Fever Mobilidade: “Nosso triciclo transporta o equivalente a 20 motos”, diz fundador 

O Fever FR250 é um triciclo elétrico desenvolvido para entregas sustentáveis em áreas urbanas. Na imagem, o veículo está estacionado em um parque público com uma ponte ao fundo, mostrando seu design compacto e funcional, ideal para atender à crescente demanda por soluções de mobilidade elétrica. Equipado com compartimento de carga traseiro, o Fever FR250 é uma alternativa ecológica e eficiente para entregadores que buscam reduzir sua pegada de carbono nas cidades
Veículo elétrico Fever FR250, ideal para entregas urbanas, estacionado em área verde com ponte ao fundo

Segundo Nelson Futcher, a empresa traz soluções para eficiência sustentável no delivery.

A Fever Mobilidade, fundada por Nelson Futcher, surgiu após o CEO decidir deixar o segmento tradicional de veículos para explorar as novas tendências no mercado de mobilidade. Após anos de estudos, ele identificou um nicho: a mobilidade elétrica e a logística urbana.

A Fever Mobilidade foi formalmente constituída no final de 2022 e, em outubro de 2023, apresentou sua primeira linha de produtos ao mercado. Entre os principais destaques da empresa, segundo Nelson, está o Fever RAP, um triciclo elétrico desenvolvido na China e desenhado para ser uma solução logística mais sustentável e eficiente em áreas urbanas. 

A linha de triciclos, conforme explica Futcher, oferece uma alternativa intermediária entre motos e pequenos veículos comerciais, com maior capacidade de carga, sem os altos custos de automóveis, como o Fiorino, comumente utilizado para entregas.

Ele afirma que a empresa busca atender dois perfis de clientes: grandes corporações, como Mercado Livre, iFood e Ambev, que têm como meta reduzir suas emissões de carbono, e pequenos empresários que precisam de uma solução logística mais acessível e eficiente do que motocicletas ou carros. 

Segundo Futcher, o Fever RAP pode carregar até 1.600 litros, o que o torna uma alternativa atrativa para supermercados, hortifrutis e pet shops. Ele destaca que o triciclo elétrico da empresa oferece uma solução logística muito mais eficiente em comparação às motos convencionais. De acordo com Nelson, pelo preço de três motos, o triciclo carrega até 1.600 litros com segurança, o equivalente ao transporte de 20 motos comuns, que comportam no máximo 100 litros cada. 

Além disso, ele afirma que o veículo é capaz de operar de forma otimizada, permitindo que o entregador complete uma rota inteira em áreas urbanas densas, com a possibilidade de recarga rápida durante o almoço. Com uma autonomia inicial de 110 km, o triciclo pode atingir até 150 km com uma hora adicional de carga, proporcionando uma jornada produtiva de 8 a 9 horas.

Um dos desafios identificados pela Fever Mobilidade, de acordo com Nelson, é a resistência das plataformas de delivery em adotar soluções alternativas às motocicletas convencionais. Embora o triciclo elétrico ofereça benefícios como maior capacidade de carga, menor impacto ambiental e menor custo operacional, o custo inicial ainda é uma barreira, principalmente para entregadores autônomos. Além disso, há dificuldades na obtenção de crédito, o que impede que muitos operadores do setor adquiram veículos elétricos.

Futcher ressalta que o modelo de negócios da Fever tem potencial para ser uma solução integrada para o mercado de logística urbana, combinando inovação tecnológica com uma proposta sustentável. O CEO afirma que o caminho é continuar apresentando os benefícios de seus veículos ao mercado, demonstrando que é possível aliar eficiência e sustentabilidade na logística de última milha.

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Eu queria que você contasse um pouquinho da sua história, da história da empresa. Como surgiu? Como você foi parar nesse mercado?

