Moisés Freitas trabalhava em uma loja de móveis planejados quando decidiu virar motorista de aplicativo.
Logo de cara, não foi aceito na Uber e partiu para a 99. Foi lá que virou o mago ao, em plena pandemia, faturar R$ 10 mil em apenas um mês.
Adotou o apelido e, ao contrário de boa parte dos influenciadores do setor, que fizeram fama com o nome da outra gigante do mercado, tornou-se o Mago da 99.
Seu Instagram conta com quase 40 mil seguidores e seus vídeos já foram vistos 5 milhões de vezes no Youtube.
Moisés diz agora que quer representar os motoristas cariocas em uma cadeira do Palácio Pedro Ernesto, a Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro.
Qual é a sua história, Moisés?
Sou pai de quatro filhos e tenho a alegria de ter uma família grande. Nossa subsistência depende integralmente de trabalhos vinculados a aplicativos de transporte. Antes de me aventurar nesse ramo, eu atuava em uma empresa especializada em móveis planejados, o que difere bastante da minha realidade profissional atual como motorista de aplicativo. Mas, minha paixão sempre esteve atrelada ao universo automotivo. Portanto, foi uma transição natural aliar esse interesse pessoal com uma oportunidade profissional. Com o objetivo de adquirir um veículo mais recente, acabei por integrar esse desejo ao meu trabalho, o que trouxe inúmeras satisfações e perspectivas de futuro na profissão que exerço.
E como foi esse começo?
Inicialmente, trabalhei por cinco anos em uma empresa de móveis planejados, um período que valorizo muito em minha jornada profissional. Durante o último ano nesse emprego, busquei um novo desafio: decidi explorar o setor de transportes por aplicativo. A oportunidade surgiu quando, após adquirir um carro e assumir as respectivas prestações, testei o aplicativo para verificar seu potencial de renda extra. Em um dia particular, após ser dispensado mais cedo pelo meu então patrão, tive a chance de me dedicar inteiramente ao aplicativo, e foi uma revelação.
Eu já fazia uso do aplicativo nos meus trajetos do trabalho para casa, mas foi neste dia que eu realmente explorei o potencial do trabalho integral com o aplicativo. O resultado financeiro positivo desse dia me fez refletir sobre minha carreira. Percebi que, apesar de estar estagnado no setor de montagem de móveis, tinha uma paixão não realizada pelo mundo automotivo e uma oportunidade emergente com os aplicativos de transporte.
Foi uma combinação de fatores — minha afinidade com automóveis, a flexibilidade desejada e a possibilidade de um retorno financeiro melhor — que me impulsionou a deixar o emprego com carteira assinada. Optei por seguir minha paixão e embarcar de vez na carreira autônoma de motorista de aplicativo. Esse salto foi um movimento estratégico alinhado com meus interesses e objetivos pessoais, marcando o início de um novo capítulo na minha vida profissional.
Como é que foi essa ideia de começar a produzir conteúdo?
Durante a pandemia, eu estava alcançando resultados impressionantes enquanto muitos estavam lutando. Até o Floripa reconheceu isso; gravamos uma live juntos onde ele mencionou meus 8 mil reais em um mês, e depois eu consegui fazer 10 mil. As pessoas começaram a se perguntar como eu estava ganhando tanto dinheiro, principalmente porque eu não era ativo nas redes sociais na época. Eu só tinha o WhatsApp para conversar com os colegas. O que eu fazia era enviar prints dos meus ganhos para inspirar as pessoas, para que elas vissem que, se eu conseguia, elas também poderiam. Queria que esses resultados servissem de inspiração no dia a dia delas.
Sabemos que a pandemia foi um período difícil para muitos motoristas, com problemas psicológicos sérios por não conseguirem sustentar suas famílias. Então, comecei a compartilhar esses prints com um colega, sem saber que ele estava divulgando em outros grupos. Foi ele quem sugeriu que eu criasse uma conta no Instagram. Eu era avesso às redes sociais naquela época, tinha até excluído meu Facebook. Mas ele insistiu, dizendo que eu iria ‘bombar’ se mostrasse meus ganhos e compartilhasse meu dia a dia. Então, decidi criar um perfil, e ele me ajudou a escolher o nome baseado nos apelidos que eu estava ganhando, como ‘mago’ e ‘bruxo’.
Antes disso, quando comprei meu carro, eu tinha a intenção de dirigir para a Uber, mas não fui aceito. Isso me preocupou bastante porque eu estava endividado com o carro, além de seguros e manutenção futura. Um amigo me sugeriu tentar a 99. Comecei a dirigir para eles e, antes que percebesse, veio a pandemia e os resultados começaram a aparecer. O apelido ‘mago’ pegou no WhatsApp e as coisas decolaram. Disseram-me que trabalhar com a 99 poderia abrir portas, e realmente abriu. Acabei fazendo parte de vários projetos com eles, inclusive participei do Big Brother Brasil. E aqui estou, com tudo isso tendo se tornado muito mais do que apenas dirigir; tornou-se uma marca pessoal reconhecida.
