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“Fiz R$ 1.300 em um único dia, só na 99”: diz ex-fuzileiro naval que se tornou motorista de app

Motorista de app conta: "Peguei um sábado coloquei R$100 de etanol e fiz R$300 e pensei 'caraca já pensou fazer isso aqui todo dia?' Foi aí que decidi sair da CLT."

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Entrevista
Conversas com especialistas, gestores e profissionais do setor, com perguntas conduzidas pela equipe do 55content.
Homem sorridente de óculos e camiseta azul tira uma selfie dentro de um carro, usando cinto de segurança.
Foto: Miguel Junior para 55content

Nascido e criado em São Gonçalo (RJ), Miguel Junior deixou o Corpo de Fuzileiros Navais e encontrou nos aplicativos de mobilidade e na internet uma nova chance de sustentar sua família. Com quase sete anos de experiência como motorista e uma rotina puxada entre as ruas e os bastidores da produção de conteúdo, “Miguelzin Jr” hoje lidera um grupo de apoio chamado CDF Riders, mantém uma rotina regrada de trabalho e ainda encontra tempo para orientar colegas. 

Em seus conteúdos, Miguel mostra na prática como driblar as armadilhas dos algoritmos, otimizar ganhos, identificar boas corridas e, principalmente, como manter o equilíbrio emocional e financeiro num dos trabalhos mais desafiadores da atualidade. Sem rodeios, sem promessas ilusórias e com muita autenticidade, ele se tornou uma voz relevante no segmento dos motoristas de aplicativo.

Como e por que você se tornou motorista de aplicativo?

Como todo motorista, surgiu ali uma oportunidade de emprego na época. Sou ex-fuzileiro naval. Saí do Corpo de Fuzileiros, e, enfim, é uma longa história. Assim que saí, comecei a trabalhar na Oi. Trabalhei mais quatro ou cinco anos como fuzileiro. Quando saí, estava com uns 27 ou 28 anos. Não tinha nenhuma formação profissional, nenhuma faculdade, nenhum concurso, nada. A única coisa que dava para fazer era trabalhar com a Uber na época. Por isso que entrei nessa longa jornada. Graças a Deus, até agora a gente está conseguindo.

E que ano foi que você começou?

Foi no final de 2018, início de 2019. Peguei firme mesmo no início de 2019. Assim que saí do trabalho na Oi, peguei a rescisão, comprei um carro e entrei nos aplicativos.

E você saiu de fuzileiro naval porque quis mesmo ou porque não estava dando certo? 

Eu sou um cara muito apegado à família. Quando fui para o Corpo de Fuzileiros, nunca tinha me preocupado com estudos — erro meu, colho os frutos até hoje. Tive oportunidades de fazer faculdade, era ex-atleta, tinha bolsa em escolas boas. Mas, na época, eu só queria saber de bagunça. Quando comecei a namorar minha atual esposa — estamos juntos há 17 anos — resolvi mudar de vida. O que apareceu para mim foi o concurso de Fuzileiro Naval. Na época, era só com o ensino fundamental. Estudei, mas não muito, já tinha uma base boa por conta das bolsas em escolas como o Santa Mônica, aqui no Rio de Janeiro.

Passei no concurso, casei, tive minha primeira filha. Sempre fui muito apegado à família, apaixonado pela minha esposa e filhos. Tenho três filhos. No Corpo de Fuzileiros, tinha que viajar e ficar até um mês fora. Bateu a saudade. Cheguei à conclusão: “isso aqui não é para mim”. Saí. Aconteceram coisas que, se eu tivesse a cabeça que tenho hoje, talvez eu não tivesse saído. Hoje tenho 35 anos. Entrei no Corpo de Fuzileiros em 2009. Hoje eu teria uns 16 anos de Marinha, já seria sargento, faltando 14 anos para me aposentar. Mas tudo tem um propósito. Talvez, se eu não tivesse vivido tudo aquilo, hoje nem estaria aqui contando minha história para você.

E aí você começou a criar conteúdo para internet quando? Como teve esse start?