Eu brinco que nasci sobre rodas. Sou a terceira geração de uma família que sempre vendeu veículos, desde 1959. Então, são mais de seis décadas, de alguma maneira, na distribuição de veículos. Tenho 30 anos de experiência nesse segmento, mas naquele método tradicional que você conhece bem, que é o mundo das concessionárias, da distribuição dessas grandes marcas de veículos tradicionais de passeio, comerciais leves. Fiz isso por muito tempo, tivemos vários cases de sucesso. Nossa origem, nossa sede empresarial, sempre foi aqui no Sul, em Santa Catarina, atuando em Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Em 2019, resolvemos sair do segmento para ter um período meio sabático e entender para onde esse mercado estava indo. O mercado está numa transformação fantástica. Eu sempre digo que estamos vivendo a maior revolução tecnológica na área de mobilidade dos últimos 120 anos. Há mais de um século, o mercado não via nada parecido com o que está acontecendo. E é realmente uma mudança tão grande quanto foi quando a humanidade trocou os cavalos pelos veículos a combustão. Foi uma mudança radical de paradigma. Em 20 anos, não existiam mais cavalos nas grandes cidades e se passou a conviver com os veículos automotores. E é o que a gente vem vivendo, de alguma forma.

Não é tão radical, porque os veículos são muito parecidos. Mas a gente começa a perceber, em outros sentidos, que visualmente são carros, caminhões, ônibus e motos. Mas estive na China há pouco tempo e a gente percebe, na audição, que já é diferente, já é menos barulho. Você já ouve pássaros num trânsito intenso, você já respira melhor. Então, essa é uma revolução que começou ali em 2005, 2008, 2010, e agora vem ganhando muita força.

Quando saí do segmento, depois de 30 anos, pensei: “Vou parar, não quero mais trabalhar com isso, vou dar um tempo.” E veio a pandemia. Quase dois anos para ver para onde o mundo estava indo. E, em 2022, quando a pandemia assentou e vimos que existia um mundo depois dela, a ideia foi retomar um pouco da rede de contatos e entender para onde o mundo da mobilidade estava indo. Eu vinha, até porque participei de alguns processos de seleção dessas concessionárias chinesas, mas não tinha me atraído o modelo. Falei: “Pô, tem tanta gente falando disso. Deixa eu estudar um pouco mais.” E, para minha surpresa, esse é um projeto que começou na ponta da mesa da minha sala, na minha casa.

É legal que conseguimos ter ideias realmente inovadoras quando temos tempo ocioso, de sair da rotina. E eu tinha tempo para isso. Fiz uma pesquisa bastante intensa no primeiro semestre de 2022 para tentar entender essa parte da eletrificação e mobilidade. Em algum momento, percebi que, se havia um lugar onde estava decidido que a eletricidade veio para ficar, esse local era a mobilidade urbana, a logística urbana, essa movimentação de mercadorias e pessoas no centro da cidade. Tem um dado super interessante, que eu sempre trago nas minhas exposições sobre a Fever: 87% da população mundial, hoje 8 bilhões de seres humanos, vivem nos grandes centros, e 80% da frota circulante do planeta, que é uma frota de cerca de 2 bilhões de veículos, circula no mesmo lugar, nos centros urbanos. Estamos falando de 1,5 bilhão de veículos que circulam nos grandes centros.

Então, temos uma intersecção, uma disputa pelo mesmo espaço, o mesmo metro quadrado de máquina e seres humanos. Só que sabemos como os seres humanos reagem, agora a máquina é barulho, é emissão de gases tóxicos, e ela quer ocupar o mesmo lugar. Isso cria um transtorno, um trânsito complicadíssimo. Quando você coloca 7 bilhões de pessoas junto com 1,5 bilhão de veículos em 10 a 15% do planeta, que é o que as áreas urbanas representam, você tem um problema gigantesco e complexo.

Lá na Europa, nessas minhas pesquisas, estavam resolvendo isso com mobilidade elétrica, micromobilidade: patinete, bicicleta, bicicleta elétrica, triciclo, pequenos veículos, microcarros. E isso só foi possível com o advento da eletricidade. Quando tínhamos motores a combustão, não era possível reduzir o tamanho do veículo, porque é uma geringonça para funcionar. O motor é de explosão, tem um cano de escape, um tanque. Como vou colocar isso num veículo pequeno? E a eletricidade permitiu tudo isso. Então, entendemos que um novo modal estava surgindo nos grandes centros para fazer essa movimentação logística urbana. E dissemos: “Por que não?”

