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“Se o motorista está satisfeito e vê valor na parceria, ele não pula para outra plataforma só porque o preço está mais baixo”, diz gestora de app regional

"Acreditamos que o motorista não pode ser só mais um. Ele precisa ser parte ativa da construção da plataforma. Tem gente nossa que já passou dos R$ 7 mil por mês", diz gestora de app regional.

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Notícia
Informações objetivas sobre fatos relevantes para o mercado de mobilidade, com apuração direta da redação.
Imagem de convite para evento exclusivo para gestores de apps, com Silvana Figueiredo, CEO da Liint. Ela está sorrindo, usando óculos e um look profissional, com informações do evento como data e horário.
Foto: Acervo pessoal 55content

Na última segunda-feira (19), durante evento promovido pelo 55content Premium, Silvana Figueiredo, CEO da Liite, compartilhou a sua trajetória no mundo dos aplicativos de mobilidade e os desafios enfrentados para criar uma plataforma mais justa e colaborativa para motoristas.

A história da Liite começou de forma inesperada, em 2019, a partir de um grupo de empresários e dois motoristas que se uniram para criar um aplicativo de mobilidade. Silvana, com uma carreira consolidada em outro setor, foi convidada a se juntar ao projeto. “Foi um desafio, pois percebemos que a classe de motoristas era muito desarticulada e, como resultado, extremamente explorada pelas grandes plataformas”, comentou Silvana, ressaltando a motivação de seu envolvimento: oferecer uma alternativa mais justa e humana para os motoristas.

O início da Liite foi marcado pela empolgação e um grande desejo de transformar a realidade do setor. A empresa começou suas operações em Botucatu e expandiu para outras cidades, mas o caminho não foi fácil. O maior desafio foi o engajamento com os motoristas e as dificuldades de gerir um negócio à distância. Além disso, as questões societárias também pesaram, resultando na saída dos sócios iniciais. “A ilusão durou pouco. Eles não estavam preparados para lidar com a responsabilidade do empreendedorismo e com os altos investimentos necessários para a continuidade do projeto”, afirmou Silvana.

Atualmente, a Liite opera em um modelo mais compacto e atua em três cidades. “Não buscamos ser uma plataforma de grande projeção, como as multinacionais ou aquelas que almejam ser unicórnios. Nosso objetivo é ser uma plataforma colaborativa, onde o motorista é reconhecido como um verdadeiro empreendedor, com a possibilidade de ter participação ativa no processo”, explicou.

Silvana destacou que a Liite opera com uma margem de no máximo 15% e evita a busca por grandes investidores. Em vez disso, prefere experimentar modelos alternativos, mais próximos da realidade dos motoristas. “Nosso modelo é baseado na conectividade entre o motorista e o passageiro, sem a exploração que vemos nas grandes plataformas”, afirmou.

Além disso, Silvana ressaltou que o papel do motorista deve ser valorizado, pois é ele quem banca os custos do carro e assume os riscos do trabalho. A CEO frisou a importância de encontrar um equilíbrio que torne o modelo sustentável, para que tanto motoristas quanto passageiros tenham benefícios reais sem sobrecarregar nenhuma das partes.

Ao final, Silvana deixou claro que a visão da Liite é oferecer um espaço onde a relação entre motoristas e passageiros seja mais equilibrada, sem a imposição de taxas abusivas ou práticas que gerem vínculo empregatício. “A plataforma precisa ouvir os motoristas e garantir que todos possam tirar o sustento de maneira digna, sem ser forçado a trabalhar em condições desumanas”, concluiu.

A Liite segue, assim, com seu compromisso de construir uma alternativa mais justa e sustentável no setor de mobilidade.

Engajamento de motoristas: o maior desafio

Segundo Silvana, um dos principais obstáculos enfrentados pelas plataformas regionais é manter o motorista engajado — uma dificuldade compartilhada por quase todos os gestores do setor.

“A gente faz campanhas, premiações, como o ‘motorista do mês’, metas de corrida com bonificações e ajustes de taxa. Mas o que engaja em uma cidade, não engaja em outra”, explicou. O comportamento varia de acordo com a cultura local e o nível de articulação dos motoristas. Enquanto algumas cidades valorizam parcerias com comércios, outras simplesmente ignoram os benefícios oferecidos.

Apesar dos esforços, Silvana aponta que tudo precisa ser feito dentro da legalidade. “Tem gestor que diz ‘isso é política interna’, mas, se fere a lei ou o direito do próximo, vira um risco jurídico. Na porcentagem que a gente trabalha, não compensa correr esse risco.”

Por que focar em menos cidades

A Liint já esteve presente em diversas cidades, mas atualmente decidiu concentrar sua atuação em apenas três: Botucatu, Ourinhos e Porto Feliz. O motivo? Estratégia baseada no engajamento local.