Sempre fui muito comunicativo em tudo que fiz. Saí da Marinha e fui para a Oi justamente para ter mais tempo com a família. Só que o trabalho era pesado. Era técnico de rede, mão de obra. Carregava escada todo dia. Um dia, pensei: “meu salário está baixo, vou tentar fazer um dia de aplicativo”. Peguei um sábado, coloquei R$ 100 de etanol e fiz R$ 300. Era meu aniversário de namoro e queria levar minha esposa para jantar. Quando vi esse resultado, pensei: “caraca, isso aqui é real. Imagina se eu fizer isso todo dia?”.

Foi aí que decidi sair da CLT. Pedi para ser mandado embora e comecei a rodar como motorista de aplicativo. Sempre fui muito correto, humilde, e fui mergulhando nesse universo. Na época, tudo era novidade. Uber, 99, era aquela sensação de ver o dinheiro entrando sem filtro, sem ter controle, sem entender de finanças. Era tudo mágico.

Mas eu tinha muito medo, porque moro em São Gonçalo, região perigosa. Todo dia ia vazio para a Zona Sul, trabalhava lá e voltava vazio. Não existia tempo estimado, KM, nome de passageiro, localidade, nada. Era roleta russa. Foi nesse contexto que decidi começar a fazer conteúdo. Teve uma corrida, um pouco antes da pandemia, no fim de 2019. Peguei uma viagem no centro do Rio. Quando iniciei a corrida, o destino era uma comunidade em São Gonçalo. Fiquei com medo.

Na época, eu não tinha filtro, não tinha canal no YouTube, não tinha ninguém para ensinar, não tinha grupo. Era na coragem. O passageiro entrava, eu iniciava a corrida e pronto. Eram dois rapazes. Começaram a agir de forma estranha, olhando muito pelo retrovisor. Fiquei com muito medo. Vi uma viatura, parei, saí correndo do carro, apavorado, e falei com o policial: “esses rapazes estão com atitude suspeita, estão se entreolhando, com mochilas, tô com medo de ser assaltado”.

Avisei que não faria mais a viagem, que cancelaria, devolveria o dinheiro e seguiria meu caminho. Mas, para o meu azar, os dois eram um casal homossexual. E a gente sabe como a Uber trata esses assuntos. 

Enfim, terminei a viagem, deixei os rapazes no local, mas eles me ofenderam muito, disseram que iam acabar com a minha vida. Eu não gravei nada, infelizmente. Estava com medo, queria sair logo daquela situação. No dia seguinte, eles foram à Delegacia de Crimes Raciais e registraram uma queixa contra mim. A Uber me bloqueou imediatamente.

Foi aí que começou meu desespero. Ser bloqueado da Uber naquela época era o fim. Hoje em dia o pessoal faz conta fake, mas na época não existia isso. Se existisse, talvez eu tivesse feito, porque sobreviver só com a 99 era muito difícil. Mas sou um cara correto. Não quis me corromper. 

Como todo motorista bloqueado, fui direto para a 99, mas é um aplicativo muito mais difícil de trabalhar, especialmente aqui no Rio. Corridas ruins, público diferente. Eu achava que sabia trabalhar, mas não sabia nada. Aprendi tudo ali, na marra. Fui adquirindo experiência. Mas não conseguia fazer dinheiro, ficava desanimado, voltei a cair em depressão.

Para piorar, uma semana depois, os rapazes usaram o contato que tinham na Globo e fizeram uma matéria contra mim, me acusando de racismo e homofobia. Aí minha vida desandou de vez. Entrei num estado profundo de depressão. Cheguei a cogitar tirar a própria vida. Eu pensava: “fui fuzileiro, trabalhei na Oi, agora não sirvo nem para dirigir?”.

Tinha dois filhos. Me sentia um peso, dependendo da minha esposa para sustentar a casa. Não por machismo, mas por me sentir frustrado. No dia em que pensei em acabar com tudo, cheguei para ela e perguntei: “Por que você ainda gosta de mim? O que te fez ficar comigo esses dez anos? Nunca te dei nada”. Ela respondeu: “Você sempre me fez sorrir. Sempre foi alegre”.

Naquele momento, percebi que era um agente de alegria. Onde eu chegava, o ambiente mudava. E entendi que o mal queria apagar essa luz. Então decidi: “se é para morrer, vou morrer trabalhando”. E fui para a pista.

