“Uber e 99 controlam dados estratégicos de motoristas e passageiros, e criam tecnologias que favorecem seus interesses, ignorando os motoristas”, diz presidente de associação

Homem sorridente dentro de um carro, vestindo uma camiseta preta com os dizeres "Paulo Xavier da Fanma".
Foto: Paulo Xavier para 55content

As associações de motoristas de aplicativos desempenham um papel fundamental na representação e defesa dos interesses da categoria, que enfrenta desafios constantes em sua relação com as plataformas de transporte. Para compreender melhor o impacto dessas organizações, conversamos com Paulo Xavier, presidente da Frente de Apoio Nacional aos Motoristas Autônomos (FANMA) e da Federação Nacional das Associações de Motoristas Autônomos (FEMBRAP), que compartilhou sua trajetória e os objetivos das entidades que lidera.

Com mais de oito anos como motorista de aplicativo, Paulo Xavier acompanhou de perto as mudanças no setor, desde a regulamentação até os debates sobre condições de trabalho e segurança. Ele destacou a importância de iniciativas como a FANMA, criada em 2017, que atua na representação da categoria de forma voluntária e sem fins lucrativos. Durante a entrevista, Paulo também abordou os principais desafios enfrentados pelos motoristas e os avanços conquistados por meio da união e da organização coletiva.


Paulo, o objetivo desta conversa é entender um pouco mais sobre as associações de motoristas de aplicativos. Para começar, gostaria que você nos contasse como iniciou sua trajetória como motorista, desde quando está na área, como chegou à associação, e como se tornou presidente.

Paulo: Claro! Eu sou motorista de aplicativo desde o início de 2017, então já completei oito anos nessa profissão. Foi justamente nesse ano que começou a discussão sobre a Lei 13.640, que regulamentou os aplicativos de transporte no Brasil. Na época, organizamos uma mobilização em Belo Horizonte, que também ocorreu em outras cidades do país onde aplicativos como Uber e 99 já atuavam. Essa mobilização foi essencial para defender nosso direito de gerar renda por meio dos aplicativos, que enfrentavam resistência, especialmente dos sindicatos de taxistas, que buscavam proibir ou limitar nossa atuação.

Percebendo a necessidade de ter uma entidade representativa para proteger nossos interesses, fundamos, em 2017, a FANMA – Frente de Apoio Nacional aos Motoristas Autônomos. Nosso registro oficial saiu em fevereiro de 2018. Eu participei ativamente desse processo, inclusive organizando caravanas de motoristas para Brasília, e entendi que a associação seria o modelo mais adequado para representar nossa classe de forma simples e eficiente.

E como um motorista pode se associar à FANMA? Qual a diferença entre uma associação e um sindicato de motoristas de aplicativos?

Paulo: Quando fundamos a Fama, avaliamos diversas opções, como sindicato, cooperativa e associação. O sindicato não era viável, pois somos autônomos e não temos vínculo empregatício como no modelo CLT. Já a cooperativa, embora interessante, tinha certas complexidades, como questões de rateio, que não eram práticas na época. Assim, escolhemos a associação, que é mais simples, acessível e melhor aceita pelos motoristas.

Para se associar à Fama, o motorista não precisa pagar mensalidade ou anuidade, pois não temos fins lucrativos. Nossa diretoria é composta exclusivamente por motoristas voluntários, e eu continuo trabalhando como motorista diariamente, o que me mantém em contato com a realidade da categoria. A adesão é totalmente voluntária, e nosso trabalho é movido pela vontade de ajudar.

Então, você ainda trabalha como motorista mesmo sendo presidente da Fama?

Paulo: Exatamente. Além de ser presidente da FANMA, que atua em Minas Gerais, também sou presidente da FEMBRAP, a Federação Nacional das Associações de Motoristas Autônomos, que reúne outras associações em nível nacional. Apesar dessas responsabilidades, eu sigo trabalhando como motorista em Belo Horizonte. Costumo rodar todos os dias, com exceção da minha folga semanal. Esse contato direto com a profissão me ajuda a entender as necessidades dos motoristas e a representá-los melhor.

Paulo, você poderia compartilhar quais são os maiores desafios enfrentados pelos motoristas de aplicativo atualmente? Além disso, poderia mencionar algumas das principais conquistas da FANMA ou de outras associações de motoristas?

Paulo: Claro! Os desafios para os motoristas são constantes. Costumamos dizer que o motorista não tem um dia de paz. O principal deles está relacionado aos repasses feitos pelas plataformas, que possuem muitos recursos, enquanto nós, motoristas, não temos. Esse desequilíbrio dificulta nossa organização e a disseminação de informações, já que nosso trabalho é voluntário e sem recursos financeiros. Estamos lidando com grandes instituições multinacionais que têm equipes dedicadas, recursos de mídia e tecnologia, e atuam diretamente em corredores políticos do Congresso, assembleias e municípios.

