Conhecer a história da Uber, 99 e Cabify nos ajuda a entender o novo contexto da mobilidade urbana nacional, além de compreender os melhores caminhos para o sucesso de um aplicativo de transporte.
Publicado em 11/10/2018 – Atualizado em 31/01/2022
Já tem um tempo que os aplicativos de transporte são as novas caras da mobilidade urbana. Sua popularização se deu pela forma de serviço inovadora, preços atrativos e conforto oferecido aos clientes.
Em 2018 os carros de aplicativo já eram o segundo meio de transporte mais utilizados pelos brasileiros, atrás apenas dos veículos próprios, segundo estudo do grupo Viva Real.
Quando falamos em aplicativos de transporte, alguns apps surgem nas nossas cabeças. Uma pesquisa de 2017, realizada pelo IBOPE Conecta revelou os apps de transporte mais usados no Brasil.
Na liderança disparada estava a Uber com 54% das preferências dos internautas brasileiros. Em segundo estava a 99, com 12%. Easy e Cabify apareciam com 5% e 4%, respectivamente.
Mudanças ocorreram, e em Agosto de 2019 a Uber registrava 69% de participação de mercado do país, enquanto a 99 tinha 24% e os 7% restantes estavam divididos entre outras empresas.
Ao observar a trajetória da Uber, 99 e Cabify, alguns dos principais aplicativos de transporte que já circularam no país, podemos entender com mais detalhes sobre esse setor da mobilidade urbana que a cada dia se desenvolve mais. Além disso, é possível tomar importantes lições sobre como conduzir um negócio do ramo.
A história da Uber
O aplicativo de transporte mais usado no Brasil foi fundado em 2009. Seus criadores foram os engenheiros Travis Kalanick e Garrett Camp.
Antes de montar aquele que seria um dos principais apps do século XXI, Kalanick e Camp se tornaram milionários após venderem suas empresas. O primeiro havia vendido o Red Swoosh, um serviço de compartilhamento de arquivos. Já Camp vendeu seu site de busca, o Stumble Upon.
Ambos eram amigos e estavam participando de um evento de tecnologia em Paris. Durante a estadia na cidade eles estavam com dificuldades de encontrar um táxi. Foi quando tiveram a ideia de juntar o conceito de motoristas particulares, algo antes muito caro, com o de táxi. Uma espécie de serviço de motoristas particulares compartilhados.
Quando retornaram para a cidade que moravam, São Francisco, começaram a montar o projeto. Em março de 2009 começou a funcionar a Uber Cab. Em junho de 2010, o app funcionava apenas com carros de luxo.
O primeiro passo foi atrair motoristas, que geralmente trabalhavam com parcerias com estabelecimentos. Segundo o site Administradores, os brasileiros que trabalhavam como motoristas e taxistas na Califórnia, foram um dos primeiros grupos a aderir à Uber.
A ideia inicial da Uber era trabalhar somente com carros luxuosos, a UberBlack que conhecemos hoje. Tanto que inicialmente o custo de um Uber era em média 5x maior do que o do Táxi. Por isso, seu público alvo eram empresários e pessoas ricas, que gostavam da comodidade do veículo, de pedir um transporte e não precisar pagar com dinheiro, já que o pagamento era feito pelo cartão.

Foi dessa maneira inclusive que o aplicativo chegou ao Brasil, durante a Copa do Mundo de 2014. A ideia de um serviço de luxo ainda estava em pauta na época.
Na medida que o serviço se tornou popular, foram surgindo as primeiras polêmicas, que giravam em torno da regulamentação e regularidade dos aplicativos de transporte.
Por ser vanguarda no quesito app de transporte, a marca da Uber rapidamente se tornou referência dessa nova modalidade que surgia.
Com cada vez mais pessoas utilizando seus serviços, no fim, a repercussão foi algo positivo para eles. Afinal de contas, ganhavam visibilidade sem gastar um real.
Em abril de 2019, a Uber entrou com a documentação para realizar seu processo de IPO, ou seja, comercializar suas ações dentro da bolsa de Nova Iorque e se tornar uma companhia de capital aberto.
Ao final do processo, a Uber foi avaliada em 82 bilhões de dólares.
A empresa encontra no Brasil um de seus principais mercados em todo mundo, sendo o segundo que mais gerou lucros para a companhia, atrás apenas de seu país natal, os EUA.
Presente em mais de 10 mil cidades ao redor do mundo e realizando cerca de 17 milhões de viagens e entregas por dia, a Uber se consolidou entre uma das empresas mais marcantes do mundo.
A Uberização
A história da Uber e seu impacto na sociedade e nas formas de consumo é inegável, ao ponto de provavelmente garantir à empresa uma vaga nos livros de história do futuro.
Isso porque, a companhia é a principal cara da vanguarda não só de um modelo de negócios, mas de um modelo de economia.
O termo ‘uberização’ foi cunhado para definir o modelo de negócios de serviços intermediados por plataformas e aplicativos que o cliente pode acessar diretamente. Mas não só isso, já que lado a lado com esse conceito anda o da economia compartilhada.
A economia compartilhada é um modelo econômico baseado na geração de renda através do compartilhamento de serviços, recursos e experiências.
Segundo a consultoria PwC, a previsão é que esse modelo movimente 335 bilhões de dólares em 2025. O número é 20 vezes superior ao levantamento de 2014. No Brasil, indicadores mostram que a economia compartilhada tem potencial de contribuir com mais de 30% do PIB de serviços.
“É como se décadas de transformações no mundo do trabalho culminassem na uberização. O desenvolvimento tecnológico das plataformas digitais, que vai se materializar nos aplicativos, catalisa esse processo.”