Durante a pandemia, a 99 estava bombando. Rodei por São Gonçalo inteiro, até em áreas perigosas. No meio dessa rotina intensa, fui entendendo os fluxos do app: de manhã o movimento é do bairro pro centro; no meio-dia dá uma acalmada; depois vem o horário das escolas e hospitais; no fim da tarde, todo mundo voltando pra casa. Vi que dava pra ganhar dinheiro mesmo só na 99 e pensei: “Vou começar a mostrar isso na internet.”

Comecei no Instagram, com lives, stories, sem preguiça, na brincadeira. E o negócio foi crescendo. Criei um canal no YouTube, que foi ganhando espaço. Ainda não sou gigante, mas já sou uma voz no segmento. 

E hoje você trabalha pela 99, Uber ou pelos dois?

Voltei para a Uber. Fiquei cinco anos bloqueado. Era uma ferida aberta. Evitava falar, jogava para o lado. Mas o processo foi arquivado. Todo mundo é inocente até que se prove o contrário. Quando chegou ao Ministério Público, graças a Deus, viram que não fazia sentido. Expliquei que era área de risco, informei o endereço, e entenderam. Arquivaram o processo.

Quando já tinha desistido da Uber, estabilizado na 99, já com parcerias, conhecido como Miguelzinho da 99, Deus colocou um amigo no meu caminho. Influenciador aqui do Rio, mora em Belford Roxo. Ele falou: “Fui desbloqueado com a doutora Tatiana. Vai lá”. Relutei, mas ele insistiu: “Vai, o não você já tem”.

Ela olhou meu caso e disse: “Não demora um ano para você voltar aos aplicativos”. Meu coração tremeu. Eu, há quatro anos rodando honestamente na 99, enquanto muitos faziam conta fake, macete. Eu era o careta do mundo dos influenciadores. Mas fazia questão de ser diferente, mostrar que dava para trabalhar certo. Acho que as atitudes falam mais do que palavras. 

E quando ela disse que dava para desbloquear, veio a proposta: ou aceitar R$ 2.000 como compensação, ou abrir processo por danos morais. Mas, nesse caso, poderiam me bloquear de novo. Eu respondi: “Não quero dinheiro. Só quero minha conta. Pode ficar com o valor”. Fui desbloqueado no ano passado. 

E Miguel, como é a sua rotina? Você trabalha todos os dias? Tira algum dia de folga? Quantas horas por dia você costuma trabalhar?

Então, como é que funciona hoje em dia? Eu tenho um grupo chamado CDF Riders e sou o líder desse grupo. Aqui no Rio de Janeiro, eu acredito que o motorista de aplicativo tem que trabalhar com grupo. A ideia é compartilhar informações: “Rapaziada, tocou aqui, rua tal, dá para levar?” Se for aqui no centro de São Gonçalo, o pessoal responde. Mas e o motorista que não conhece? Aí alguém pergunta: “Tocou aqui no centro de Belford Roxo, dá para ir?” e outro responde: “Não, essa rua não dá, é área de risco”. Com isso, o motorista já evita problema.

Só que para gerir esse grupo, eu preciso de tempo. E não é fácil. Por isso cobro um valor simbólico. Muita gente tem preconceito: “Ah, tá ganhando dinheiro às custas do motorista”. Mas não é isso. Eu também estou trabalhando, com fone no ouvido, orientando a galera. E cada coisa que eu falo impacta diretamente na vida financeira, emocional, na segurança das pessoas. Esse valor ajuda a manter o grupo de pé.

Com o crescimento nas redes sociais, precisei mudar minha rotina. Hoje sou motorista de aplicativo segunda, terça e quarta. Esses são os dias em que estou na rua. Na quinta, me dedico totalmente à internet.

Na sexta e no sábado, volto para os aplicativos com força total. Nesses dois dias, eu desço a lenha mesmo. Meta alta, dia inteiro na rua. Claro que paro para almoçar, jantar com o pessoal do grupo, com inscrito, seguidor, mas sempre trabalhando. Mostrando na prática a realidade de ser motorista de aplicativo.

Jamais vou deixar de trabalhar na rua, porque muita gente quando cresce na internet perde a essência. Para de gravar na prática, começa a só fazer propaganda. Nada contra, mas você nunca vai me ver postando rifa, bet, essas coisas. Minhas parcerias surgiram porque fui cliente primeiro. Nunca chego dizendo que sou influenciador. Chego como cliente, sou bem atendido, faço um vídeo espontâneo, sem pretensão, e aí surge a proposta.