Começamos a estudar, a selecionar produtos. Selecionamos umas duas dezenas de produtos para pesquisar mais a fundo. Claro que chegamos na China, porque a China é o grande produtor de tudo isso hoje, domina a tecnologia. Um pouco na Índia também encontramos algo, na Itália, mas principalmente na China, quando se fala de escala. Foi muito interessante, porque, das duas dezenas de produtos que selecionamos, acabamos escolhendo dois da China e um da Itália.

E a principal, que escolhemos para lançar a Fever no Brasil, foi uma linha de triciclos totalmente inovadora, da marca RAP, na China. Chamamos de Fever RAP porque fazemos o “cover” da China aqui no Brasil. É uma linha de triciclos desenhada no final de 2019, já como veículos elétricos. Não é um tuk-tuk daqueles indianos, do Vietnã ou do sudeste asiático, em que alguém tirou o motor a combustão e colocou uma bateria de chumbo-ácido e disse: “Agora tenho um veículo elétrico”. Não, ele é um veículo desenhado na prancheta, com tecnologia, materiais e eixo articulado para ser elétrico. Se você quiser colocar um motor a combustão nele, você não consegue. 

Isso tudo me entusiasmou pela oportunidade e pela inovação. E assim chegamos até aqui. Durante um ano, desenvolvemos esse projeto, com ideias, conversas com fornecedores e viagens. No final de 2022, constituímos a Fever para ela ter personalidade jurídica e começar as primeiras homologações. Lançamos a Fever em outubro de 2023, num evento pequeno, aqui em Florianópolis, apenas para dar uma ideia ao mercado de onde queríamos ir. Agora, no próximo mês, completamos um ano de jornada, ainda engatinhando, claro. Não é nada para um mercado desse tamanho, um setor tão importante, mas temos sido positivamente surpreendidos com a receptividade e a expectativa que as pessoas têm. Há uma certa ansiedade por opções nessa área.

No Brasil, temos um grande vazio. Depois da motocicleta a combustão, você chega no automóvel, e há um buraco de mais ou menos 70 a 80 mil reais na área de logística. Então, você tem bicicletas, bicicletas elétricas, algumas motos elétricas e, depois, chega nas pequenas picapes, como as Fiorinos, que já custam 90 ou 100 mil. Colocamos nosso produto no meio, custando 50 mil reais, para atender quem não precisa de tanta carga quanto um carro e para quem quer carregar um pouco mais do que uma motocicleta, com mais segurança do que uma motocicleta. Em poucas palavras, foram 24 meses de energia de 380 volts na veia, trabalhando para chegar até aqui e falando com você hoje em uma condição diferente, como uma empresa que já está atuando em todo o Brasil.

E hoje quem são os clientes de vocês? Qual é o foco?

Temos dois perfis bem característicos: grandes corporações, como Mercado Livre, iFood, Ambev, Coca-Cola e redes de lavanderias, como as da Unilever, que têm o ESG como bandeira e enfrentam desafios diários na logística. Procuramos, de alguma forma, estar perto delas. Na outra ponta, temos o micro e pequeno empresário, aquele que tem um veículo para fazer sua própria logística, para levar seus produtos ou serviços em algum lugar da cidade, e que estava exatamente naquele buraco que mencionei. Ele precisava de mais do que uma moto, mas um carro seria desperdício de dinheiro e gasolina. Quem tem uma mente um pouco mais aberta, que está buscando economizar no custo operacional e quer um veículo que chame a atenção no trânsito, além de ser mais seguro do que uma moto para evitar acidentes, pensa: “Opa, tem uma opção aqui”.

Fazemos um mix com nossa rede de concessionárias, porque o varejo, a experiência do cliente, o test drive, e aquela lead que chega aos poucos, tipo “Tenho interesse, vi no Instagram, vi no Google”, são tratados pela nossa rede. Também temos um canal de vendas corporativas, que desenvolve grandes clientes. Temos projetos desde os Correios até grandes supermercados, e locadoras, para mostrar esse novo modal e demonstrar o que ele é capaz de fazer, qual seu TCO, qual a vantagem operacional ao longo da quilometragem que ele percorre para o proprietário.

