são tão raras que esse modelo acaba prejudicando mais do que ajudando. Por exemplo, um passageiro que está em um local isolado, onde nenhum motorista quer atender, pode ofertar mais por uma corrida, tornando-a interessante para o motorista. Contudo, esses casos são exceções. A maioria das corridas não é assim. O modelo de leilão é ruim porque abaixa o preço das corridas, já que o passageiro sempre tenta pagar menos. Não conseguimos negociar para cima, pois o passageiro quer sempre pagar menos, e há motoristas que, muitas vezes, não sabem calcular seus custos ou estão com pressa. Assim, sempre há motoristas dispostos a aceitar menos, e nós acabamos ganhando menos.”
Ele explica que a diferença na dinâmica de trabalho entre aplicativos tradicionais e os que usam leilão é que o leilão permite que o passageiro pague menos. Para Ian, muitos motoristas não têm a competência ou capacidade de analisar quando uma corrida é rentável ou não, além de não saber quanto o carro gasta por quilômetro rodado ou quais são os custos reais do trabalho. “Eles veem uma corrida pagando um valor que parece bom, mas que na verdade não é. Então, por falta de conhecimento, acabam aceitando corridas ruins em leilões, que não pagam o suficiente”.
“Em vez de ganharmos mais com o modelo de leilão, acabamos ganhando menos. A dinâmica do trabalho muda para uma competição constante com outros motoristas, o que considero prejudicial. Prefiro que as corridas sejam ofertadas diretamente para mim e outros motoristas, para que eu possa escolher aquelas que pagam melhor. Quando as corridas são ofertadas de forma pública, quase não consigo pegar corridas boas, pois sempre há alguém aceitando as corridas de menor valor”, finaliza o influenciador.
Passageiros Aprovam Flexibilidade dos Modelos de Leilão
Para os usuários, a experiência com os modelos de leilão costuma ser positiva, como nos conta Gabriel Ghantous:
“A minha experiência com os modelos de leilão em comparação aos modelos de preço fixo é positiva. Ela agregou muito em momentos em que o valor do transporte com preço fixo estava muito alto, me ajudando várias vezes. Acredito que por o modelo de leilão oferecer essa versatilidade, esse poder de escolha ao usuário, ele oferece mais justiça. Mas tem um ponto negativo, que eu percebi, por exemplo, na inDrive: uma instabilidade muito grande nos valores. Uma corrida às vezes era muito mais barata do que na Uber ou na 99, e outras vezes era muito mais cara, mesmo negociando. Não sei se isso é devido a um menor tráfego de usuários no aplicativo comparado aos outros dois. Enxerguei dessa maneira, sabe, uma instabilidade de preços”, relata Ghantous.
Ele ainda conta que, em algumas oportunidades, geralmente quando utiliza o 99Negocia, coloca o preço mínimo e espera alguém aceitar naquele preço mínimo e que nunca aumentou o valor das corridas:
“Se eu só recebo ofertas muito mais altas, acabo recorrendo ao 99Comfort ou algum outro serviço com preço estabelecido, já que não vou estar ganhando um desconto alto. E eu nunca aumentei o preço das corridas por estar com pressa e querer que os motoristas aceitem uma viagem mais rápido. Quando quero uma corrida mais rápida, utilizo sempre o preço fixo e escolho uma categoria de transporte mais alta, às vezes um Uber Black ou o 99Plus. Utilizo uma categoria mais alta porque geralmente eles tendem a chegar mais rápido, pelo menos nas localizações onde costumo pedir.”
A passageira Bárbara Panni também expressa sua preferência pelos modelos de leilão:
“Na maioria das vezes, eu uso o 99 Negocia, porque ele tem um preço mais baixo na corrida, mas nem sempre porque eu não acho que o preço normal está justo, é porque eu quero pagar mais baixo mesmo. Geralmente os motoristas aceitam esse valor mais baixo e eu acho esse modelo mais justo, porque você pode escolher quanto quer pagar em uma corrida e não simplesmente aceitar o valor que eles te obrigam a pagar. E eu nunca aumentei o preço, sempre abaixei, por achar o valor muito alto e por querer pagar menos também.”
Impacto dos Leilões na Concorrência e Preços
A equipe do 55content conversou com o economista Anderson Monteiro sobre qual é o impacto potencial dos modelos de leilão sobre a concorrência e preços no mercado de transporte por aplicativo. Ele nos respondeu que acredita que não será uma competição agressiva, porque o próprio motorista pode decidir se o valor oferecido pelo cliente compensa para ele ou não.
“Acredito que o livre mercado é justamente isso: ele terá a opção de aceitar a corrida ou não. Às vezes ele está em um ponto específico, outras vezes pode estar mais distante, enquanto outro motorista está mais próximo do cliente que solicitou o serviço. O motorista mais próximo pode oferecer um desconto, pois gastará menos tempo e combustível, sendo vantajoso para ele aceitar a corrida. Para o motorista que está distante, talvez não compense ajustar o preço.”