Domingo é meu dia de descanso. Tiro para ficar com minha família, tiro um tempo com Deus, porque senão não aguento. Só comecei a folgar agora, essa semana. Porque ano passado eu fazia um quadro no Instagram com metas mensais, então trabalhava de segunda a segunda. Era vídeo, Instagram, YouTube, tudo junto. Não era fácil.

Domingo só abro exceção em datas como Dia das Mães, Dia dos Pais, Réveillon e Carnaval — que são os melhores dias do ano no app.

E nesses dias em que você trabalha no app você tem alguma meta? Tipo, só volta para casa depois de atingir um certo valor?

Tenho, sim. Mas hoje, minha principal meta é cuidar da saúde física. Isso é algo que muitos motoristas não fazem. Eu sou motorista há sete anos. 

Eu, graças a Deus não preciso mais rodar todos os dias, então encontrei um espaço na rotina para cuidar de mim. Antes eu trabalhava 12, 13, até 15 horas por dia. Comecei a sentir os efeitos disso. 

Minha rotina é: acordo 8h, tomo café, vou para academia, levo as crianças na escola, volto para casa. Por volta de 13h, saio para trabalhar. A meta é bater até R$ 400 por dia ou trabalhar até 22h. Sei que essa não é uma realidade fácil para todo mundo, mas com experiência, mesmo num dia ruim, sei que faço pelo menos R$ 350.

Na sexta, não tem tempo. Começo entre meio-dia e 13h e só paro depois de bater entre R$ 500 a R$ 600. Se a pista estiver boa, vou até meia-noite, 1h, 2h. E no sábado, é onde estoura a banca. Começo às 10h da manhã e só paro de madrugada. Já fui até 3h, 4h, se o corpo aguenta e o movimento tá forte.

E quanto você costuma tirar por semana, em média?

Minha média semanal gira entre R$ 2.300 e R$ 2.700. R$ 2.500 é o número padrão. Eu preciso de R$ 10 mil brutos por mês para sobreviver. No réveillon de 2023 para 2024, minha esposa chegou e disse: “Não tenho dinheiro para pagar a escola das crianças”. Fiquei arrasado. Brigamos e saí para trabalhar. Era meia-noite, réveillon virando. Trabalhei feito louco. Fiz R$ 1.300 em um único dia, só na 99. Foi um dos melhores resultados do Rio.

Aí caiu a ficha. Pensei: “Se eu tô nessa situação, a culpa é minha. Eu que vou ter que sair dela”. Decidi trabalhar de segunda a segunda, sem parar. Ainda estava bloqueado na Uber, então era só 99. Não tinha desculpa. Meu dia começava 11h, meio-dia, e ia até 22h, 23h30. Fazia R$ 300, R$ 350, às vezes batia R$ 400. Sábado e domingo era mais puxado.

Fiz isso durante muito tempo e cheguei à conclusão: preciso de R$ 10 mil por mês. É uma conta bruta, claro, mas consigo sobreviver com isso.

Tem muito motorista que só trabalha quando está apertado. Espera a prestação do carro chegar, aí corre para rua igual maluco. Mas não se organiza no começo do mês, quando o movimento está melhor. Aí chega dia 20 e pouco, tudo parado, o carro quebra, e ele vai ver vídeo meu fazendo R$ 1.000 num dia e pensa: “Esses influenciadores ferram com o aplicativo”.

Mas não é isso. Eu tô aqui por propósito. Aprendi a focar em quem quer ser ajudado. Quem não quer, eu deixo de lado e sigo ajudando quem tem vontade.

E falando sobre gastos, como você organiza suas finanças no aplicativo? Você abastece todo dia ou enche o tanque de uma vez?

Eu sei exatamente quanto gasto, até porque uso um aplicativo chamado CPMA. Antes disso, eu anotava tudo no caderninho mesmo. O que eu costumo gastar: combustível é R$ 100 por dia. Nas sextas e sábados, gasto mais — geralmente R$ 120 na sexta e no sábado eu completo o tanque, que dá entre R$ 140 e R$ 160, porque é o dia em que mais trabalho.