Às vezes, pode parecer caro. Quando a pessoa olha de primeira, diz: “Mas é uma moto, por que custa 50 ou 60 mil?”. A gente explica que não é uma moto. Você está olhando de frente, então vamos olhar por trás, olhar de lado. Agora ligue a moto e veja o que acontece: não faz barulho. A bateria de lítio tem uma BSM, uma central de inteligência. Veja o cockpit, tem controle de velocidade, tem telemetria. E você pode carregar 1.600 litros. Pô, isso quase equivale a uma Fiorino. “Ah, é verdade!”, eles dizem, “Já está barato”. Temos até uma mídia que faz essa provocação, colocando 20 motos de um lado e, do outro, só um triciclo nosso, uma Fever RAP. Pelo preço de três motos ou duas motos e meia, você tem o equivalente a 20 motos, porque uma moto comum transporta 80 litros, 100 no máximo. Nós levamos 1.600 litros com segurança. Então, são 20 motos para fazer esse trabalho. Além de que a rota é muito mais racional, mais inteligente. 

De manhã, você carrega o veículo, faz todo o bairro, toda uma zona sul de uma grande cidade, volta para almoçar e o veículo carrega enquanto isso. Por exemplo, nosso veículo, com uma hora de carga, ganha 40 km de autonomia, e é super rápido na inversão para a tomada. Pode ser uma tomada de três pinos normal. Entregamos um carregador portátil junto com o veículo, então ele consegue operar durante o dia, com uma jornada de 8 a 9 horas, muito produtiva. O veículo tem 110 km de autonomia, mas com os 40 km adicionais do almoço, ele chega a 150 km. Em uma vizinhança, isso é muita quilometragem.

Alguns casos ainda envolvem regeneração de bateria, porque temos tecnologia para isso. À medida que o piloto aprende a dirigir o veículo elétrico, ele deixa de usar a pastilha de freio, por exemplo, e começa a usar a força de regeneração, que freia como um freio motor. Isso faz com que alguns dos nossos pilotos já consigam aumentar ainda mais a autonomia projetada.

Tudo isso faz com que a gente, a cada mês que passa, consiga conquistar uma legião de fãs do produto. Temos falado com quem já usa e é impressionante, eles realmente se tornam embaixadores da Fever. Eles dizem: “Pô, eu não imaginava que tinha um produto desses à disposição no Brasil, tão prático e com um custo operacional tão baixo”. 

Como vocês enxergam o mercado de apps de delivery dentro do ecossistema de vocês? Qual a importância deles? É um público que vocês desejam atingir?

Queremos atingir esse mercado, mas nosso grande desafio é o investimento mensal, o CAPEX, porque estamos falando de um produto que custa três vezes o preço de uma motocicleta. O que pensamos sobre o delivery hoje, num mercado tão grande, é que ele exige nichos. Então, aquele delivery que entrega um sanduíche, uma refeição de hora em hora, que precisa ser rápida e voltar para a base a cada 10 ou 15 minutos, não conseguimos atingir. Não conseguimos ser eficientes nesse modelo, sendo muito transparentes. Temos um veículo muito rápido, que leva 110 kg e 550 litros, mas mesmo ele não consegue competir com a moto no custo-benefício. Uma moto usada custa 10 a 15 mil, e uma nova, 20 mil. 

Nosso delivery, é o do sujeito que faz entrega de supermercado, loja de hortifruti, ou do pet shop que vai pegar um animal para tosa. Ele vai e volta. Por exemplo, o delivery do Pão de Açúcar: nosso produto é imbatível para esse tipo de serviço, porque tem volumetria. Você pode pedir uma melancia, uma caixa de cerveja, um saco de carvão, tudo na mesma carga. Você não precisa esperar um automóvel. Fazemos isso com desenvoltura, porque, além de não fazer barulho, não gastar gasolina e não emitir gás, nos locomovemos dentro de condomínios com eficiência, porque o veículo cabe em qualquer lugar. Não atrapalhamos a entrada do condomínio, porque é um veículo pequeno. Chegamos rápido, ele se locomove bem no trânsito e é muito mais fácil de estacionar do que um veículo grande.

Consigo deixar a mercadoria na frente de uma empresa, por exemplo. Seja uma caixa de refrigerante ou um pequeno restaurante ali em Moema, onde o trânsito é super complicado. Eu paro e entrego uma caixa de frutas e outra de legumes e continuo minha jornada. Se eu estiver com uma Fiorino ou uma van, vou ter que procurar um lugar para estacionar, e com isso corro o risco de tomar uma multa da CET, e assim por diante.

