Criada em 2018, na cidade de Parnaíba (PI), a Ubiz Car nasceu de um desejo de empreender aliado à necessidade de oferecer um serviço de transporte local que unisse tecnologia e confiança. O gestor e fundador Alécio Cavalcante, de 35 anos, conta que a ideia surgiu após uma experiência pessoal com a Uber e uma reflexão sobre os desafios e as oportunidades de um modelo regional de mobilidade.
Durante um evento voltado à inovação e tecnologia, o Tech Nordeste, o empreendedor assistiu a uma palestra de João Kepler, um investidor popular no país: “Eu perguntei para ele: ‘Você acha que daria certo uma plataforma regional de mobilidade?’ E ele me respondeu: ‘Eu creio que não, porque essas big techs vão dominar tudo’. Aí eu pensei: ‘Não aceito esse ‘não’ como resposta’. Eu tinha que ver para acreditar”.
De volta à cidade piauiense, ele compartilhou a ideia com o sócio Elias Alencar (falecido em 2021, vítima de covid-19), e, juntos, decidiram criar uma plataforma própria. “A gente sempre teve essa ideologia de que relacionamento gera valor. Então, decidimos criar um negócio humanizado, com base na confiança. Esse é o nosso pilar”, afirma.
Do investimento à consolidação de uma marca
Com uma trajetória que começou cedo, aos 18 anos, vendendo bolsas sobre o capô de um carro, Cavalcante transformou sua experiência de vida em um modelo de gestão: “Quando você faz a coisa certa com a intenção certa, não tem como dar errado”.
A história da Ubiz Car se iniciou de forma quase artesanal. De acordo com o gestor, o investimento inicial foi de R$ 16 mil, dividido entre os dois sócios. Com esse valor, desenvolveram o primeiro aplicativo, com tecnologia indiana, e deram início às operações em setembro de 2018.
No primeiro mês, realizaram cerca de 1.600 corridas, número que saltou para 10 mil em apenas quatro meses. O crescimento acelerado trouxe entusiasmo, mas também desafios técnicos. “A gente começou a ver que o nosso aplicativo era bonitinho, mas travava. Então, percebemos que precisávamos mudar a tecnologia. Em 2019, migramos para a Machine.”
A mudança tecnológica coincidiu com a consolidação da marca. A cor amarela, que hoje é parte da identidade visual da empresa, foi escolhida por sugestão da filha do empreendedor, inspirada na música Yellow, do Coldplay. Segundo o gestor, cada detalhe carrega uma história e um propósito: “A gente construiu o conceito antes da marca. O nosso slogan, ‘confiança é tudo’, nasceu antes do logotipo. A confiança é o pilar que sustenta tudo o que a Ubiz Car faz”.
O modelo de franquias adotado pela plataforma
A Ubiz Car, hoje, está presente em mais de 100 cidades. A estratégia de crescimento foi pensada para o interior do Brasil, onde, segundo Cavalcante, ainda há espaço para inovação e necessidade de mobilidade com qualidade. “Nosso foco não é quantidade de motorista, é qualidade. Poderíamos ter 50 mil, mas o objetivo é fazer diferença na vida de quem trabalha com a gente.”
Atualmente, a plataforma conta com 2 milhões de clientes cadastrados e 8 mil motoristas ativos. O modelo de expansão é baseado em franquias e microfranquias, com as quais os empreendedores locais têm a possibilidade de abrir as próprias operações com suporte total da matriz: “A gente quer oportunizar pessoas a terem o seu primeiro negócio de mobilidade, com baixo custo e alto apoio. É uma mentoria contínua, não vendemos só tecnologia, vendemos conhecimento”.
O valor transacionado por mês gira em torno de R$ 10 milhões, conforme ele conta, resultado da soma de todas as operações regionais. Para o fundador, o segredo do sucesso está no equilíbrio entre propósito e sustentabilidade. “O mais caro nem sempre é o que custa mais. O mais caro é o que não te traz resultado. A gente aprendeu a fazer um negócio saudável, em que o motorista ganha, o passageiro confia e o empreendedor tem retorno”, defende.
Valorização do motorista desde o equilíbrio econômico
Cavalcante acredita que, desde que a Ubiz Car começou, o maior ativo da empresa são as pessoas. Por isso, a empresa adotou um modelo de remuneração que prioriza o ganho imediato: “Muito motorista trabalha hoje para pagar uma conta no dia. Então, ele precisa receber na hora. Isso é algo que valorizamos muito”.
