Pesquisar

Uber Reserve: “Beneficia mais as plataformas do que os motoristas”

ponto de exclamacao .png
Reportagem
Apuração aprofundada sobre um tema específico, com múltiplas fontes e contextualização completa.
Tela de um aplicativo de transporte com a pergunta "Você precisa de uma viagem para quando?" e duas opções de resposta: "Agora" com a descrição "Solicite uma viagem, entre no carro e relaxe" e "Mais tarde" com a descrição "Reserve e tenha mais tranquilidade". Abaixo das opções, há um botão preto com a palavra "Avançar".
Foto: Reprodução/ Captura de tela.

Especialistas, empresas e motoristas dão a sua opinião sobre o agendamento das corridas por aplicativo.

Na correria do dia a dia, usuários dos aplicativos de transporte escolhem não se preocupar com a chamada de uma corrida e decidem agendá-las para o horário pensado. Os agendamentos surgem como uma nova possibilidade de trabalho para os motoristas e uma opção para aqueles que só desejam sair para seus compromissos e entrar no carro.

Criado no final de 2020, o “Uber Reserve” foi lançado nos Estados Unidos e logo chegou ao Brasil, com a possibilidade de agendar uma corrida com até 30 dias de antecedência. No próprio aplicativo, a Uber afirma: “Solicite uma viagem, entre no carro e relaxe”. A opção fica disponível na aba de selecionar o destino da viagem, na qual o usuário pode decidir solicitar na mesma hora ou para outro horário do dia ou do mês.

Seguindo a mesma linha, a inDrive foi atrás da nova tecnologia e lançou a funcionalidade em 2021, desde o início da categoria “Cidade a Cidade”. Em contrapartida, a 99 ainda não disponibiliza a opção de agendamento para seus clientes.

Sendo assim, surgem dúvidas sobre quais tecnologias são necessárias para manter aplicativos funcionando em uma larga operação mundial, que recebem milhares de corridas por dia em todo o globo. Pensando nisso, o diretor de desenvolvimento de soluções em nuvem da Microsoft, Paulo Teixeira, conversou com o 55Content e deu detalhes da logística.

Quais as tecnologias necessárias?

Paulo explica que as tecnologias das empresas entendem e analisam possíveis imprevistos para a corrida e, por isso, quando chega o dia do agendamento, um pouco antes do horário reservado, o sistema já estará ativo. Nesse momento, o algoritmo tem uma visão clara de como está, por exemplo, o trânsito.

“Se você agendou uma corrida para às 16h30, mas o sistema já está vendo que o trânsito está super lento, ao invés de chamar o motorista às 16h20, o que poderia fazer com que ele chegasse atrasado, o sistema, sabendo que o trânsito está ruim, vai chamar o motorista antes do horário planejado anteriormente. Ele se antecipa ao problema que está acontecendo naquele momento, porque sabe que o trânsito está alto”.

Outra técnica que o especialista explica é a análise de padrão: “Todos sabemos que há horários do dia em que o trânsito é pior e horários em que o trânsito é melhor. Há regiões com trânsito mais intenso e regiões mais tranquilas. Existem motoristas que cancelam mais e outros que cancelam menos. Todas essas informações são guardadas pelas empresas para fins históricos, no que chamamos de modelos analíticos”.

Paulo conta que os apps possuem um grande banco de dados com histórico de trânsito, comportamento dos motoristas e dos passageiros e usam métodos estatísticos para tentar prever o que pode acontecer, lidando com uma taxa de sucesso e eficiência.

Cada motorista, ao andar pela rua, está fornecendo à Uber, minuto a minuto, dados sobre velocidade e direção. Dessa forma, eles conseguem analisar se a velocidade naquela via e horário é esperada, comparando com dias anteriores. Além de visualizar se a velocidade está abaixo do esperado, ou se algo deve ter acontecido naquela rua: “Dinamicamente, eles conseguem detectar essas anomalias de trânsito e se recuperar rapidamente”.

O colaborador da Microsoft desenvolve que, quando uma corrida é agendada, o pedido é enviado antes do horário marcado. Isso permite que, em caso de cancelamento, outros motoristas próximos possam assumir a corrida, reduzindo atrasos e inconvenientes para o passageiro.

Desafios de manter o sistema operando

Pensando não só no desenvolvimento, os responsáveis pelas áreas de CS e tecnologia dos apps precisam se atentar à forma como esses sistemas vão se manter operando no dia a dia das corridas. Com uma infinita gama de sistemas e formas de se trabalhar com os avanços tecnológicos, Paulo revela: “O grande desafio tecnológico dessa solução é exatamente a escala, o volume. Você não faz um software desse para duas, três pessoas, você faz para milhões de pessoas, talvez até bilhões. Então, imagina criar um banco de dados que suporte isso, que funcione de forma performática e eficiente”.

A leitura por trás de uma nova forma de trabalhar

Diego Benegas é especialista em mobilidade urbana e foca em estudar a relação entre os trabalhadores por aplicativo versus os apps de transporte e entregas. Para entender um pouco mais sobre a “relação trabalhista” pautada pela tecnologia dos aplicativos, ele conta que há uma contradição na forma de trabalho, já que os motoristas acabam ficando presos às plataformas, no qual não se encaixa o discurso de que o trabalhador faz o seu próprio horário.