Então, estou muito mais dentro da legislação, e a jornada tem menos fricção, por assim dizer. Eu entrego para o piloto uma condição de trabalho muito melhor. Meu ambiente de trabalho é mais confortável, porque o câmbio é automático, ele dirige dentro de uma cabine, sentado e não montado. Assim, ele fica numa posição confortável. Num eventual acidente de pequena ou média monta, ele não se machuca, porque está dentro de um habitáculo muito protegido. 

É um veículo que, querendo ou não, o automóvel respeita mais. Ele não vai cortar um triciclo como faz com uma moto. Ele pode bater atrás de uma moto, mas com um triciclo ele tira o pé, porque sabe que é um veículo maior. O meu triciclo tem a velocidade controlada, então, para o dono da frota, que muitas vezes tenta orientar os motoboys, isso é uma vantagem. Sabemos que muitos deles são jovens, com a adrenalina alta, e saem empinando a moto, querendo fazer graça. O nosso triciclo não faz isso. Ele tem a velocidade controlada, operando dentro de um script, e eu ainda consigo avisar, por telemetria, onde está o veículo e em que condições ele está rodando.

Com isso, eu ofereço segurança ao piloto e conforto para ele chegar ao final da jornada tranquilo. Ele não precisa pegar uma chuvarada, e pode fazer a entrega de maneira íntegra, sem chegar todo molhado na portaria de um prédio, por exemplo. Eu também consigo proteger o piloto do sol, o que é importante em dias de calor intenso. 

Na outra ponta, posso mostrar ao operador da frota ou ao dono do restaurante onde o veículo está, sem precisar cobrar nada por isso. Ofereço essa telemetria de graça, informando a velocidade do veículo, onde ele está parado, se a bateria ainda tem carga para mais entregas no dia, e também posso desligar o veículo à distância, se necessário. Por exemplo, se o piloto estiver transportando uma carga mais cara ou se o veículo sair da rota, o dono da frota pode desligá-lo. Isso tudo aumenta a segurança e fez com que o seguro do veículo diminuísse bastante.

Então, eu diria que esse veículo é uma inovação. Tentamos compará-lo com motos e carros, mas ele é quase uma simbiose entre os dois. E aí entra um universo de possibilidades para quem faz delivery. Por exemplo, a Swift, que trabalha com carnes congeladas e nobres, usa um dos nossos veículos refrigerados. A mercadoria sai do freezer da Swift e chega à porta do condomínio com a mesma integridade de um freezer. 

Nosso veículo é como um freezer sobre rodas, e qual outro delivery tem isso no tamanho de uma moto, ou um pouco maior? Fazemos isso com desenvoltura no trânsito, com rapidez, e aqui rapidez não significa velocidade, mas sim agilidade. Protegemos o piloto, protegemos a carga e garantimos uma experiência fantástica para o cliente, porque o veículo chega moderno, a mercadoria chega íntegra, sem que o piloto tome chuva, e a carne chega congelada.

Imagine alguém que trabalhe com pescados congelados, por exemplo. Se ele for entregar uma bandeja de camarão ou lagosta para um restaurante que ligou pedindo com urgência, nosso veículo mantém tudo em perfeitas condições. Ao abrir o freezer, sai aquela fumacinha, causando até um impacto visual. A temperatura é garantida em -18 graus.

Esse tipo de delivery, que está um passo à frente, é o que buscamos. Queremos ser fornecedores de qualidade e confiáveis para quem deseja fazer um delivery diferenciado.

Nas minhas pesquisas, senti que no Brasil não há quem forneça esse tipo de veículo, que saia do lugar comum e que tenha uma boa relação de custo-benefício. Você consegue imaginar um freezer sobre rodas com telemetria, elétrico, com proteção para o piloto? E que, além de tudo, é um outdoor ambulante para a empresa, que ainda pode fazer mídia com todos esses recursos, protegendo o meio ambiente e sem fazer barulho? Pagar 50 ou 60 mil reais por um produto desse no Brasil, emplacado, com seguro da Porto Seguro, financiado pelo Santander, Itaú, ou BV Financeira, é uma oportunidade. Você tem acesso a esse veículo como teria a uma motocicleta ou a um pequeno comercial leve a gasolina, mas com um produto que só roda na Europa, em países de ponta.

