A história do Mobi 10 começa bem antes do app existir. Josimar Dias da Silva entrou na mobilidade como quem busca uma saída prática para um aperto financeiro. “Eu comecei a fazer mototáxi e Uber para complementar a renda”, conta. O trabalho anterior, como vendedor, não estava dando o retorno esperado. “O negócio que eu estava trabalhando não estava crescendo. Ao contrário, estava regredindo.” Aos poucos, o mototáxi deixou de ser extra e virou base. Foi nesse cotidiano, na rua, que ele percebeu que a reclamação era generalizada.
Segundo Josimar, o incômodo dos motoristas com as plataformas grandes se repetia todo dia. “Eu via a reclamação dos mototaxistas, dos motoristas, de que era ruim a taxa da 99, valor ruim de corrida.” E dali surgiu a faísca que viraria projeto. Ele lembra de ouvir com frequência que, se existisse uma alternativa local, os próprios motoristas ajudariam a construir esse caminho. “Alguns deles até falavam: ‘se tivesse um aplicativo local nosso, com as configurações que a gente aceitasse, a gente ia fortalecer esse aplicativo e fazer ele girar’.” Foi esse desejo coletivo, somado à experiência de quem já conhecia a realidade do volante, que empurrou o Mobi 10 para fora do papel.
De Cachoeiro ao litoral: o app mira onde falta Uber e 99
O ponto de partida do Mobi 10 foi Cachoeiro de Itapemirim (ES), cidade onde Josimar mora e trabalha. Ele faz questão de contextualizar o tamanho do desafio local. “Essa cidade tem 220 mil habitantes, é bem grandinha, mas é uma cidade que a 99 atua já há mais de 10 anos. Então a 99 é um aplicativo muito bem consolidado já na cidade.” Ou seja, nascer ali significava disputar atenção com um player gigante e já enraizado.
Mas o plano não era ficar só onde a concorrência é mais forte. O Mobi 10 também mirou as cidades litorâneas próximas, Marataízes, Itapemirim, Piúma e Anchieta. “São as nossas cidades mais próximas aqui, litorâneas, que não existia aplicativo de mobilidade urbana.” Foi justamente nessa ausência de serviço digital que o app encontrou espaço pra começar a rodar de verdade. O lançamento veio no fim de 2023 e início de 2024, e ele frisa que tocou tudo sozinho: “Esse aplicativo foi lançado por mim só, sozinho. Não tive sócio, não tive ajuda de ninguém.”
A escolha da franquia e o peso do investimento
Na parte técnica, Josimar trilhou um caminho comum entre apps regionais: em vez de criar um sistema do zero, optou por uma franquia. Um amigo desenvolvedor foi direto ao ponto. “Ele me explicou que para você desenvolver do zero um aplicativo, você vai ter que ter uma equipe e você vai ter que ter um valor muito alto de investimento.” A recomendação foi buscar algo já pronto e personalizável. “Franquia já tem o aplicativo pronto, praticamente pronto ali a estrutura, onde apenas o gestor que quer lançar o seu aplicativo vai estar fazendo a sua marca, com as cores, com a personalização.”
Foi assim que ele fechou com a MobApps, de Salvador. “Contratei essa empresa de Salvador da Bahia, fizeram o Mobi 10.” O custo inicial da tecnologia, comparado ao que muitos imaginam, não foi o maior problema. “A princípio eu fiz o investimento da tecnologia que foi em torno de uns 4 mil.” Só que a realidade do mercado veio depois, com força total. “O que faz ter um investimento muito maior seria o marketing.” Ele chegou confiante, com uma reserva que parecia suficiente. “Eu tinha em mãos mais 15 mil em marketing. E, no meu parecer, na minha mente, isso aí seria o suficiente. Mas não foi.”
O aprendizado, porém, veio caro. “Marketing é uma coisa muito cara. O mercado tem muitos picareta.” Ele conta que foi enganado por uma pessoa da área e perdeu o valor inteiro. “Levei aí uma pernada de uns 15 mil.” Para não abandonar o projeto, precisou ir além do planejado. “Providenciei mais 20, fiz o empréstimo. Então aí girou em torno de 40 mil para poder conseguir lançar o aplicativo.” Hoje ele vê essa etapa como um choque necessário. “Tudo conta como experiência. Tem que ser tudo feito etapa por etapa, um passo de cada vez.”
Base de usuários, corridas e modelo de cobrança
Atualmente o Mobi 10 está ativo em cinco cidades. E, como ele mesmo descreve, os números mudam o tempo todo porque a operação ainda está em construção. “É um ciclo, é uma bola de neve falar para você quantos motoristas estão ativos hoje.” A lógica, para ele, é simples e vale para qualquer app regional recém-chegado: “Muitos querem colher, mas ninguém quer plantar.” Mesmo assim, Josimar tem clareza da dimensão atual. “Motorista cadastrado na plataforma já tem quase dois mil, vamos colocar 1.650 motoristas cadastrados. Mas engajados com o aplicativo, pelo menos uns 200 motoristas.” Do lado das passageiras e passageiros, a base também cresce: “A gente está atingindo a marca de 10 mil passageiros cadastrados.”