“Investir em cidades onde o motorista não está engajado não é sustentável. Você entra, investe, treina, e depois chega outra plataforma com promoção agressiva e leva todo mundo. Você nem recupera o investimento”, afirmou Silvana.

Ela também destacou a dificuldade de administrar operações à distância. Mesmo com uma plataforma tecnológica estável, a falta de algoritmos avançados como os das multinacionais torna o trabalho remoto menos eficiente. “A margem que trabalhamos é de no máximo 15%. Com isso, é inviável bancar operação completa, marketing, atendimento…”.

A guerra de preços e a desarticulação local

Silvana relatou o impacto direto da chegada da 99 em Botucatu, que resultou em uma queda drástica nos valores das corridas. “As nossas custavam em média R$ 9,50. A deles, R$ 6. E o motorista alimentou isso. Aí não dá para competir. Começa a guerra de preços e a desarticulação total”, lamentou.

Esse tipo de instabilidade é o que faz com que a empresa seja mais seletiva ao escolher onde operar. “Hoje, qualquer plataforma nova entra com taxa zero e promessa de lucro pelo volume. Mas o bolo é o mesmo e os motoristas estão espalhados em dez aplicativos.”

Um novo modelo para o futuro

Diante de tantos desafios, a Liint está prestes a lançar um novo modelo de atuação. Com cerca de 70% do planejamento já estruturado, a ideia é descentralizar a gestão e envolver diretamente os motoristas mais engajados na liderança de operações locais.

“A proposta é que o motorista empreenda junto com a gente, assumindo parte da gestão da área onde atua. Muitos entendem a operação, mas não têm noção da complexidade da gestão de uma empresa. Queremos trazer um formato mais realista e participativo.”

Silvana finalizou reforçando que o objetivo da Liint segue sendo oferecer uma alternativa mais justa, humana e colaborativa no setor de mobilidade. “A plataforma precisa ser sustentável para todos — passageiro, motorista e empresa. Só assim o modelo se mantém de pé.”

Um modelo mais pé no chão

Silvana Figueiró, fundadora e CEO da Lillit, tem clareza sobre o que quer evitar. “O meu perfil de investidora nesses casos é mais pé no chão, ou conservador, como alguns dizem. A gente viu que tem mais chance de dar certo quando cada um faz o que sabe.” A fala resume bem o novo modelo de expansão da empresa, que aposta em uma atuação compartilhada com parceiros regionais, fugindo de formatos tradicionais como franquias puras ou simples cessões de tecnologia.

Tentativas e erros: o que não funcionou

A Lillit já experimentou diferentes formas de crescer. Uma das primeiras foi ceder a plataforma para que motoristas operassem sozinhos em outras regiões. Mas a aposta não deu certo. “Motorista não entende de gestão”, conta Silvana. A tentativa seguinte foi com gestores experientes, mas que não conheciam o dia a dia da operação. “Também não deu certo. O gestor sabia de administração, mas não sabia lidar com motorista, com operação. Acabava desistindo”, explica.

A conclusão foi simples, mas poderosa: cada parte do negócio exige conhecimento específico. E isso motivou o modelo atual, onde a operação local fica nas mãos de quem conhece as ruas — motoristas com espírito empreendedor —, enquanto a Lillit assume a parte de gestão, suporte e tecnologia à distância.

Fortalecer a cultura do motorista

Para Silvana, o maior diferencial competitivo dos apps regionais não está na tecnologia, mas na cultura. “Falta engajamento com o motorista. A gente precisa trabalhar o protagonismo deles. Eles são o coração da plataforma”, diz. O desafio é transformar o mindset de CLT passivo para o de empreendedor ativo. “Não dá pra ser desarticulado. Tem que pensar na plataforma como negócio, e não só na corrida do momento.”

Essa conscientização vem sendo trabalhada no dia a dia da empresa. Motoristas que se destacam recebem benefícios como taxas diferenciadas e incentivos para horários estratégicos, como a madrugada. “É uma forma de valorizar quem entende que a plataforma também precisa de sustentabilidade.”

Resistindo ao imediatismo

A Lillit já soma mais de mil motoristas cadastrados, mas sabe que a competição com as gigantes é dura. “Teve uma época que a 99 entrou com R$300 por indicação. Era impossível competir”, relembra Silvana. Em vez de reagir com medidas arriscadas ou ilegais, a decisão foi segurar, observar o mercado e pensar em soluções com base sólida. “Não adianta remar contra a maré. A gente quer melhorar a experiência do motorista e do passageiro. Se não for pra isso, melhor nem lançar.”