Nós precisamos e queremos mostrar ao mercado de delivery essa nossa “catequese” junto aos grandes frotistas, dizendo: “Olha, aqui no Brasil existe algo que vocês ainda não conhecem”. No exterior, por exemplo, a rede Carrefour na Espanha adotou esses veículos como algo comum. A DHL, FedEx e toda essa parte de courier, que faz entregas e coleta de documentos, já usa esses veículos. Lá fora, não faz sentido usar motocicletas; eles têm lambretas que parecem motonetas, mas mesmo assim não são veículos ideais para carga. Você perde o equilíbrio ao parar numa calçada para fazer uma entrega, tem que puxar um tripé e cuidar para não cair, além de enfrentar problemas de segurança. E, como mencionei, você chega molhado.

Você não tem um compartimento de carga organizado. Quem cobre o setor de delivery, como você, provavelmente já teve a oportunidade de abrir o baú de alguém que faz entregas de documentos e tentou encontrar algo no meio daquela bagunça, não é? No nosso veículo, tudo é organizado com prateleiras, luzes de LED com fotocélulas. Quando você abre o baú, a luz acende automaticamente. No inverno, quando escurece às 6 da tarde, e você precisa procurar uma mercadoria, é só abrir as duas portas e a lâmpada de LED dentro do baú já ilumina o espaço. O baú é chaveado, tudo é seguro. É realmente outra dimensão. 

Vocês foram muito para o ramo da logística, mas chegou a ter alguma conversa sobre entrar no ramo do transporte de passageiros? Houve um pessoal que fez algo relacionado a um aplicativo de carona com veículos elétricos. Chegou a surgir algo nesse sentido para vocês?

Eu acho que esse pode ser um passo natural da Fever, mas para quando estivermos mais maduros e consolidados no Brasil. Quando você lida com pessoas em maior número, com transporte coletivo ou carona — como no caso dos aplicativos de carona — a responsabilidade é dobrada. Quando você tem um piloto treinado e fazendo entregas de mercadoria dentro de uma rota, você tem muita previsibilidade, entende? Quando você abre o chamado e diz: “Podem me chamar que estou disponível”, você vai da zona sul à zona norte, de leste a oeste, e lida com todos os tipos de consumidores: o que está com pressa, o que está tranquilo, o que tem uma emergência no hospital, ou até o que está fugindo da mulher porque está com a amante. Tem de tudo.

Aí pensamos: “Essa briga não é nossa, vamos deixar isso para o 99 e para o Uber”. Talvez cheguemos lá, mas, por enquanto, queremos ser reconhecidos como fornecedores de veículos comerciais leves elétricos, com foco em logística, principalmente urbana, e que seja sustentável. Nessa hora, é preciso ter foco, porque tudo é uma oportunidade, especialmente em um país do tamanho do Brasil, com 220 milhões de habitantes. Movimentar essa galera dá dinheiro, mas você precisa escolher suas batalhas e o mercado em que quer trabalhar.

Parecem coisas similares, mas são muito diferentes. Movimentar pessoas, como eu expliquei, é bem distinto de movimentar mercadorias. A lógica de preparação de produto, desenvolvimento de autonomia e tudo mais é completamente diferente. Então, nos especializamos em trazer veículos de carga para movimentar mercadorias, ou até para prestar serviços. Nossos triciclos, por exemplo, servem também como food truck ou oficina volante. Temos uma parceria com a Bosch, que faz todo o nosso pós-venda no Brasil inteiro, e algumas oficinas estão requisitando esse veículo para ser usado como oficina volante. Ele é econômico, tem a mesma capacidade de carga que uma Fiorino, mas custa metade do preço.

Além disso, ele não gasta gasolina e não deprecia, porque é elétrico e não acaba nunca. A manutenção é quase zero. E, além de fazer o pós-venda para nós, o veículo ainda está prestando serviço para a oficina. Se precisar de qualquer coisa relacionada à Fever RAP, pode ser feito diretamente na oficina. Isso demonstra a versatilidade dos nossos triciclos.