Então, por semana, faço uma média de R$ 570. Além disso, tem o financiamento do carro, conta de luz, telefone, escola das crianças. Minha esposa trabalha e contribui com a parte dela nas finanças da casa, como escola, luz e condomínio. Graças a Deus, hoje conseguimos morar num lugar com mais qualidade de vida para os nossos filhos, com muito esforço.

A gente aprendeu a se planejar financeiramente, algo que muitos motoristas de aplicativo ainda pecam. O que acontece muito: o cara sai do CLT, pega a rescisão e vira Uber. Ganhava R$ 2.000 por mês, mas não se dá conta de quanto ele realmente custava para a empresa: plano de saúde, vale-refeição, vale-transporte, INSS, aposentadoria. Pergunta para qualquer motorista se ele se preocupa com aposentadoria. 95% nem sabe falar sobre isso. E investimento? Também não.

E você prioriza ganhos por hora ou por quilômetro?

Por hora. KM não paga boleto. Aqui no Rio, se você for trabalhar pensando em quilometragem, tá lascado. Qual é minha estratégia? Moro em São Gonçalo, que é região metropolitana. Do lado de cá temos Niterói e São Gonçalo, do lado de lá, Rio de Janeiro. Eu moro no centro de São Gonçalo, onde o poder aquisitivo é mais baixo.

O que eu faço: coloco o destino e pego a primeira corrida, mesmo que seja pagando mal, só para ir até minha área de atuação. Chamam isso de “Uber do Gari”, porque o pessoal reclama que eu só pego corrida ruim. Mas é estratégia. Faço isso para chegar ao Centro do Rio, Zona Sul, Barra, Aeroporto, Tijuca (durante o dia). Lá sim eu filtro as corridas. Só faço corrida pagando R$ 2 por KM ou R$ 1 por minuto.

Corridas fora desse padrão? Só se for num horário muito ruim, tipo 14h, ou se eu estiver no Leblon e quiser voltar para o Centro às 16h. Fora isso, se a Uber mandar corrida ruim, vou ignorar até as 22h e volto vazio para casa. Essa é minha forma de protesto.

A gente precisa entender o contexto. Início de mês? Data comemorativa? Ótimo para fazer corrida boa. Mesmo com a demanda alta, o app vai te mandar corrida ruim — porque o motorista não sabe filtrar. 

Eu, nesse Dia das Mães, fiz quase R$ 1.000 só na Uber, mesmo sem promoção. Se tivesse ganhado os R$ 500 de promoção que a Uber deu para alguns, teria passado de R$ 1.000 tranquilo. Segunda-feira, quando estava todo mundo sem grana, eu estava levando minha mãe para almoçar num dos melhores restaurantes da cidade. Porque trabalhei quando era para trabalhar.

Quantos quilômetros você roda por dia, em média?

Geralmente, rodo cerca de 200 km por dia. Minha média gira entre 200 e 250 km de segunda a quarta. Sexta e sábado não tem regra: costumo rodar 250, 300 km, e no sábado até mais. Mas sempre procuro, no fim do dia, manter uma média de no mínimo R$ 1,80 por KM. Posso até ir para a área de atuação com uma corrida ruim, pagando R$ 1,10, R$ 1,20, R$ 1,30, mas chegando lá, só aceito corrida que pague acima de R$ 2 por KM e R$ 1 por minuto.

E sobre as taxas e promoções dos aplicativos?

Vamos lá. Por exemplo, no Dia das Mães, a Uber deu R$ 500 de promoção para muitos motoristas aqui no Rio. E por que não recebi? Porque no sistema da Uber — no algoritmo — eles sabem quem sabe trabalhar. Eles classificam motoristas por nível: experientes, intermediários, e os que fazem por renda extra. No começo, quando voltei para a Uber, recebi muita promoção. Durante quatro domingos seguidos fiz R$ 1.000. Do nada, cortaram. Por quê? Entrei na lista negra.

A Uber sabe que eu ganho dinheiro, então ela manipula os ganhos. Se você é motorista que sabe trabalhar, filtra bem as corridas, não vai para área de risco, faz tempo e KM altos, ela não te bloqueia, mas te trata diferente. Prefere o motorista casual, que aceita tudo. Por isso, criaram essa regra de taxa de aceitação para ser Gold, Platina e tudo mais. Querem que o motorista aceite qualquer corrida.