“O entregador ou o motorista, não tem essa liberdade de escolher, porque a corrida está agendada. Então, é uma forma, na minha interpretação, de prender o entregador à própria plataforma. Essa liberdade, por exemplo, que os motoristas têm de correr pelos apps, a partir do momento que as corridas são agendadas, isso prende o empregador à plataforma”.

Diego complementa ao dizer que, ao seu ver, isso tem relação com a dificuldade que as plataformas encontram de ter o motorista disponível no horário em que a demanda dos passageiros necessita: “Então, com os horários agendados, ele garante que o serviço seja concretizado”.

Ao ser questionado sobre possíveis benefícios para o trânsito da cidade e o trabalho do motorista, ele responde: “Eu não compreendo isso como um benefício para a cidade, para a mobilidade urbana, para o transporte, e muito menos para o motorista. Eu vejo isso como um benefício para a própria plataforma, que vai ter assegurado que aquele serviço, aquela demanda por transporte, seja atendida por esses agendamentos”.

Diego não enxerga o agendamento como uma facilidade para o motorista, e sim para a própria plataforma: “Se eu tenho um horário específico de demanda de corridas, esses agendamentos vão garantir que a plataforma forneça o serviço, que o passageiro tenha o transporte. Mas e se acontecer algum problema com o carro do motorista? Quais serão as consequências? Geralmente, quem sofre é ele”.

inDrive vai expandir seu serviço de agendamentos?

O 55Content procurou a inDrive para explicar sobre o seu serviço de agendamento. A empresa explicou que, no momento, a inDrive oferece a possibilidade de agendar corridas com antecedência somente para viagens entre diferentes cidades, na categoria Cidade a Cidade. No entanto, a plataforma está avaliando a possibilidade de expandir essa opção para corridas dentro da mesma cidade, para oferecer ainda mais conveniência aos usuários.

Também perguntamos quais seriam os benefícios dos motoristas que trabalham dessa forma com a plataforma e quais seriam os métodos de segurança para esses trabalhadores. A empresa respondeu explicando que o agendamento de corridas possibilita que o motorista tenha maior previsibilidade e organização dos seus horários, permitindo que planeje seu tempo e trajetos para otimizar suas rotas e evitar horários de pico. E finalizam: “O motorista também terá maior segurança e tranquilidade, já que poderá avaliar o perfil do passageiro antes de aceitar a corrida”.

Experiência do usuário

Flávia Fuck é usuária frequente dos aplicativos de transporte e usou recentemente o “Uber Reserve”: “Marquei a primeira corrida para as 14h10 da tarde para levar a minha cachorrinha para o Parque Ibirapuera, e marquei na noite anterior da data. No entanto, o preço triplicou por ser um Uber Pet, então só usaria esse serviço novamente em emergências”.

A cliente complementa: “Mas, sobre a corrida, o motorista chegou antes do horário e estava me esperando na frente do prédio. Em relação ao horário e previsibilidade, não tenho do que reclamar”.

Já em sua segunda vez utilizando a funcionalidade, Flávia relata que marcou a corrida para às 16h30, e aconteceu a mesma coisa: o valor triplicou, mas o motorista chegou antes do horário, e que reservou com apenas uma hora de antecedência.

Motorista

Rodrigo Porto, é motorista de app, e conta que utilizou a função somente uma vez: “Quando foi criado, apareceu o agendamento para eu aceitar, mas, devido a eu estar longe para buscar o passageiro e a Uber não enviar uma corrida digna de ser feita para seguir em direção ao passageiro que agendou, a corrida não foi feita. Acredito que deveria ter sido enviada para outro motorista mais próximo. Depois apareceram outras, mas não quis aceitar devido à primeira experiência”.

Enquanto isso, Eloi Antônio Zaffari acredita que a função o auxilia em sua rotina de trabalho e passa mais confiança para quem dirige e para os usuários: “Prefiro agendadas porque são mais tranquilas e seguras, melhorando o contato entre o motorista e o passageiro. Como rodo várias horas no dia, em alguns deles, não consigo atender a alta demanda, mas sempre faço o máximo para fazer todas as corridas”.

Eloi corre pelo aplicativo regional Garupa e atende poucas corridas pelo app. A maioria são por agendamento de pessoas que o contatam via WhatsApp.

App de transporte regional

O Garupa é um aplicativo criado e desenvolvido no Rio Grande do Sul, que atende diversas categorias, sendo uma delas a de corridas agendadas. Eles explicam que usam um avatar da central de atendimento para chamadas.

A empresa contou que, com o agendamento de corridas, conseguem dar tranquilidade tanto para o cliente, com o aceite da corrida e a garantia de chegar ao destino, quanto para o motorista, que pode se programar com a corrida e com receitas além das chamadas rotineiras. Eles sempre colocam no grupo do motorista o agendamento, horário, local e passageiro.

“Temos um analista disponível nas cidades onde atuamos com sócio operador e um analista na regional para cidades onde temos o sócio colaborador. Este analista é responsável pelo questionário aplicado ao cliente e também pela percepção de que a corrida é segura”, revela Roberto Felin Junior, gestor do app.

Em todas as demandas, a empresa afirmou que sempre encontra um motorista disponível para atender. Esse filtro de segurança requer perguntas básicas, semelhantes a um cadastro para baixar qualquer aplicativo de mobilidade, ficando registradas na base de dados e no WhatsApp robotizado.

Pesquisar