Cristiano Silva, representante do Movimento de Trabalhadores sem Direitos, destaca a precarização no trabalho informal e a necessidade de regulamentação.
O Movimento dos Trabalhadores Sem Direitos surge como uma iniciativa voltada à organização de trabalhadores informais em diversas categorias, como camelôs, ambulantes e trabalhadores de aplicativo, buscando combater a precarização e promover condições dignas de trabalho.
Segundo Cristiano Silva, representante do movimento, a proposta inicial foi consolidar uma estrutura de apoio aos “sem direitos”, ou seja, trabalhadores que operam na informalidade e enfrentam dificuldades para garantir direitos básicos: “O Movimento surge a partir da necessidade e da organização de luta pelo direito de várias categorias. Tem uma gama enorme de categorias que trabalham na informalidade e sentiram a necessidade de sair dessa condição”, explicou Cristiano.
Atualmente, o movimento conta com representações em seis estados, e está em processo de ampliação para outras regiões, como Fortaleza, Amapá e Paraíba. Segundo Cristiano, o objetivo é fortalecer os diálogos com outras organizações e ampliar a atuação em âmbito nacional.
O desafio de organizar trabalhadores por aplicativo
Entre os focos de atuação do movimento estão os trabalhadores por aplicativos, categoria que enfrenta barreiras para a organização formal.
Cristiano apontou que muitos entregadores e motoristas resistem à ideia de associações ou sindicatos, muitas vezes influenciados pelo discurso de empreendedorismo individual: “Acaba sendo uma classe com muita dificuldade de acesso. Muitos acreditam no discurso do ‘empreendedor de si mesmo’, o que gera uma barreira muito grande até para o próprio processo de luta por direitos”, destacou.
Ainda assim, o movimento tem buscado diálogo com essa categoria e destaca que os desafios enfrentados por esses trabalhadores são parte das pautas gerais da informalidade: “Eles fazem parte dos ‘sem direitos’. Estão precarizados, ao lado da informalidade com todas as suas mazelas.”
Precarização e a lógica do trabalho em plataformas
O modelo de trabalho mediado por plataformas digitais traz uma mudança significativa na lógica das relações trabalhistas, segundo Cristiano. De acordo com ele, os trabalhadores não vendem apenas sua força de trabalho, mas também o capital necessário para exercer suas funções: “Você vende sua mão de obra e também o capital. Você vende o equipamento, sua moto, seu carro, sua bicicleta, não importa com o que você trabalha, você arca com todos os custos, e não é remunerado de acordo com isso”, afirmou.
Essa dinâmica resulta em condições de trabalho que, na avaliação de Cristiano, são desumanas. Muitos trabalhadores submetem-se a jornadas longas, sem direito a folga remunerada ou compensação pelo tempo de espera entre entregas ou corridas: “Se submeter a jornadas de 12, 14 horas é desumano. Enquanto está esperando uma corrida ou uma entrega de aplicativo, você não recebe por aquele tempo que está ali disponível.”
Além disso, Cristiano destacou o impacto financeiro que esse modelo tem sobre os trabalhadores, que muitas vezes vendem bens ou utilizam rescisões trabalhistas para adquirir equipamentos necessários ao trabalho: “Quantos não têm vendido aí as únicas coisas que têm para comprar uma moto? Quantos não têm pego rescisão trabalhista para comprar uma motinha, uma bicicleta, para enganchar aí nessa luta pelos aplicativos”, completou.
Apesar disso, o representante reconhece que as plataformas têm sido uma alternativa em meio ao desemprego. Ele reconhece que essas atividades podem ser uma fonte valiosa de sustento: “Eles prestam um serviço que acaba sendo uma renda muito valiosa para os trabalhadores que atuam nas plataformas”, afirmou.
No entanto, ele também destacou que essa mesma lógica deixa os trabalhadores desprotegidos, sem direitos básicos ou garantias de segurança: “Deixam os trabalhadores ao léu, sem direito nenhum, sem seguro nenhum”, ressaltou, enfatizando os desafios enfrentados por quem depende dessas plataformas para sobreviver.
A lógica de trabalho dos aplicativos difere profundamente do modelo tradicional regido pela CLT, conforme destacou Cristiano: “Na CLT, o trabalhador participa juntamente com o empregador nas questões de seguridade social e tal. Mas, na lógica do aplicativo, a gente observa que é diferente. O trabalhador é que é dono do capital”, explicou, referindo-se aos veículos e equipamentos que os profissionais utilizam e mantêm por conta própria.
Essa dinâmica tem gerado uma percepção negativa entre os trabalhadores, que veem os custos adicionais para assegurar seus direitos como um ônus financeiro: “Além de todos os custos, ele também iria pagar pelos seus direitos de garantia. Ia ser mais um ônus para o trabalhador do que um bônus dos seus direitos. Eu acho que isso também provocou uma repulsa muito grande da categoria”, afirmou, comentando as dificuldades enfrentadas na tramitação de propostas legislativas voltadas a regulamentar o setor.
Para o Movimento, cabe às plataformas assumir essa responsabilidade. “A gente acredita que as plataformas é que têm que arcar com os direitos dos trabalhadores. Claro que não foram todos os direitos que foram discutidos no PL, mas qualquer avanço já é importante. Tem que começar de algum lugar”, disse Cristiano.
Cristiano destacou que a recente tramitação do PL 12/2024 enfrentou resistência tanto das plataformas quanto de parte dos trabalhadores, o que dificulta mudanças no setor: “A gente acredita que qualquer tipo de avanço já é válido para tentar diminuir o dia a dia desses trabalhadores. Não dá para seguir a lógica da CLT. É preciso adaptar a legislação às condições reais de trabalho desses profissionais.”
Segundo Cristiano, o trabalho por aplicativos enfrenta desafios que vão além da remuneração direta, uma vez que os ganhos são frequentemente diluídos pelos custos de manutenção dos equipamentos necessários para as atividades: “Acaba que aquele ganho real é diluído na própria manutenção dos equipamentos: de carro, de combustível, tem que pagar seguro, tem que pagar acidente de trânsito”, destacou.
Cristiano também expressou preocupação com o futuro do trabalho por aplicativos caso a atual dinâmica persista. Para enfrentar esse cenário, o movimento tem investido na ampliação do diálogo e na mobilização dos trabalhadores: “A gente tem estabelecido um planejamento dentro do movimento: ampliação da luta, ampliação das conversas, ampliação das ações com os trabalhadores para tentar reverter isso de alguma forma”, finalizou.