O volume de corridas acompanha esse ritmo de amadurecimento. “Está gerando em uma média de 1.800 corridas finalizadas por mês.” E isso, no total, movimenta uma soma relevante para um projeto jovem. “Hoje a plataforma movimenta em torno de 50 mil por mês.” Ainda não é o cenário ideal, mas já vive por conta própria: “O app já se paga sozinho. Está longe ainda do ideal. Mas a gente vai continuar nessa luta aí.”
A forma de remuneração aos motoristas foi escolhida exatamente para não assustar quem ainda está testando o app. Josimar rejeitou a mensalidade e adotou carteira pré-paga com desconto automático. “O sistema que eu escolhi desde o início tem funcionado. É o sistema de recarga. Ele tem uma carteira virtual.” Na prática, o motorista coloca saldo, e só paga se rodar. “Vou fazer uma recarga de R$ 10. Se eu fizer corrida, fiz. Se eu não fizer corrida, os R$ 10 que está lá é meu. Ele pode sacar a qualquer momento.” A taxa padrão é relativamente leve para o padrão de mercado. “O motorista fica com 90% do valor da corrida e a mínima é R$ 15.” Em cidades novas, ele reduz ainda mais para ganhar tração. “Anchieta está com a cobrança de 5% apenas do motorista.”
Quanto dá para ganhar, e o efeito do verão
O app, por enquanto, funciona para muitos como complemento, e isso se reflete no faturamento de cada um. Mas Josimar fez um levantamento recente para entender o teto local. “No último mês eu fiz um levantamento. Gera em torno de R$ 2.000 os motoristas que mais fazem corridas.” A partir daí, os ganhos caem conforme a disponibilidade e o engajamento. “Tem motorista que fatura metade disso, R$ 1.000. Tem motorista que fatura R$ 500 por mês, R$ 800.” E ele ressalta que esses valores já são líquidos no sentido da taxa da plataforma: “Correto.”
A expectativa agora é de subida forte, especialmente nas cidades do litoral. “A tendência agora é até triplicar por conta da chegada do verão.” Ele explica que durante boa parte do ano o ritmo é morno. “É a população só que mora no local, que já está acostumada a usar o transporte particular ao invés de aplicativo.” Mas a virada chega com feriados e férias. “Já começou esse movimento extra no litoral, por conta do feriadão, e agora é dezembro, após as férias. Então a tendência é seguir esse mesmo crescimento.”
Corridas por fora e o desafio de quebrar monopólios
Josimar não romantiza o problema das corridas clandestinas. Para ele, isso faz parte do ecossistema de mobilidade, especialmente em cidades menores. “Isso aí existe em qualquer lugar, em qualquer plataforma. Não adianta.” Ele descreve a cena típica: o passageiro pega o número do motorista dentro da corrida e já tenta combinar a volta por fora. “É uma coisa impossível controlar esse diálogo entre motorista e passageiro.” Nem ele escapa disso: “Eu mesmo, fazendo corridas na minha plataforma, tive esse exemplo.”
O que realmente trava um app regional, na visão dele, é outra camada do problema, a resistência organizada dos motoristas antigos. “A dificuldade que é para lançar um aplicativo local, porque você tem a tecnologia, mas tem também a consciência de que o seu negócio vai ser em torno de pessoas. Praticamente 90% pessoas e 10% da tecnologia.” Em algumas cidades, ele acredita que a ausência de aplicativos não é acaso. “Por que a cidade não tem nenhum aplicativo? Com certeza existe um grupo de motoristas que mantém ali um monopólio das corridas clandestinas ou particulares.” Quebrar esse bloqueio exige tempo e alinhamento. “Se a pessoa tiver uma parceria com esses motoristas, aí a partir dali é que o negócio começa a fluir.” No litoral, ele diz que o Mobi 10 conseguiu avançar por insistência. “Conseguimos romper esse bloqueio dos motoristas particulares pela persistência e teimosia.”
Ele resume o processo num ciclo bem realista: “Motorista aparece, se cadastra, fica online, mas depois some. Depois aparece outro. Uma hora você encontra alguém que vai ficar te ajudando a persistir. Quando você menos pensar que não, deu certo.”
Próximos passos e convite aberto a um sócio
Mesmo com o crescimento gradual, Josimar não esconde o peso de tocar tudo sozinho. “Sozinho é difícil, impossível. Quase impossível fazer o aplicativo fluir, crescer.” Por isso, abre publicamente a possibilidade de parceria. “Eu abro oportunidade para se alguém tiver interesse em estar sendo sócio na minha plataforma, alguém entendido do ramo, ou algum investidor que teria uma visão para poder a gente combinar alguma coisa.”
O Mobi 10 ainda está na fase em que cada avanço é construído corrida por corrida, cidade por cidade. Mas a trajetória do app carrega uma marca clara: nasceu da rua, cresceu onde havia vazio de mercado e segue apoiado em uma ideia simples que o fundador repete com convicção, mobilidade regional não se sustenta só com tecnologia, e sim com gente disposta a plantar antes de colher.