Inspirada pela disrupção

A CEO usa como analogia o que viu acontecer em outras indústrias. “Olha a Netflix, que foi criticada por lançar filmes direto no streaming. Mas ela entendeu a tendência. Os cinemas esvaziaram. O consumidor quer conforto e personalização.” Para ela, o segredo está em se adaptar, não em resistir. “As empresas precisam mudar junto com as pessoas. E se não tiver uma ideia melhor, vai ser atropelado pela próxima.”

A Lillit quer estar do lado certo da história. “Hoje temos inteligência artificial, temos mais dados, mais criatividade ao redor. Vamos usar isso para melhorar vidas, e não para criar uma nova forma de escravidão disfarçada”, defende.

O segredo está no motorista — e na cidade certa

Para Silvana Figueiró, fundadora e CEO da Lillit, o crescimento de um aplicativo regional de mobilidade está diretamente ligado a uma variável simples, mas crucial: o engajamento do motorista. “É onde o motorista tem consciência do protagonismo dele na própria vida que o negócio anda”, afirma. Ela explica que em cidades onde os condutores participam ativamente das decisões e se envolvem com a operação, os resultados aparecem de forma natural.

Grupos de WhatsApp, reuniões periódicas e escuta ativa fazem parte da rotina da Lillit com seus motoristas parceiros. “Quando a gente chama, eles aparecem, opinam, se envolvem. A coisa flui. É ali que a mágica acontece.”

Crescer com critério

Mas nem todas as cidades oferecem esse tipo de engajamento de forma espontânea. E é aí que entra o novo modelo de expansão que a Lillit está desenhando: uma seleção mais estratégica e estruturada de parceiros locais. “Não adianta querer entrar em todo lugar. A gente analisa população, concorrência, comportamento local. Não é só chegar e lançar.”

Para identificar os líderes certos em cada cidade, a empresa está desenvolvendo um processo seletivo baseado em critérios de perfil, capacidade de engajamento e histórico de atuação. A inspiração vem de longe. “Nos inspiramos no modelo de recrutamento da Amazon. Claro que não vamos copiar, mas queremos ser mais assertivos nas escolhas.”

Um novo papel para o líder local

Nesse novo modelo, representantes de motoristas ganham protagonismo. Eles funcionam como elo entre a base local e a empresa, sendo responsáveis por mobilizar, ouvir e dar suporte aos colegas. “A gente analisa o quanto ele consegue engajar outros motoristas, se ele tem liderança, se participa dos grupos, se sabe o que está acontecendo.”

O contato inicial com esses líderes virá através de tráfego pago e campanhas segmentadas. “Não dá pra visitar o Brasil inteiro. Vamos lançar anúncios estratégicos em cidades com potencial e avaliar quem realmente tem perfil para liderar.”

Fugindo da saturação

Outro critério importante é a concorrência local. Cidades com excesso de aplicativos ativos tendem a dificultar a penetração de novos players. “Se já tem oito apps operando, é mais difícil. Pode acontecer? Pode. Mas o esforço é muito maior”, reconhece Silvana. Por isso, o foco inicial está em cidades menores, com menos saturação e mais espaço para uma operação colaborativa.

Sustentabilidade e lealdade

Mais do que lançar uma nova plataforma, a Lillit quer criar uma ferramenta duradoura para os motoristas. “A gente quer ser como um software de gestão. Se você encontra um que funciona, por que vai mudar? Por que vai começar tudo do zero de novo?”

Esse modelo também ajuda a proteger a empresa da guerra de preços. “Já vimos empresas perderem rios de dinheiro tentando entrar em cidades e depois sendo engolidas por gigantes como a 99. O motorista precisa estar consciente do que está construindo junto com a gente.”

Renda real e protagonismo

A Lillit não promete milagres, mas mostra que é possível ter renda sólida — desde que o motorista esteja disposto a se comprometer. Há casos de ganhos mensais superiores a R$ 7.000, mas também há muitos motoristas que usam o app como complemento de renda. “O aplicativo tem esse lado bom. Muitos motoristas não conseguiriam ganhar isso em outro trabalho. Se ele se organiza e se dedica, consegue uma renda digna.”

Um futuro mais colaborativo

Silvana encerra a conversa com uma visão clara sobre o futuro da mobilidade. “Mobilidade é essencial. Sempre vai ser. O que precisa mudar é o modelo de gestão. Eu acredito nesse formato mais participativo, em que a plataforma e o motorista constroem juntos.”

Para ela, o papel das empresas vai além da tecnologia: é preciso desenvolver a cultura empreendedora entre os motoristas. “A gente tem que ajudá-los a entender que eles são donos do próprio destino. E que podem sim construir algo sólido com a ajuda certa.”

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