Temos, por exemplo, uma carroceria desenvolvida para pets, com climatização. São dois andares, com capacidade para cinco animais, dois grandes e três médios ou pequenos. A ventilação é positiva, e os animais adoram, porque não vibra, não faz barulho e não tem fumaça. Eles andam em uma condição menos estressante, bem amarrados e seguros. Temos também uma gaiola com 3 metros cúbicos de espaço, projetada para coleta seletiva, que está funcionando muito bem em condomínios.

Vendemos uma unidade para um restaurante famoso em Brasília, o Pontal Power, no Lago Paranoá. Eles usavam carrinhos de golfe para a coleta de resíduos, mas agora estão utilizando nossos veículos e estão super felizes com o desempenho. Nosso veículo custa metade do preço de um carrinho de golfe e, além disso, pode circular na rua, porque é emplacado. Se precisarem ir até um depósito de lixo nas redondezas, eles podem pegar o trânsito normal. Já os carrinhos de golfe são confinados. Então, essas são soluções que os consumidores, de diferentes segmentos, estão percebendo o valor, e isso nos motiva a continuar desenvolvendo novas soluções.

Vendemos para públicos muito diversos: universidades, condomínios, supermercados, oficinas, pet shops, fábricas de sorvete, enfim. O nosso grande desafio no mercado de delivery é mostrar a esse mar de gente o valor agregado do nosso produto. Às vezes, com um investimento um pouco maior, você consegue aumentar muito o seu potencial e se diferenciar até na plataforma. A plataforma vê todo mundo carregando 20 kg ou 80 litros, mas, de repente, tem um cara que carrega 250 kg e 1.600 litros. A plataforma vai priorizar essa pessoa. Ele ainda tem o benefício de carregar uma carga maior e de maior valor agregado. Além de tudo, não gasta combustível. Hoje, conseguimos oferecer uma parcela de cerca de 1.300 reais para a compra do veículo. A conta do combustível que você economiza acaba pagando a parcela, e, no final, o veículo é seu, porque o combustível não precisa, é só colocá-lo na tomada de casa.

Esse é o desafio. A provocação que faço é mostrar para a turma do delivery que há alternativas. Há novidades com tecnologia, segurança e homologação, onde ele pode ter até uma carteira A ou até ACC. O condutor dirige em uma condição muito menos fatigante. É interessante perceber também que o piloto do nosso triciclo tem, em média, uma idade maior do que o de moto, porque o de moto é muito corajoso. São jovens de 18 ou 20 anos que se acham invulneráveis. Já o cara de 40 anos, que está no meio dessa garotada, começa a ficar um pouco fora da curva, está um pouco acima do peso e já tem dois ou três filhos em casa. Ele pensa: “Será que vou voltar para casa vivo?”

Nosso veículo dá essa segurança a ele, coloca-o em outro patamar. Não é só uma sensação, é segurança real. Ele faz uma jornada muito mais produtiva e inteligente. Não é uma busca desenfreada pela entrega mais rápida, a qualquer custo, mas sim uma entrega de qualidade, no tempo certo. Acho que esse é o caminho: mostrar para o Brasil inteiro que temos hoje, à disposição de qualquer um, um veículo com segurança, pós-venda, uma boa rede de concessionárias, várias opções de financiamento e locação, com peças de reposição e um bom padrão de garantia. É um produto que vai ajudar a pessoa a realizar seu sonho, deixando sobrar um pouco mais de dinheiro no final do dia.

Sobre a forma de chegada no mercado de delivery, como vocês imaginam esse processo em termos de canal. Vocês acham que seria mais interessante chegar direto pelas plataformas ou diretamente aos entregadores?

Temos muita resistência das plataformas. Por incrível que pareça, elas acham que nossa solução não é ideal, talvez por medo de encarecer o custo por hora. No entanto, estamos fazendo abordagens em ambos os sentidos. Hoje temos veículos em teste no iFood, na Amazon e no Mercado Livre. Ao mesmo tempo, notamos que a terceirização e, às vezes, até a quarteirização do delivery está acontecendo. Às vezes, chegamos a um grande supermercado para falar sobre logística de última milha e delivery, e eles dizem: “Ah, tudo bem, eu gosto, mas vou chamar o operador”. Então, você fala com o operador, e ele diz: “Eu tenho uma outra pessoa que possui as motos”. Acabamos falando com três pessoas para descobrir quem vai pagar o carnê da moto. 

