“Já tive queimadura no braço por dirigir no sol”: como fica a saúde dos trabalhadores por aplicativo no Brasil?

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Motorista
DALL·E 2024 05 28 15.23.51 A scene focusing on the health of app based workers in Brazil. The background shows an urban setting with skyscrapers and busy streets. In the foregro
DALL·E 2024 05 28 15.23.51 A scene focusing on the health of app based workers in Brazil. The background shows an urban setting with skyscrapers and busy streets. In the foregro

Motoristas e entregadores de aplicativo compartilham seu dia a dia trabalhando nas ruas do país, e especialistas dão dicas para melhorar a qualidade de vida.

Horas no volante, exposição ao calor, poluição e o estresse no trânsito colocam os trabalhadores por aplicativo em uma posição muito delicada em relação à saúde.

É o caso de Elton Lima. Ele trabalha como motorista de aplicativo há seis anos na cidade de Bragança Paulista, interior de São Paulo, e se queixa: “Eu sempre tento conciliar meus horários de trabalho com o restante da minha família, por isso, passo a maior parte do dia nas corridas. Durante o período de sol mais forte, é quando mais trabalho. Precisei comprar manguitos para o braço porque já tive queimaduras por dirigir no sol quente e fiquei alguns dias com muita irritação na pele”.

Já Raul Araújo, que trabalha como entregador por aplicativo durante 12 horas por dia, é um exemplo de como a rotina pode causar desgaste mental: “Ficar muitas horas encarando o trânsito exige um controle emocional muito grande. A todo momento, a atenção precisa estar 100% focada, pronta para desviar ou evitar qualquer acidente, e essa pressão mental acaba impactando de forma negativa a mentalidade do trabalhador de aplicativo. É um trabalho que, além de desgastar o corpo, também desgasta a mente”.

Alfredo Daiub, que trabalha de 8 a 10 horas como motorista, afirma: “Sofro com o estresse do trânsito, dor e inchaço nas pernas”.

Impacto na Circulação Sanguínea

Para José Montal, médico e diretor da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego, a permanência numa mesma posição durante longos períodos, sentado com as pernas flexionadas, tem um custo para a saúde. “Inclusive do ponto de vista circulatório, não é muito saudável dirigir por muito tempo. A recomendação é de que, no máximo, a cada hora e meia, se saia do veículo, caminhe, faça alongamento, beba algum líquido e faça um pequeno lanche, sob pena de agravar essas condições circulatórias e a própria fadiga”.

Para tentar reverter essa situação, o Dr. Montal recomenda: “O primeiro vilão do trânsito é indubitavelmente a velocidade, e a velocidade e a pressa andam juntas. Controlar e gerir adequadamente a velocidade talvez seja o melhor mecanismo para garantir que a vida seja preservada nos deslocamentos. Portanto, a regulação da velocidade dos condutores submetidos a esse tipo de trabalho pode ser o primeiro gatilho a favor da preservação da vida e da possibilidade de prevenir sinistros.”

Impactos na Saúde Mental

Além dos impactos físicos, os especialistas também apontam os riscos para a saúde mental desses trabalhadores, que podem acabar ficando de lado. Com os índices de violência contra motoristas aumentando, o trânsito das grandes capitais e a irritabilidade da população em geral, aqueles que passam horas no volante podem ser afetados se não houver nenhum cuidado físico e mental.

A psicóloga Karina Profirio alerta sobre situações que observou com seus pacientes motoristas: “Alguns, pelo excesso de horas trabalhadas, instabilidade e falta de salário fixo, demonstram alto grau de apatia, cansaço físico e mental, gerando desgaste psicológico. Muitos relatam ter medo da violência cotidiana e maus tratos pelos clientes, gerando também muita instabilidade emocional”.

Com um trabalho em formato autônomo, é necessário se atentar aos sinais do próprio corpo e, principalmente, buscar um equilíbrio entre a obrigação e outras áreas da vida.

Nutrição e Alimentação

Anny Ribeiro, nutricionista, explicou que os motoristas de aplicativo e entregadores enfrentam a ausência de intervalos pré-definidos e a falta de tempo suficiente para uma refeição adequada. A especialista explica que, como consequência, muitos deles passam longos períodos sem se alimentar ou optam por fast food e alimentos ultraprocessados em vez de refeições nutritivas. Aliado ao sedentarismo, esses hábitos alimentares podem levar ao desenvolvimento de diversas doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares.

Mas Anny dá dicas para aqueles que desejam melhorar sua alimentação e, consequentemente, sua qualidade de vida, como o planejamento de refeições para evitar que sejam puladas ao longo do dia. Ela sugere sempre ter à mão alimentos de fácil acesso, como frutas, barras de cereais, castanhas e nozes, ou até mesmo lanches naturais. E finaliza: “Além disso, não podemos esquecer da importância da hidratação para a integridade da saúde do trabalhador, sendo recomendado sempre manter uma garrafinha de água por perto”.

Resposta das Empresas

A redação do 55content entrou em contato com as empresas de transporte e entregas por aplicativo, mas até o momento da publicação, a Uber e a Rappi não responderam, e a 99 decidiu não se pronunciar sobre o tema.

Já o iFood informou em nota: “O iFood se preocupa com o bem-estar de todo o seu ecossistema, seja entregador, parceiros ou clientes. No caso dos entregadores cadastrados na plataforma, a empresa oferece o programa de vantagens – gratuito e elegível a todos os profissionais de entrega. Nele, há descontos em farmácias e serviços de saúde, acesso a seguros e iniciativas de educação. Uma das vantagens desse programa é o seguro pessoal, que é gratuito e contempla diversas coberturas para os profissionais de entrega, como seguro em casos de acidentes em rota de entrega e na volta pra casa, cobrindo diárias por incapacidade, despesas médicas e hospitalares em rede credenciada ou por reembolso de valores, indenização por invalidez temporária ou permanente, e até mesmo cobertura por morte acidental com indenização de R$ 100.000, entre outras assistências e auxílios. O seguro também oferece auxílio à família, que inclui cobertura de educação dos filhos em caso de morte acidental, educação financeira e apoio emocional aos familiares dos entregadores”.

Além disso, a empresa cita algumas coberturas do seguro totalmente voltadas para mulheres, como auxílio em caso de câncer de útero ou de mama, auxílio à gestação, entre outras assistências. O iFood conta sobre o seu trabalho na ampliação das ações de conscientização para os parceiros de entrega sobre a prevenção de acidentes, com nove cursos envolvendo segurança, primeiros socorros e manutenção de veículos, ministrados por meio da plataforma online e gratuita iFood Decola. Além de um curso obrigatório para novos entregadores cadastrados no app, sobre “Segurança nas Entregas”.

E por fim, a empresa conta: “No último ano, o iFood se tornou mantenedor do Observatório Nacional de Segurança Viária, passando a integrar os debates de pautas em prol da construção de uma política de segurança viária para os entregadores”.

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