Wagner Silva, criador da 123 Car, transformou uma crise em oportunidade durante a pandemia. Morador de Lavras, Minas Gerais, ele trocou o trabalho em comércio internacional por um aplicativo regional de mobilidade urbana, e construiu uma operação com foco em qualidade e responsabilidade social. Em entrevista ao Clube Machine, Wagner contou como iniciou com corridas solidárias, enfrentou a concorrência local e expandiu sua atuação para outras cidades mineiras. Confira abaixo a entrevista completa:
Como você entrou no mercado de mobilidade urbana? O que fazia antes?
O aplicativo 123 Car teve início em 2020. Entrei nesse mercado por causa da pandemia. Antes disso, eu trazia produtos do Paraguai e Argentina para revender aqui, mas com a pandemia, a importação foi travada. Aí criei o aplicativo, e inicialmente as corridas eram cobradas com 1 kg de alimento. Eu usava isso para ajudar as pessoas a se locomover com segurança e, ao mesmo tempo, revertia os alimentos em marmitas para moradores de rua.
Como foi a transição do modelo solidário para as corridas pagas?
O aplicativo foi tomando forma, as pessoas gostaram da atitude, coloquei motoristas qualificados e atenciosos, e acabou crescendo. Hoje é minha fonte de renda.
Você faz a gestão sozinho ou tem mais alguém te ajudando?
A gestão total do aplicativo é minha. Tenho uma funcionária que me ajuda no atendimento via WhatsApp, mas o gerenciamento é todo meu.
O aplicativo atua em outras cidades também?
Sim, atuamos em Lavras, Perdões, Cana Verde, estamos iniciando em Três Corações e Oliveira. A gestão de todas elas é feita por mim, aqui de Lavras.
Como foi a captação inicial de motoristas e passageiros?
No começo, amigos me ajudaram por causa da pandemia. Depois outras pessoas se solidarizaram com a situação e vieram ajudar. Conforme o aplicativo foi ganhando nome, os motoristas passaram a me procurar para se cadastrar.
Você faz algum trabalho de marketing ou campanhas visuais?
Sim. Cerca de 70% dos carros têm adesivos da 123 Car nos vidros dianteiro e traseiro. Isso ajuda os passageiros a identificarem o carro e também é uma forma de propaganda. Além disso, facilita para o motorista conseguir corridas enquanto espera.
Quais foram os principais desafios no início da operação?
A concorrência. Quando entrei, já havia oito aplicativos locais. Mostrar que o meu tinha um diferencial foi difícil. Investi pesado em propaganda, motoristas qualificados, carros confortáveis. Isso ainda é nosso diferencial. Hoje Lavras tem 16 aplicativos e estamos em primeiro lugar no ranking.
Além dos locais, há grandes aplicativos em Lavras?
Tem Uber e InDrive. O 99 não tem. Os outros são todos regionais.
Como você convencia os motoristas a trabalharem no seu aplicativo?
Pela visibilidade que ganhamos com as ações sociais. No começo, eu mesmo pagava as corridas dos motoristas e transformava em alimentos para os passageiros. Depois disso, os motoristas começaram a nos procurar. Hoje tenho uma fila de 700 aguardando.
Qual o tamanho de Lavras e das outras cidades onde o aplicativo atua?
Lavras tem 104 mil habitantes pelo IBGE, mas com a Universidade Federal, chega a 120 mil. Perdões tem cerca de 25 mil, Cana Verde tem 4 mil e Três Corações 70 mil. Lavras é a maior.
A universidade influencia no movimento do aplicativo?
Sim, a cidade gira em torno da universidade. Quando entra em greve ou férias, tudo desacelera. Mas meu foco não são só os alunos, continuo com propaganda e patrocínio de eventos para atingir um público mais amplo.
Você continua com os trabalhos sociais? Como eles funcionam hoje?
Sim. Sempre busco famílias que precisam de ajuda. Os motoristas me informam sobre passageiros em situação difícil, e eu confirmo pessoalmente. Levo cestas básicas, ajudo com contas, gás. Também organizo ações como Rua de Lazer, distribuição de bombons na Páscoa, surpresas no Dia das Crianças e eventos no Natal.
Quantas corridas vocês fazem por mês?
Em Lavras, cerca de 60 mil por mês. No total, em todas as cidades, dá em torno de 65 mil.
