O motorista de aplicativo Fernando Ledesma, que atua em Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, relatou sua experiência com a plataforma 99, que o bloqueou após ele recusar corridas que considerava inviáveis financeiramente. Diante da situação, ele decidiu migrar para a Uber, onde, segundo ele, seu faturamento aumentou significativamente.
Ledesma começou a trabalhar com a 99 há algumas semanas e, inicialmente, considerou as corridas vantajosas. Ele conseguia faturar entre 60% e 70% do que precisava para cobrir seus custos diários. Seu veículo, um Fiat Cronos, não faz parte da categoria Plus, mas, mesmo assim, o aplicativo estava lhe oferecendo corridas com valores mais altos, o que aumentava sua rentabilidade. No entanto, essa situação mudou repentinamente.
“Estava indo muito bem, mas de uma hora para outra as corridas pioraram. Comecei a cancelar e a recusar algumas porque não valiam a pena”, explica Ledesma. Segundo ele, a decisão de escolher quais viagens aceitar foi o que o levou a ser bloqueado da plataforma.
O motorista tentou entrar em contato com o suporte da 99 para entender o motivo da restrição em sua conta e foi informado de que precisava aceitar entre 70% e 90% das corridas para continuar ativo no aplicativo. Para Ledesma, essa exigência o forçaria a trabalhar no prejuízo. “Se eu aceitasse todas as corridas sem cancelar, estaria perdendo dinheiro. Então, deixei claro: se for assim, prefiro trabalhar com a Uber. Disse pra eles: ‘O azar é de vocês, perderam um motorista que vestia a camisa’.”
Diante da situação, ele decidiu voltar a operar com a Uber no fim de semana seguinte e afirmou ter obtido ganhos consideráveis. “No sábado e domingo, voltei para a Uber e arrebentei! Fiz entre R$ 500 e R$ 600 por dia”, contou.
O caso de Ledesma expõe um dos principais dilemas enfrentados pelos motoristas de aplicativos: a necessidade de equilibrar a oferta e a demanda, enquanto tentam maximizar seus ganhos. Muitos profissionais do setor reclamam de regras rígidas impostas pelas plataformas, que, segundo eles, não levam em consideração os custos operacionais dos motoristas.
Agora, Ledesma afirma que só voltaria para a 99 caso a empresa apresentasse uma proposta realmente vantajosa. “Se a 99 quiser que eu volte, vai ter que me fazer uma proposta muito boa. Caso contrário, sigo com a Uber.”
A reportagem tentou contato com a 99 para esclarecer a política de aceitação de corridas e os bloqueios de motoristas, mas até o momento da publicação não obteve resposta.
O relato de Fernando Ledesma não é um caso isolado. Motoristas de aplicativos em todo o Brasil frequentemente expressam insatisfação com as políticas das plataformas, especialmente no que diz respeito à taxa de aceitação e ao valor pago por corrida.
O influenciador digital e motorista de aplicativo Claudio Sena, conhecido por abordar temas sobre mobilidade urbana e direitos dos motoristas, publicou recentemente um vídeo em seu Instagram destacando os impactos das políticas da 99 no Brasil. Segundo Sena, a empresa pode enfrentar dificuldades para manter um número adequado de motoristas se continuar aplicando bloqueios em larga escala.
“O atendimento da 99 no Brasil está comprometido por causa de uma política da própria empresa. Ela pode ficar sem motoristas suficientes para atender seus passageiros”, afirmou o influenciador.
Ele também alertou para o risco de um colapso no serviço devido à política de taxa de desempenho. “Bloquearam uma quantidade absurda de motoristas por causa da taxa de desempenho. O índice de motoristas com taxa abaixo dos 70% é muito grande, e muitos estão sendo impedidos de trabalhar”, explicou Sena.
Além disso, o influenciador compartilhou relatos de motoristas de diversas regiões do país, como Recife e São Paulo, que tiveram suas contas bloqueadas temporariamente devido ao não cumprimento da taxa mínima de aceitação. “Eu ouvi relatos e recebi prints de vários colegas que foram bloqueados por cinco dias porque tinham uma taxa abaixo de 70%”, relatou Sena.
Para ele, essa medida seria uma forma da 99 tentar forçar os motoristas a aceitarem mais corridas, mesmo que isso signifique prejuízo para eles. “Foi um choque para que os motoristas melhorem a taxa de desempenho, mas, no fim, prejudica quem depende do aplicativo para sustentar a família”, concluiu.
Sindicato dos motoristas toma medidas judiciais contra a 99
O presidente do Sindicato dos Motoristas de Aplicativos do Estado do Rio de Janeiro (Sindmobi), Luiz Correa, também se pronunciou sobre os bloqueios na 99 e afirmou que a entidade está orientando os motoristas afetados a ingressar com ações judiciais.
“A Sindmobi tem direcionado os motoristas que foram bloqueados pela 99 para ingressar com uma ação judicial. Não estamos em uma ação sem custo, estamos processando a empresa e estudando com o nosso jurídico a possibilidade de uma ação coletiva”, declarou Correa.
Ele destacou que muitos motoristas são bloqueados sem direito à defesa, principalmente ao recusarem corridas para áreas perigosas. “Muitas vezes, o bloqueio ocorre porque o motorista não aceita uma corrida para uma região perigosa e, por isso, sua taxa de desempenho cai. A 99 vai lá e bloqueia o motorista. Estamos tomando as medidas cabíveis para acionar essa empresa na justiça”, concluiu o presidente do Sindmobi.
Posicionamento da 99
A 99 esclarece que bloqueios e restrições de corridas são diferentes. Bloqueios podem ocorrer por suspeitas de fraude, compartilhamento de contas ou questões de segurança, podendo ser temporários ou definitivos. Já as restrições temporárias são aplicadas quando o motorista cancela muitas corridas após aceitá-las.
A plataforma permite um índice de cancelamento de até 30%, mas motoristas que finalizam menos de 70% das corridas aceitas podem enfrentar restrições de 5 a 15 dias. A 99 afirma que apenas uma pequena parcela dos motoristas é afetada e reforça que os condutores têm autonomia para escolher as corridas que desejam aceitar.