E como foi começar a ser reconhecido?
Durante a pandemia, as pessoas ficaram intrigadas querendo saber quem era esse cara que estava sempre em movimento. Elas começaram a me seguir no Instagram, movidas pela curiosidade, para acompanhar o que eu fazia o dia todo e por onde eu andava. Alguns chegaram a me seguir fisicamente, só para ver o que eu estava fazendo naquele período.
Até hoje, as pessoas me param na rua. Elas vêm até mim, me chamam pelo apelido, pedindo dicas e ajuda com problemas específicos, querendo saber como capturar corridas de forma eficaz, por exemplo. Sempre me mantive humilde e aberto para explicar e conversar com quem se aproximava para trocar uma ideia. Isso criou um vínculo com o público que persiste até hoje.
Quanto à situação atual, as pessoas me perguntam se ainda é possível ter um bom rendimento com aplicativos como durante a pandemia. Realmente, houve uma queda significativa nos ganhos. A pandemia foi um momento atípico, com uma demanda diferente por corridas. Pós-pandemia, notei que, para manter um rendimento satisfatório, preciso trabalhar muito mais horas, principalmente devido à diminuição dos valores pagos pelas corridas. Essa queda se acentuou após uma manifestação de motoristas de aplicativos.
Atualmente, a realidade é que precisamos passar mais tempo na rua para conseguir um valor considerável. E identifiquei que a necessidade de trabalhar nos finais de semana é maior, já que durante a semana os ganhos não são tão bons. Nos finais de semana, temos os eventos e a tarifa dinâmica, e a 99 oferece 100% dos lucros apenas nesses dias.
Portanto, a dica que dou para os colegas motoristas é aproveitar os sábados e domingos, pois é quando os rendimentos são maiores. Nos dias mais fracos, como terças sem jogos ou às vezes quartas-feiras, pode valer a pena tirar uma folga.
Quando foi que as marcas começaram a chegar em você?
Para te colocar a par da situação, comecei essa trajetória entre 2018 e 2019. Naquele tempo, ao pegar o carro, eu estava afundado em dívidas. Até hoje me surpreendo como meu nome foi aprovado – foi realmente algo divino. Naquela época, muitas pessoas ao meu redor eram contra a ideia de eu trabalhar como motorista de aplicativo, incluindo minha mãe e minha esposa, que tinham suas reservas. ‘Você vai começar com isso agora? Estamos cheios de dívidas e com nosso segundo filho a caminho, morando em uma kitnet’, elas diziam. Mas eu estava decidido a fazer o que gostava: dirigir, estar com o público, e também por adorar carros. Queria proporcionar mais conforto para minha família, sonhava com uma casa maior para nós.
Com o tempo, as coisas foram melhorando, graças a Deus. Consegui convencer minha mãe e minha esposa, que hoje me apoiam totalmente. Durante a pandemia, que foi de 2020 a 2021, passei quase um ano adaptando-me a nova realidade. Minha primeira parceria comercial foi com uma casa de óleo. O proprietário, notando que eu estava próximo de atingir 10 mil seguidores, propôs uma parceria. ‘Quero testar algo com você’, disse ele. ‘Começamos com a troca de óleo e depois vemos onde isso pode levar.’ Aceitei a proposta e comecei a trabalhar. Ele queria conteúdo de qualidade e assim fiz, postando regularmente, mostrando sua marca e o processo de troca de óleo, tudo filmado.
O resultado foi um sucesso estrondoso. Expliquei ao parceiro que não bastava só divulgar a marca; era necessário oferecer algo a mais, como descontos que chamassem a atenção do público. Ele entendeu e passamos a oferecer descontos para quem usasse o aplicativo. Com isso, seu negócio começou a crescer, ‘clica no link do Mago e ganhe um desconto’, dizíamos nos stories, e o WhatsApp dele não parava, cheio de motoristas agradecidos.
Com o passar dos anos, assinei um contrato firme com ele. Quando a 99 entrou em contato comigo, outras marcas começaram a se interessar também, mas foi o dono da casa de óleo quem primeiro apostou em mim, e ainda estamos juntos até hoje. Após a parceria com a 99, fui para o Big Brother, e com a visibilidade do programa, mais marcas começaram a me procurar, percebendo meu crescimento e o aumento do meu reconhecimento. Foi uma transformação incrível.
Qual foi a sacada que você teve pra conseguir ganhos tão altos na pandemia?