Quantos motoristas ativos vocês têm?
São 201 motoristas no total, sendo 174 só em Lavras. Cerca de 80% são exclusivos do aplicativo, os outros 20% têm outro emprego e usam como renda extra.
Em quanto tempo você conseguiu recuperar o investimento inicial?
Cerca de 5 meses. Investi bastante em propaganda para estruturar o app, mas consegui recuperar nesse período, mesmo sendo pandemia.
Como você analisa uma nova cidade antes de expandir o aplicativo?
Frequento a cidade, observo a mobilidade e contratei uma pesquisa com perguntas sobre uso de apps de mobilidade, necessidade de novos apps e se conhecem a 123 Car. Com isso, analiso a viabilidade antes de entrar.
Você pretende expandir para cidades maiores ou outros estados?
Pretendo vender franquias da 123 Car, criando um roteiro e contrato para manter o padrão. Se vender franquia para cidades grandes como Belo Horizonte, preciso garantir que a gestão esteja alinhada com nossos valores. Dependendo do franqueado, podemos ir para estados como Paraná, Bahia, Rio de Janeiro.
Você acha que é possível um aplicativo regional entrar em cidades grandes com Uber e 99?
Sim, sempre há espaço. O diferencial é o preço, a qualidade no atendimento. Nem sempre o mais barato é o melhor.
O projeto de franquias já está em andamento?
Ainda não, mas pretendo iniciar este ano com contrato junto a um advogado. Já temos outras marcas como 123 Wash (lava jato) e 123 Coffee (cafeteria).
Você pensa em criar um delivery?
Não. Já existem franquias fortes nesse ramo aqui. Prefiro não entrar.
O que falta para os apps regionais avançarem mais?
Cuidar do marketing, do cadastro e da qualidade dos motoristas. Nem tudo é preço, o atendimento é essencial para a fidelização do cliente.
Qual a média de faturamento dos motoristas? Algum caso que se destacou?
Depende do ritmo de trabalho. A média varia de R$ 5.000 a R$ 15.000 brutos por mês. Já tivemos um motorista que faturou R$ 18.000.
Qual o valor da corrida mínima e do quilômetro rodado?
Corrida mínima é R$ 10,50. Quilômetro rodado está R$ 2,30.
Vocês cobram mensalidade ou percentual dos motoristas?
Cobramos 10% do valor da corrida.
Qual sua visão sobre o futuro da mobilidade urbana e dos apps regionais?
É um mercado eterno. As pessoas estão vendendo seus carros por causa dos custos. Usar apps é mais econômico, evita multas, trânsito, busca por estacionamento. Sempre vai haver demanda.
Você pretende expandir para outros estados?
Sim, via franquias. Depende das pessoas que procurarem a marca. Não defini valores ainda, mas penso em algo acessível para ganhar nome.
Você pretende treinar os franqueados para manter o padrão de atendimento e ações sociais?
Sim. Mesmo que o franqueado não tenha interesse, eu posso realizar as ações. O treinamento é essencial para manter o padrão e dar suporte.
Como você engaja e fideliza os motoristas?
Mantenho equilíbrio entre número de motoristas e corridas. Também faço sorteios com brindes, pix, lavagem no 123 Wash.
Você faz promoções para os passageiros?
Lanço cupons de 5% a 10% de desconto nos dias mais fracos. Disparo os cupons pelas redes sociais.
O que você gostaria de ter aprendido antes de começar?
Gostaria de ter conhecido melhor a gestão do sistema. No início, não sabia lidar com alguns problemas, hoje faço tudo de cabeça. Aprendi na prática.
Onde estão localizadas as unidades da 123 Car?
A sede é em Lavras (MG). Também atuamos em Perdões, Cana Verde, Três Corações e Oliveira.
Com as promoções, 10% de tarifa não é pouco?
Quando lanço desconto, o motorista não paga tarifa. Eu assumo o custo. Mas limito a validade do cupom a poucas horas do dia.
Você integra os serviços como o 123 Wash com o app?
São separados. O lava-jato foi criado para ajudar os motoristas a manter os carros limpos. Ofereço preços de custo para eles. Pretendo abrir um centro automotivo para manutenção.
E a 123 Coffee?
É uma cafeteria. Usei o nome para aproveitar a força da marca. É um projeto paralelo, sem relação direta com o aplicativo.
