Desde 2018,Andrezza Pires encara a rotina desafiadora de ser motorista de aplicativo, uma atividade que começou como complemento de renda e acabou se tornando sua principal fonte de sustento. Com jornadas que podem chegar a 16 horas diárias, ela trabalha de 5 a 6 dias por semana, equilibrando a direção com a produção de seu próprio podcast. Sua meta é clara: faturar, no mínimo, R$ 500 por dia, com o objetivo ideal de atingir R$ 650.
Nos fins de semana, quando a demanda aumenta, ela intensifica o ritmo para superar essas metas e compensar os dias mais fracos. Além disso, enfrenta custos operacionais elevados, como o gasto diário de até R$ 330 em combustível, o que consome cerca de 25% de seu faturamento mensal.
Então, Andrezza, o que te levou a se tornar motorista de aplicativo e há quanto tempo você está nesse serviço?
Andrezza: Eu trabalho como motorista de aplicativo desde setembro de 2018, então já faz um pouco mais de seis anos. No início, comecei para complementar a renda. Eu também detestava usar transporte público, e acabei descobrindo um estacionamento barato no centro do Rio, o que facilitou para eu ir de carro. Um funcionário sugeriu que eu aproveitasse e fizesse algumas corridas na volta para casa. Eu topei.
No entanto, meu cadastro na Uber foi recusado inicialmente, então comecei apenas com a 99 Pop. Fiquei rodando com eles por cerca de dois anos e meio. Só em 25 de dezembro de 2020 que a Uber aprovou meu cadastro. Eu estava em um momento difícil da pandemia, na casa da minha ex-sogra, e tinha acabado de orar quando recebi a mensagem de aprovação. Foi um alívio enorme, pois trabalhar apenas com um aplicativo estava praticamente inviável.
Depois disso, comecei a trabalhar com os dois apps. Vendi meu carro e migrei para o Uber Black, onde atuei por dois anos. Recentemente, voltei a trabalhar com o X-Comfort porque bateram no meu carro Black. Para não ter o custo de comprar outro, peguei o carro do meu pai e estou rodando no X-Comfort por enquanto.
E como é a sua rotina de trabalho? De que horas até que horas você costuma dirigir?
Andrezza: Minha rotina é bem intensa. Além do trabalho como motorista, eu também tenho um podcast, inicialmente focado na categoria de motoristas, o que consome bastante do meu tempo. Por isso, começo a trabalhar muito cedo ou então na parte da tarde.
Em uma semana normal, sem compromissos extras, trabalho de 5 a 6 dias por semana, com jornadas de 12 a 16 horas por dia. É uma carga pesada, mas minha meta financeira exige isso.
E como você organiza suas metas financeiras? Você tem um valor específico que busca atingir por dia?
Andrezza: Sim. Minha meta mínima é faturar R$ 500 por dia, mesmo em um cenário ruim. Mas, o ideal para mim é alcançar R$ 650 por dia. Tem dias em que eu consigo com facilidade, outros são mais difíceis. Por isso, às vezes preciso trabalhar até 16 horas.
Além disso, estou tentando incluir a academia na minha rotina, uma coisa que parei de fazer há quatro anos. Estou lutando contra o sedentarismo, mas confesso que tenho falhado bastante. Ainda assim, sigo tentando, porque sei que é importante, principalmente para motoristas, que passam muitas horas sentados.
Recentemente, tenho notado um movimento na internet incentivando os motoristas a cuidarem mais da saúde, o que considero muito positivo.
Você costuma aceitar qualquer corrida ou seleciona com base em algum critério?
Andrezza: Eu sou bem seletiva, tanto que a 99 chegou a me bloquear por cinco dias por conta disso. Mas minha principal preocupação não é o valor imediato da corrida, e sim o destino.
Eu moro em Queimadas, que fica a mais de 50 km do centro do Rio. As corridas saindo daqui normalmente pagam mal, porque a tarifa na Baixada Fluminense é mais baixa que no centro ou na zona sul. Mesmo assim, aceito algumas corridas para me deslocar até essas regiões, onde o retorno financeiro é melhor.
Quando estou na zona sul, sou mais rigorosa e aceito apenas corridas que paguem acima de R$ 1,60 por quilômetro. A realidade ideal seria receber R$ 2,00 por km, mas isso é praticamente impossível com um faturamento alto. Para atingir metas mais altas, às vezes é necessário fazer corridas longas, mesmo que o valor por quilômetro não seja tão bom.
No fim do dia, minha meta é conseguir pelo menos R$ 50 por hora e manter uma média de pelo menos R$ 1,60 por km. Como o pagamento varia de acordo com a demanda e não apenas por tempo ou quilometragem, tudo depende do movimento da cidade no dia.
Andrezza, nos finais de semana, você consegue ultrapassar sua meta de R$ 500,00?
Andrezza: Geralmente sim. A cidade fica mais movimentada, as pessoas saem mais e a demanda por corridas aumenta. É justamente no fim de semana que consigo alavancar meus ganhos.
De quinta a domingo é quando mais me dedico e gasto mais energia. Quase sempre, nesses dias, supero minha meta. Hoje, tento aprender com motoristas de alta performance que têm resultados fora da média por se dedicarem além do comum.
O meu foco é trabalhar mais intensamente no fim de semana e, durante a semana, manter um equilíbrio para ser mais produtiva.
E em relação aos seus ganhos mensais, quanto você costuma faturar?
Andrezza: Em janeiro, que foi um mês bem fraco, trabalhei apenas 16 dias e ainda assim consegui fazer pouco mais de R$ 12 mil. Tirei esse mês para descansar um pouco.