Ele completa dizendo que, no longo prazo, acredita que essa situação se normalize e não resultará em problemas graves no aplicativo ou no serviço: “Os motoristas usarão essa negociação a seu favor. Se um motorista estiver longe do cliente e não achar vantajoso, ele não aceitará a corrida. Se outro estiver perto e ver que compensa, ele aceitará. Mas, no longo prazo, acho que isso não alterará nada significativamente.”
Questionado sobre se existem preocupações regulatórias ou de mercado que podem surgir com a popularização deste modelo, ele diz que toda regulamentação imposta pelo governo é prejudicial. “O que deve prevalecer é a liberdade do motorista de decidir se vale a pena para ele ou não. Para mim, isso já é uma forma de regulação do livre mercado. É isso que deve prevalecer”, acrescenta.
Monteiro finaliza dizendo que acredita que a liberdade do motorista de decidir se aceita ou não uma corrida por um determinado preço é positiva.
“Isso me lembra os taxistas de antigamente, que negociavam o preço antes de ligar o taxímetro. Vejo isso como um ponto positivo também para o motorista, pois ele pode avaliar sua proximidade ao cliente e decidir se aceita ou não a corrida. Se estiver perto, pode aceitar; se estiver longe, pode considerar que não vale a pena pelo preço oferecido e, assim, cobrar mais. Isso também beneficia o cliente, que pode acabar pegando um carro que chegará mais rápido e, possivelmente, com um preço mais acessível”, conclui.
99 e inDrive Defendem Estratégias de Leilão
A equipe do 55content entrou em contato com as plataformas Uber, 99 e inDrive solicitando um posicionamento sobre como o modelo de leilão está alinhado com os objetivos estratégicos da empresa e se existem planos para expandir ou ajustar esse modelo baseado no feedback do usuário ou resultados operacionais.
Enquanto a Uber não nos retornou até o momento de publicação desta matéria, a inDrive respondeu que: “a inDrive nasceu com a proposta de modelo P2P, que permite a livre negociação entre o usuário e o motorista e possibilita um acordo entre as melhores condições para ambos. Esse modelo é a essência da inDrive e é baseado no valor principal da empresa: o combate à injustiças. Apesar de estar constantemente trabalhando para oferecer novas soluções de mobilidade e otimizações na plataforma, a inDrive manterá o formato de operação proposto em sua criação, destacando a livre negociação como seu grande diferencial no mercado de mobilidade e combatendo práticas de preços abusivos. É justamente por oferecer um modelo operacional que propõe a liberdade de escolha que a empresa consegue se ajustar para trazer a menor taxa de comissão do mercado (9,99%). A proposta é simples: quem deve ganhar mais é o motorista, quem tem autonomia para selecionar preço e demais prerrogativas para a viagem.”
Já a 99 respondeu em nota:
“A 99 é uma empresa que trabalha constantemente com pesquisas para entender as necessidades dos usuários e lançar produtos que façam sentido para o seu dia. Pensando cada vez mais em democratizar a mobilidade urbana, nos últimos 2 anos, o investimento da companhia foi de mais de R$ 200 milhões em inovação e tecnologia. Como exemplo desse esforço, estão os lançamentos das categorias 99Negocia, 99Plus e 99Moto.
As modalidades fazem parte de um marco da plataforma, que nos últimos 12 meses atingiu mais de 50 milhões de passageiros, registrando um crescimento de 25% em menos de um ano de usuários cadastrados. Já em relação aos motoristas e motociclistas parceiros, tivemos um aumento significativo de 35% em condutores cadastrados na 99, alcançando 1,5 milhão.
O 99Negocia foi lançado em junho de 2023 e teve como principal objetivo reforçar a autonomia e flexibilidade entre passageiros e motoristas na negociação de corridas. A categoria está presente em mais de 1.900 municípios e grandes metrópoles como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba, Brasília, Recife, Salvador, Fortaleza e Manaus.
A categoria vem demonstrando ótima adesão tanto para os passageiros quanto para os motoristas parceiros em todas as cidades atuantes. O serviço, que permite aos passageiros e motoristas negociarem o preço das suas corridas de acordo com a necessidade, conta com a transparência como uma das principais vantagens da categoria. Nela, é possível acessar as informações dos condutores previamente disponíveis na plataforma, facilitando a escolha do perfil e mantendo a segurança para ambos.
Assim como as demais modalidades, a segurança é um pilar fundamental na 99, com mais de 50 ferramentas destinadas à proteção de usuários e motoristas integradas na plataforma, que visam garantir viagens mais tranquilas. Desse modo, a companhia investe continuamente em recursos de alta inovação, com sistemas de checagem, validação de cadastros, reconhecimento facial de todos os motoristas, compartilhamento de rotas, botão de emergência, acompanhamento de corridas em tempo real e uma central de atendimento 24 horas capacitada para prestar todo tipo de suporte. O serviço ainda permite que os passageiros e motoristas possam usufruir de maneiras seguras de pagamento, incluindo PIX, dinheiro, cartão de crédito, débito e saldo da 99Pay, a carteira digital da 99, para conveniência de todos os envolvidos.”