A plataforma utiliza uma carteira de crédito que libera o pagamento imediatamente após cada corrida, inclusive nas transações feitas com cartão. Além disso, a empresa costuma subsidiar parte do valor das viagens em novas cidades para garantir a satisfação de motoristas e passageiros.
“A nossa visão não é sobre a taxa, é sobre o que fica para o motorista. 100% de uma corrida ruim é ruim; 80% de uma corrida boa é ótimo. Às vezes, a gente subsidia até 50% de uma viagem, para fidelizar o cliente sem prejudicar o motorista.” Nesse sentido, o gestor compartilha que as taxas, de acordo com a cidade, podem variar de valor nenhum até um máximo de 20%: “Começa no negativo e vai chegando no positivo até chegar no teto. E esse teto é de 20%, quando a cidade já tem uma modelagem consolidada de valores de viagens, e o motorista seja autossuficiente em seus ganhos”.
O empreendedor diz que o objetivo é manter o ganho médio de R$ 2 por quilômetro rodado, que ele afirma ser considerado ideal para que o motorista consiga trabalhar com tranquilidade e dignidade. “O motorista satisfeito entrega satisfação ao passageiro, e a confiança é o laço que conecta as pontas. Satisfação gera satisfação”, opina.
Crítica às big techs e defesa da mobilidade humanizada
Cavalcante não hesita em criticar o modelo adotado por gigantes como Uber e 99, que, segundo ele, priorizam volume e dependência em detrimento da sustentabilidade da profissão. “Eu costumo dizer que lá atrás o chicote era físico. Hoje, o chicote é o algoritmo. O motorista está preso numa escravidão moderna e não sabe”, defende. E acrescenta: “O nosso papel é trazer consciência e libertação para ele”.
Ele explica que o modelo de negócio das grandes plataformas não é voltado ao lucro direto com corridas, mas à valorização de ações na bolsa de valores, conforme a fala que ouviu do criador da plataforma. “O objetivo da Uber não é ser lucrativa. É ter fluxo, trazer dependência. E quem paga o preço disso é o motorista.”
Na visão do gestor, essa lógica cria um ciclo vicioso: mais motoristas significam preços mais baixos, o que compromete a renda dos profissionais e reduz a qualidade do serviço: “O mercado virou uma corrida para o fundo do poço. O motorista perde, o passageiro acha que ganha pagando menos, mas no fim perde também, porque o serviço piora”.
Segurança e confiança como propósitos
Diante dos problemas que enxerga nas grandes plataformas, a Ubiz Car aposta em um modelo de credenciamento presencial, especialmente, porque o gestor considera que “hoje existe um comércio paralelo de contas falsas em grandes aplicativos”. Ele destaca que a operação regional tem uma vantagem sobre isso: “O interior repugna esse tipo de coisa”.
Cavalcante detalha que todos os motoristas passam por entrevistas, vistorias de veículo a cada três meses e conferências por vídeo mensais, em vista de garantir segurança e autenticidade. “O passageiro precisa saber quem está dirigindo. Nós conhecemos cada motorista, cada carro. Isso é o mínimo que o cliente merece.”
Foco no motorista
“O ‘dia da independência do motorista’ é o dia em que ele decide não ligar mais uma plataforma que o explora”, determina. Para o gestor, a empresa aposta no poder da comunidade, na tentativa de unir os trabalhadores do setor. “Quando ele pode viver só com a Ubiz Car, com dignidade, esse é o nosso maior ganho”, enfatiza.
Segundo Cavalcante, o impacto social é parte essencial do negócio: “O maior resultado que a Ubiz Car traz não está só no financeiro. Está no bem que ela faz na vida de muitas pessoas. São famílias inteiras que dependem de uma filosofia de trabalho saudável”.
“A gente tem que usar o progresso para progredir. O diferencial de uma empresa hoje é ser gente, é ser humano.” O gestor acredita que o futuro da mobilidade está na humanização e na regionalização, e que o progresso tecnológico deve servir às pessoas, não o contrário. “O motorista satisfeito, o passageiro confiante e o empreendedor próspero: é essa a roda que faz a Ubiz Car girar. A gente não quer ser o mais barato, a gente quer ser o melhor”, reflete.
 
								 
								 
						 
											 
								 
								 
								