Em fevereiro, também estou trabalhando menos, porque geralmente faço quatro programas de podcast por mês, mas este mês estou fazendo nove, o que ocupa mais tempo.
A partir da próxima semana, pretendo voltar à rotina normal. Minha meta mensal é de R$ 15 mil.
Sobre os custos, com que frequência você abastece o carro? Quanto gasta em média?
Andrezza: Eu abasteço uma vez por dia. Quando uso etanol, gasto entre R$ 220 e R$ 270, dependendo do posto. Hoje, por exemplo, gastei R$ 230. Sempre completo o tanque antes de começar o dia.
Se estiver muito quente, opto por gasolina, que é mais econômica. Nesse caso, o custo sobe para cerca de R$ 300 a R$ 330.
Em média, 25% do meu faturamento mensal vai para combustível. Se eu faturar R$ 15 mil, por exemplo, cerca de R$ 3.750 é gasto com abastecimento.
Você trabalha como motorista desde 2018. Acha que naquela época era mais fácil ganhar dinheiro?
Andrezza: Não diria que era mais fácil, mas o poder de compra era maior. A falta de reajuste nas tarifas prejudica bastante.
Hoje, uma meta de R$ 650 por dia pode parecer alta, mas a maioria dos motoristas que trabalham bem não fatura menos de R$ 500. Só que os custos aumentaram muito. Naquela época, minha parcela do carro era de R$ 980; hoje, pago R$ 1.700.
Mesmo faturando mais atualmente, nosso poder de compra diminuiu. Porém, em termos de estrutura de trabalho, hoje é muito melhor. A principal vantagem agora é a informação. Antes, a gente aceitava corrida sem saber o destino, o que aumentava os riscos e dificultava a criação de uma estratégia eficiente.
Agora, eu saio de casa com um plano A e um plano B prontos. Sei o momento certo de estar em determinados lugares e qual é a melhor logística para o meu trabalho. A informação é mais valiosa do que o dinheiro.
Por exemplo, no dia 1º de janeiro, trabalhei 24 horas e consegui faturar R$ 2.028. Isso aconteceu porque eu sabia exatamente onde estavam as festas e o momento certo de aceitar corridas longas ou curtas. Antes, o trabalho era muito mais instintivo: a corrida tocava, e a gente simplesmente aceitava.
O problema hoje não é o tempo que passou, mas a falta de atualização dos valores das tarifas. Essa estagnação nos prende a um passado que, na verdade, nem era tão bom assim.
Quais são as maiores dificuldades que os motoristas de aplicativo enfrentam, na sua opinião? E quais conselhos você daria para quem está começando?
Andrezza: A maior dificuldade hoje é conseguir lucrar de verdade. A gente fala muito sobre faturamento, mas os custos são muito altos, o que gera um esgotamento emocional enorme. A falta de valorização das plataformas agrava ainda mais isso, como no caso da 99, que chegou a aplicar uma taxa de 70%.
Uma taxa de 50% já era aceitável, mas 70% inviabiliza o trabalho. Entendo que existam métricas para garantir qualidade, e concordo que não é certo ficar cancelando corridas, prejudicando o passageiro. No entanto, as plataformas também precisam entender o lado dos motoristas: estamos na rua, transportando vidas, e muitas vezes temos menos de 10 segundos para aceitar uma corrida enquanto dirigimos.
O problema é que se recusarmos ou cancelarmos muitas corridas, corremos o risco de ser bloqueados, o que é absurdo. Além disso, a sensação de parceria que as plataformas pregam não existe de fato, e isso prejudica o motorista, que muitas vezes trabalha o dia inteiro, fatura R$ 500, mas vê a conta negativa no final do dia.
Também falta educação financeira. Muitos motoristas nunca trabalharam como autônomos antes e não sabem como gerenciar o dinheiro. Se emocionam com o faturamento, não se previnem e não guardam para o futuro.
Na minha opinião, as mudanças necessárias são: reajuste das tarifas, mais segurança (como exigir selfies dos passageiros para evitar assaltos) e uma verdadeira relação de parceria. Hoje, não temos autonomia para definir valores e nenhum benefício real vindo das plataformas.
Essa situação leva muitos motoristas à insatisfação, e eles acabam descontando nos passageiros, tentando economizar de formas prejudiciais, como andar sem ar-condicionado no Rio de Janeiro, com sensação térmica de quase 50 graus. Isso afeta o psicológico do motorista e coloca a saúde em risco.
Se as tarifas fossem reajustadas de maneira justa, acredito que essa situação melhoraria muito.
E quais dicas você daria para quem está começando?
Andrezza: A primeira coisa é entender como a cidade funciona. Hoje, há muito conteúdo gratuito disponível no YouTube e no Instagram. Recomendo buscar influencers que sejam da região onde você vai trabalhar, para pegar dicas específicas e absorver o máximo de conhecimento possível.
Trabalhar com aplicativo hoje é como jogar um videogame: quem tem mais conhecimento, tem melhores resultados. Por isso, o meu perfil nas redes sociais se chama Megamotora — antes era Megadriver, mas tive que mudar por causa de questões relacionadas ao videogame.
Se a pessoa não se preparar, não vai aguentar, porque as tarifas não são boas. É essencial entender para onde você está indo e fazer valer a pena.
Outro conselho importante: no começo, aceite apenas corridas pagas no cartão. Isso evita indisposições, distrações com troco e permite que você se concentre apenas em dirigir e escolher as melhores corridas. E, por fim, não aceite corridas com valores muito baixos. O melhor protesto que podemos fazer contra as plataformas hoje é simplesmente apertar o botão de X e recusar essas corridas ruins.