Ludmila Costhek Abilio, pesquisadora da Cesit – Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho do Instituto de Economia da Unicamp em matéria para a Uol
O termo também está ligado ao esvaziamento de direitos trabalhistas de profissionais autônomos.
A história da 99
A 99 marcou a história ao se tornar o primeiro Unicórnio brasileiro e “puxar a fila” de grandes startups de sucesso no país. Isso quer dizer que a empresa foi avaliada em mais de um bilhão de dólares, valor pelo qual ela foi vendida à multinacional chinesa da mobilidade, Didi, em 2018.
Foi fundada em 2012 pelos engenheiros brasileiros Ariel Lambrecht, Renato Freitas e Paulo Veras. Durante uma viagem para a Alemanha, um dos fundadores descobriu os apps para táxi. Começou o projeto em agosto de 2012.
No início a 99 trabalhava exclusivamente com táxi, a 99 Táxis. Logo, criaram a 99Pop, voltada para motoristas particulares.
Antes de ser vendida para a Didi, a 99 recebeu aporte financeiro dos chineses e do fundo de investimento SoftBank. Os investimentos chegaram a 420 milhões de dólares. Isso permitiu que a 99 contratasse 250 funcionários. Ao final do ano, a 99 já tinha um corpo de 400 trabalhadores.
Assim como a Uber, a 99 adaptou seu modelo de serviço para atender uma maior parcela do público. A 99 também teve um papel muito importante em mostrar que, mesmo com a dominância da Uber, o mercado da mobilidade urbana brasileira é enorme e tem espaço para mais players.
Segundo dados da própria 99, seu aplicativo conecta 18 milhões de passageiros a 600 mil motoristas, em mais de 1000 cidades no Brasil.
Ao ser adquirida pela companhia chinesa, a 99 passou a integrar o maior grupo de mobilidade do mundo:
“A empresa [DiDi] oferece uma gama completa de opções de transporte baseadas em aplicativos para mais de 450 milhões de usuários, incluindo táxi, carro particular, opções de luxo, ônibus, micro-ônibus, bicicleta e entrega de alimentos. Os passeios diários chegaram a 30 milhões, permitindo que mais de 21 milhões de motoristas na plataforma DiDi encontrem oportunidades flexíveis de trabalho e renda.”
99, em seu site
A DiDi é inclusive dona das operações da Uber em território chinês, direito que adquiriu em 2016, consolidando 90% de participação de mercado no terceiro maior país do mundo. Você pode conferir mais sobre a gigante chinesa da mobilidade aqui, em um conteúdo específico sobre eles.
Confira a entrevista do Paulo Veras para a Startse.
A história da Cabify
A Cabify nasceu na Espanha em 2011. Seu fundador foi o empresário Juan de Antonio. Durante suas viagens para Ásia e América Latina, ele encontrava muitas dificuldades pelo preço do táxi. Ele buscava negociar o preço das corridas com os motoristas, para que eles não usassem o taxímetro.
O protótipo da Cabify começou a atuar em Madrid e Barcelona, na Espanha. Logo, investidores dos Estados Unidos entraram no negócio. Em cerca de 6 semanas após seu lançamento, a Cabify contava com 20 mil usuários e 3 mil corridas realizadas.
Em 2012, a Cabify chegou no lugar onde foi inspirada, América Latina. A Cabify é sucesso no continente americano, tanto que 80% do seu faturamento provém de lá.
Em Abril de 2014, a Cabify já contava com 100.000 downloads. Em 2019, a Cabify incorporou a EasyTaxis, aumentando seu alcance em solo brasileiro.
No início o foco da Cabify era exclusivamente carros mais luxuosos, mais caros que táxi. Só em junho de 2013 que foi lançado o Cabify Lite, com carros menos luxuosos e preços menores.
A intenção da Cabify não é exatamente concorrer com a Uber e a 99. Na verdade, o app espanhol tem um público mais específico, de pessoas com maior poder aquisitivo. Tanto que a lista de carros que podem ser cadastrados na plataforma é mais limitada, e as corridas do app só podem ser pagas por cartão.
Esse é apontado como um dos motivos pelo qual o aplicativo não se manteve sustentável no país. No dia 23 de abril de 2021, a Cabify anunciou o fim das operações da empresa no Brasil.
Por ter como público-alvo uma parcela menor da população, que estava disposta a pagar um preço mais alto em troca de um serviço que proporcionasse maior conforto, a empresa naturalmente tinha uma limitação em seu mercado.
A ausência da opção de pagar o serviço em dinheiro, em um país onde a população majoritariamente utiliza cédulas também foi crucial para o não sucesso da operação.
A conclusão é que a falta de adaptação à realidade local brasileira, conduziu ao definhamento do serviço espanhol.
Conclusão
A expansão e popularização dos aplicativos de transporte é um marco de mudança da sociedade. É um mercado relativamente recente, mas que ao mesmo tempo já mostro u seu potencial.
Percebeu que a ideia dos três apps surgiram de forma parecida? Em algum momento os empreendedores identificaram a dificuldade de pegar um transporte em determinada região. Na verdade, é assim que nascem os principais negócios.
O tema tem sido mais comum recentemente não só aqui, mas também nas mídias tradicionais. Nós até fizemos para você uma lista com livros que contam a história dos aplicativos de transporte.
Temos falado no blog sobre como empreendedores de todo o Brasil vem identificando essa mesma dificuldade em suas cidades. A Machine democratizou a tecnologia dos apps de transporte, permitindo que seja criado um app próprio, que pode ser configurado por seus donos, da aparência até as tarifas.
As multinacionais do transporte não possuem a força da atuação regional. Além de não estarem presentes em todos os lugares, nem sempre operarão de acordo com o contexto local, como mostra o exemplo da saída da Cabify do país.