Essas plataformas detêm todas as informações estratégicas, como a quantidade de motoristas e passageiros em cada região, e continuam desenvolvendo ferramentas tecnológicas que favorecem seus próprios interesses, deixando os motoristas de lado. Elas aproveitam um cenário brasileiro de alto desemprego e transporte público de baixa qualidade, o que gera uma oferta abundante de motoristas. Isso, infelizmente, não incentiva melhorias para nossa categoria.

Além disso, a segurança é outro grande desafio. Muitas vezes, as plataformas permitem que criminosos utilizem seus serviços, colocando motoristas em risco de assaltos, perdas financeiras, e até mesmo de suas vidas. Nossa relação com as plataformas é muito fria, baseada em mensagens automáticas, e, em muitos casos, o motorista é desativado sem explicação ou oportunidade de defesa.

Diante disso, nossa prioridade é educar os motoristas para que façam escolhas mais estratégicas e aceitem apenas corridas que garantam ganhos financeiros reais. Trabalhamos também para garantir mais respeito e justiça nas relações com as plataformas, além de lutar por melhores condições de segurança.

Entendido. E quais foram as principais conquistas da FANMA e das associações em geral?

Paulo: Nossas conquistas estão ligadas à representatividade. O principal objetivo da FANMA é atuar junto ao poder público, à mídia e às próprias plataformas para defender os interesses dos motoristas. Por exemplo, temos canais de comunicação abertos com Uber, 99 e inDrive aqui em Belo Horizonte e Minas Gerais. Isso nos permite negociar diretamente com as plataformas, e já conseguimos reverter desativações injustas de motoristas por meio de diálogos extrajudiciais.

Na esfera pública, participamos ativamente de discussões em Brasília, Assembleias Legislativas e outras cidades do Brasil. Um exemplo recente foi nossa atuação na reforma tributária, onde conseguimos um enquadramento tributário mais justo para os motoristas. Também estamos trabalhando em propostas como a isenção parcial do IPVA para veículos mais sustentáveis, como elétricos, híbridos e GNV.

A rotatividade da categoria também é um desafio. Muitos motoristas são novos e precisam ser conscientizados sobre a história e as demandas da profissão. Além disso, uma parcela significativa utiliza o aplicativo como complemento de renda, o que dificulta o engajamento em pautas maiores. Apesar dessas barreiras, seguimos firmes representando os motoristas e buscando melhorias constantes.

Estamos chegando ao fim. Qual é a sua mensagem final para os motoristas de aplicativo?

Paulo: Minha mensagem principal é sobre a importância da união. Esse é um grande desafio para nossa categoria, que muitas vezes está muito dispersa. Por isso, peço aos motoristas que acompanham o canal 55Content, que é um excelente espaço para dar voz à categoria, que se unam. Aqui em Belo Horizonte, por exemplo, temos a Fama, que atua desde 2017 representando os motoristas de forma voluntária. É fundamental que os motoristas tenham esse olhar coletivo, porque as conquistas só vêm com união e organização.

Além disso, estamos apoiando o fortalecimento do cooperativismo. Já existem cooperativas municipais e estaduais, e agora temos a Liga Coop, uma federação nacional. Em Belo Horizonte, estamos acompanhando a implantação da cooperativa de Poços de Caldas, que é do estado de Minas. O cooperativismo é um caminho mais justo para os motoristas, oferecendo ganhos melhores, maior participação e voz ativa dentro do movimento.

Resumindo, é essencial que os motoristas se unam para que possamos avançar como categoria. Deixo aqui o canal de comunicação da FANMA: temos um WhatsApp institucional e um perfil no Instagram, que são os meios mais acionados. Por sermos uma equipe voluntária e sem estrutura fixa, pode haver um pequeno atraso nas respostas, mas sempre atendemos todos.

Excelente, Paulo. Você gostaria de acrescentar mais alguma coisa?

Paulo: Sim, quero deixar disponíveis nossos contatos. O WhatsApp da Fama é (31) 99245-0701. Nosso Instagram é @fanma_br. Para quem tiver dúvidas, “FANMA” significa Frente de Apoio Nacional aos Motoristas Autônomos, com o “N” a mais representando “Nacional”. O Instagram é um excelente meio para se conectar conosco. Estamos sempre à disposição!

Foto de Giulia Lang
Giulia Lang

Giulia Lang é líder de conteúdo do 55content e graduada em jornalismo pela Fundação Cásper Líbero.

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