Esse é um grande desafio: encontrar o interlocutor correto. Muitas vezes, os três precisam opinar, e isso torna o processo complicado. Não sei se isso é um problema ou um hábito no Brasil, mas acabamos recorrendo ao que já conhecemos, ao que “funciona”, e evitamos tentar coisas novas. Seria muito mais fácil se tivéssemos uma interlocução única, por exemplo, com o diretor de frota do iFood. Seria mais direto: “Vamos renovar seu escopo de entregas, trazer mais volume, mais valor agregado, e trocar seus veículos por modelos mais sustentáveis, com maior valor agregado”. Isso não acontece tão facilmente.

Muitas vezes, somos provocados pelos próprios entregadores. Eles nos ligam dizendo: “Eu sou conveniado do iFood”, “Sou conveniado da Amazon”. Por exemplo, temos uma parceria com a Tudo Green, uma operadora da Amazon que trabalha apenas com veículos sustentáveis. Eles nos procuraram dizendo: “Temos um contrato com a Amazon e um desafio de eletrificar nossas entregas”. Eles desenvolveram o conceito, e tivemos que conversar com a Amazon também, mas quem decide é a Tudo Green.

Outro grande problema que estamos enfrentando, e que talvez você já tenha abordado em suas matérias, é a questão do crédito. O pessoal da ponta está muito frágil financeiramente. Muitos trabalham no limite, estão sempre no cartão de crédito, e, se não estão endividados, estão no limite do endividamento. Quando uma instituição financeira analisa a ficha para financiar um veículo de 50 mil reais em 48 vezes, ou mesmo uma locadora que oferece o veículo por 24 ou 36 meses, elas dificultam a aprovação, porque sabem que esse público é vulnerável e que pode ocorrer inadimplência a qualquer momento.

Uma solução transversal seria muito mais interessante. Por exemplo, uma grande operadora logística poderia indicar seus colaboradores: “O João da Silva faz a zona sul de São Paulo. Pode vender para ele, porque ele tem um contrato comigo de 10 mil reais por mês”. É uma outra análise de crédito.

Atualmente, cerca de 50% dos cadastros que analisamos são negados logo na primeira triagem, devido à fragilidade desse público do delivery, que tem muito interesse em tornar sua frota sustentável e gosta da nossa solução, mas não consegue acessá-la. O maior desafio, talvez, seja encontrar uma solução para fornecer crédito a essas pessoas. Eu, como montadora, não consigo fazer isso sozinho. Talvez o supermercado, o marketplace ou a transportadora sejam os agentes indicados para fazer essa interface entre o usuário do veículo e o fabricante, já que são os maiores beneficiários desse sistema. Eles entregam o serviço e são responsáveis por pagar a mensalidade.

Imagine uma solução em que todo entregador do iFood pudesse ter acesso a uma carta de crédito de 50 mil reais, com parcelas de 1.300 reais por mês, para comprar um veículo elétrico da Fever. O entregador começaria a trabalhar pelo iFood com nosso veículo, e o iFood pagaria até 1.300 reais para nós. A partir desse valor, o entregador começaria a receber. Imagine o quanto isso aumentaria o crédito disponível e o número de operadores de delivery acessando nossos produtos.

É uma situação complexa, um desafio de um país tão grande como o nosso. Outro dia, vi que há mais de 300 mil pessoas conectadas ao Mercado Livre, por exemplo. É uma população gigantesca. Se oferecermos crédito de qualidade para que essa população compre um produto específico que vai melhorar a logística, economizar combustível, proteger o meio ambiente e a pessoa que está dirigindo, seria um caminho muito interessante para reinventar todo o ecossistema do delivery, um delivery realmente sustentável, mais protegido para quem dirige, e, o principal, mais econômico.

Sabemos que muitos entregadores cruzam um bairro inteiro para ganhar seis ou sete reais. Sabemos também que o gasto com gasolina pesa muito. Se eles fazem isso com eletricidade, a rentabilidade aumenta a cada entrega. Então, é bom para todo mundo. É bom para quem entrega, para quem está disputando espaço com as motos, para quem respira o ar da cidade… Enfim, não tem quem perca com isso. Essa é a minha visão, é um ambiente complexo. Às vezes, vamos até o operador e, em outras, vamos direto ao piloto da moto.

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