Minha principal estratégia foi realizar corridas curtas dentro do meu bairro. Frequentemente, eu ficava aguardando na porta de casa ou em pontos próximos, esperando por chamadas. Quando recebia uma corrida, eu a completava e retornava ao mesmo lugar para esperar a próxima. Fiz isso para manter minha taxa de aceitação alta no aplicativo da 99, pois isso influencia na prioridade dada a mim para novas corridas. Entendi que, ao cancelar frequentemente, o aplicativo pode ‘punir’ e diminuir as chamadas, interpretando como se eu não quisesse trabalhar. Portanto, eu aceitava todas as corridas que podia, chegando a fazer 40 ou até 50 por dia. Não sempre alcançava minha meta financeira, mas era um esforço contínuo, passando o dia todo na rua. Eu começava por volta das 6:30 ou 7 da manhã e só voltava para casa às 11 da noite, às vezes quase meia-noite.
Hoje você também roda com a Uber? Qual a diferença entre os dois apps?
Fiquei só na 99, tô com a 99 e inDrive hoje, mas meu foco real é na 99 mesmo. Os públicos da 99 são diferentes, são motoristas que, digamos, foram bloqueados na Uber.
Eles têm que se virar na 99 para ganhar a vida, o que cria um público bem diferente. Vamos começar falando do motorista, porque somos únicos nesse ponto. O público motorista na 99 é aquele que foi, de alguma forma, rejeitado pela Uber. Foram bloqueados lá e agora recorrem à 99, muitas vezes em meio a disputas judiciais com a Uber. Aí eles me procuram, pedindo ajuda: ‘Mago, me dá uma força, fui bloqueado na Uber, tô na justiça, preciso de uma força sua para começar na 99’. E cada app tem sua maneira de funcionar, isso também impacta o público de clientes na 99. Os clientes são totalmente diferentes. A 99 atende um cliente mais da periferia. Ela alcança onde a Uber não vai. Tipo, hoje, se você chamar um 99 no topo de um morro, ele vem. A Uber, não. Na Uber, você tem que descer até a avenida principal, fugir das áreas de risco, para conseguir chamar um carro pelo app. Por isso que a 99 ganhou esse espaço.
Já tive algumas reuniões com eles e, de fato, foi o que eles disseram. É verdadeiramente um projeto original da empresa. Trata-se, realmente, de um projeto periférico, criado especificamente para atender ao público de baixa renda.
Você disse que muitos motoristas da 99 são bloqueados na Uber, isso interfere na qualidade do serviço?
Não, essa é mais uma questão dos bloqueios injustos da Uber. Às vezes chega na justiça e a Uber nem sabe porque bloqueou.
E como está sendo sua experiência na inDrive?
Atualmente, estou utilizando a InDrive principalmente para corridas de média distância. Percebi que para as corridas mais longas, os clientes muitas vezes não estão dispostos a pagar o valor justo, aquele que calculamos ser necessário. No entanto, a InDrive tem sido muito útil para me deslocar quando a 99 não apresenta demanda.
Por exemplo, se percebo que a 99 está com poucas corridas disponíveis – algo que monitoro pela lista de chamadas do aplicativo – e não está ‘tocando’ nenhuma para mim, eu ativo a InDrive. Com ela, consigo ‘pescar’ uma corrida que me tire do ponto morto e me leve para uma área onde as corridas da 99 estejam mais frequentes.
Portanto, a InDrive serve como uma ferramenta estratégica para me reposicionar geograficamente, permitindo que eu continue trabalhando eficientemente e captando corridas através da 99.
Quais suas perspectivas para o futuro dessa profissão?
No momento, a questão da regulamentação está um tanto complicada. Ainda não temos informações concretas para discutir, já que nada foi definido. Parece que o processo está adiantado, com propostas já encaminhadas, aguardando apenas aprovação para que possamos seguir as novas regras estabelecidas. Então, por enquanto, não há muito o que se dizer a respeito disso.
Contudo, pessoalmente, pretendo continuar por muito tempo neste ramo de motorista de aplicativo. Tenho paixão pela direção, pelo contato com as pessoas e pela comunicação. Meu dia a dia é enriquecido ajudando os outros, e isso é algo que realmente valorizo.
Além disso, sou pré-candidato a vereador aqui no Rio de Janeiro para defender os interesses da nossa classe. Minha intenção é representar verdadeiramente os motoristas de aplicativo, sem vínculos com sindicatos ou associações. A comunidade de motoristas já está ciente do meu compromisso.
Mesmo que eu não seja eleito, a esperança é que outro motorista possa assumir esse papel, porque precisamos de alguém que lute por nós dentro do sistema. Precisamos de alguém que ofereça esse apoio ao governo.
Quanto à minha campanha, já estou filiado a um partido e recebendo apoio. Estou com o partido Podemos, que é um partido de centro e abriu as portas para mim e vai me ajudar na campanha.