No Dia das Mães, por exemplo, eram 90 corridas por R$ 500. O cara vê aquilo e sai aceitando tudo: zona de risco, bairro ruim, só para bater meta. Eu não. Saio de São Gonçalo, vou para a área onde paga bem e lá sim, dentro do meu padrão, bato minha meta. 

Eu não me preocupo com taxa de aceitação. Agora, taxa de cancelamento é diferente — essa dá bloqueio. Tanto na Uber quanto na 99. E agora tem também a taxa de finalização na 99. Se sua taxa cair abaixo de 70%, todo dia 15 você pode ser bloqueado por três meses. Isso é sério.

Minha dica? Aceitou a corrida? Faz. Claro que nem todas dá para fazer, mas respeite os limites. Na Uber, o limite é 10% de cancelamento. Na 99, 70% de finalização. Dentro disso, dá para trabalhar. Mas taxa de aceitação? Esquece. Deixa tocar o que for, só aceita o que te convém. Eu só faço o que vale a pena — e o aplicativo odeia isso.

E você roda pelo UberX ou Comfort?

Hoje eu rodo pelo Uber Comfort. Na 99 é o 99 Plus. Na época em que fui bloqueado da Uber, eu só tinha a 99. Tinha um Logan e troquei por um Argo para entrar no Comfort da 99. Uma semana depois, tiraram o Argo do Comfort e criaram o 99 Plus. Fiquei uns meses rodando só pela 99. No meio disso, a Uber liberou o Comfort para o Argo. Só que eu ainda não tinha conta na Uber.

Ficava pensando: “Caramba, quando eu for Comfort na Uber vai ser outra vida”. Porque eu era 99 Pop. Quando voltei para a Uber, foi direto do UberX para o Comfort. Foi como sair do fundo da montanha-russa direto para o topo. Hoje o Argo pega UberX, Uber Comfort e 99 Pop.

O carro já é seu? Está quitado?

Ainda não. Faltam algumas prestações. Esse foi meu erro. Estava com problema no Logan que eu tinha e queria me livrar dele. Acabei financiando muitas parcelas, mas graças a Deus estou regularizando minha vida financeira. Pelo menos hoje consigo guardar R$ 50 por dia para manutenção.

E essa é a dica que dou para qualquer motorista: guarde dinheiro para a manutenção do seu carro. Quando comprei o Argo, ele estava praticamente novo, com 39 mil km rodados. Fui rodando até os 100 mil sem dar nenhum problema. Nesse tempo, fui juntando dinheiro. Porque o motorista acha que carro novo não quebra. Mas quebra, e quando quebra, é caro.

Faça uma reserva de emergência para manutenção. Assim você não se enrola em cartão de crédito, não se endivida. Eu pago todas as minhas manutenções à vista. No crédito, mas com cashback. É tudo parte da organização financeira que comentei antes.

Você indica ser motorista de aplicativo em 2025? Vale como renda extra ou principal? E que dicas você daria para quem está começando?

Essa pergunta é complicada. Vou ser sincero: depende da pessoa. Se for alguém ousado, com vontade de vencer, com garra para trazer sustento para a família, pode sair do CLT e cair dentro dos aplicativos. Agora, se for alguém sem disciplina, preguiçoso, que reclama do trabalho, do patrão, da esposa, de tudo… esquece. Vai se machucar. Não é o glamour que muita gente mostra na internet, mas também não é esse caos que outros falam. Tem que ser regulado, planejado, disciplinado.

Hoje, na minha visão, está até mais fácil para quem é iniciante. O aplicativo já mostra tempo e destino, existem ferramentas para calcular ganhos, filtrar corridas e tem muito conteúdo na internet. Procure um influenciador que fale a verdade, que não iluda com promessas falsas. Não estou vendendo meu peixe, mas tem que ser transparente.

Se você fizer isso — cuidar da vida emocional, espiritual, física e financeira — vai se dar bem, não só nos apps, mas em qualquer área. A questão não é a profissão. É o que está dentro de você. Então, onde quer que você esteja, se estiver bem resolvido internamente, vai prosperar — seja no Uber, no YouTube, no comércio, nas Forças Armadas ou em qualquer outro lugar.

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