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“A Uber não quer que o motorista escolha corridas. Ela quer que ele aceite tudo, sem questionar. Quer que ele seja refém do sistema”, diz influenciador

Motorista de app lamenta: "Hoje, o aplicativo não paga nem R$ 1,20 por km, e isso não cobre mais os custos. O mínimo defendido de R$ 2 por km já não é mais suficiente".

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Entrevista
Conversas com especialistas, gestores e profissionais do setor, com perguntas conduzidas pela equipe do 55content.
Homem sorrindo, usando uma blusa branca, sentado no banco do motorista de um carro com interior marrom da Volkswagen.
Foto Alex Driver da Quebrada para 55content

Com mais de cinco anos de experiência nas ruas e sete à frente do canal Driver da Quebrada VIP, Alexander dos Santos é uma das vozes mais ativas na defesa dos direitos dos motoristas de aplicativo. Hoje, atuando apenas como criador de conteúdo, ele compartilha sua trajetória no setor, as razões que o levaram a deixar as plataformas e sua visão crítica sobre os desafios enfrentados pela categoria — desde tarifas defasadas até a insegurança nas ruas. Na entrevista concedida ao 55content, ele fala sobre como tudo começou, o que mudou de 2017 para cá e o que realmente vale a pena para quem pensa em entrar na profissão.

Como você começou a trabalhar como motorista de aplicativo e por que parou?

Eu comecei a trabalhar como motorista de aplicativo em 2017, né? Após sair do meu emprego CLT. Em 2017, iniciei nesse trabalho com um carro alugado, porque eu não tinha veículo próprio. Naquela época, era muito mais barato, muito mais em conta alugar um carro. As coisas eram mais acessíveis, e as tarifas realmente eram bem atrativas.

Pra você ter uma noção, eu alugava o carro por R$ 1.300 por mês em 2017, e rapidamente, em questão de dois dias — considerando combustível e tudo —, eu conseguia fazer o valor necessário para pagar o aluguel mensal do carro trabalhando apenas esses dois dias. Então, sou motorista desde 2017, né?

Fiquei trabalhando como motorista de aplicativo até o final de 2021, mais ou menos. Durante esse período, em 2018, abri meu canal no YouTube, compartilhando minha experiência na época com motoristas novatos de aplicativo, passando dicas e orientações baseadas no que eu vivia na prática.

Hoje eu não atuo mais como motorista de aplicativo. Atualmente, estou apenas com o canal no YouTube. Inclusive, nos meus vídeos, sempre deixei isso bem claro para os meus inscritos, né? Isso já tem mais de três anos.

Meu canal completa agora, em agosto, sete anos, e há três anos eu parei realmente de depender do aplicativo. Sempre comentei isso com a audiência, sempre falei bastante sobre esse ponto, porque considero muito importante ser transparente, não iludir e não enganar as pessoas. A gente precisa ser justo, e eu sou uma pessoa justa. Por isso, falei, com clareza, que não trabalho mais como motorista de aplicativo há mais de três anos.

E sua fonte de renda principal hoje é com a produção de conteúdo então?

Hoje em dia, eu trabalho no YouTube, que é a minha fonte de renda. No YouTube, eu procuro sempre lutar pelos direitos dos motoristas. Hoje eu sou um youtuber que tem um vasto conhecimento, tá? Trabalhei mais de 5 anos full time como motorista de aplicativo. Comecei com carro alugado e, depois, comprei o meu próprio carro.

Com o tempo, o canal começou a crescer, eu comecei a colher os frutos do trabalho no canal e, a partir daí, passei a lutar pelos motoristas, cobrando das plataformas melhores tarifas, principalmente em relação ao valor do quilômetro rodado. Sempre defendi que o valor deve ser calculado por quilômetro, não por hora, como vejo alguns comentando por aí. Pra mim, isso é um erro, porque tudo no carro é baseado no quilômetro rodado.

A depreciação do veículo acontece por quilômetro, o desgaste também é por quilômetro, não por hora. Quando você vai abastecer, é porque rodou uma determinada distância. Por exemplo, se o carro faz 10 km por litro, significa que 1 litro de combustível é consumido a cada 10 km, e não a cada 10 horas. É isso que eu tento mostrar para os motoristas no canal, com clareza e embasamento.

Você falou que faz 3 anos que você parou, né? Você rodava na Uber, 99 ou nos dois? 

No início, eu rodava apenas pela Uber, porque só existia a Uber — a 99 ainda não tinha chegado. Trabalhei com a Uber durante todo o ano de 2017. Em 2018, surgiu a 99, que na época ainda era uma empresa brasileira. Depois, ela foi vendida para os chineses — era considerada um unicórnio brasileiro, né?

Quando a 99 chegou em 2018 em Santos, que era onde eu atuava e morava na época — eu sou natural de Santos — comecei a rodar mais com ela. Hoje moro em Uberaba, no interior de Minas Gerais, há 4 anos, mas nasci e fui criado em Santos.

A 99, naquela época, chegou com muitas promoções. Não tinha ainda tantas viagens, mas pagava bem melhor. Isso porque a Uber, no decorrer de 2017 para 2018, já vinha diminuindo os valores: valor mínimo da corrida, valor por quilômetro, tudo foi sendo reduzido. E a 99 chegou oferecendo tarifas melhores e com diferenciais importantes — ela já mostrava o destino da corrida, por exemplo, algo que a Uber só foi implementar três anos depois.

Isso fazia muita diferença, principalmente para quem trabalhava em um lugar como Santos, na Baixada Santista, que é uma região muito perigosa, com altos índices de violência, presença de morros, favelas e muitos casos de assalto. Infelizmente, cheguei a perder um parceiro de trabalho — não era um amigo próximo, mas alguém que trabalhava na mesma área — numa rota que eu mesmo fazia com frequência, de Santos para Cubatão. Cubatão, ali na Baixada Santista, é uma área muito perigosa.

Perder esse parceiro aumentou ainda mais nosso medo, justamente porque, na época, a gente não sabia para onde estava indo — a Uber não mostrava o destino da corrida. Por isso, comecei a priorizar mais a 99. Quando a Uber lançava promoções ou oferecia incentivos melhores, eu voltava a rodar mais com ela. Ficava alternando entre os dois aplicativos, avaliando sempre qual deles estava mais vantajoso no momento.

 Acredito que, mesmo não estando mais nas ruas, você tenha contato com os motoristas. Gostaria que falasse um pouco sobre a questão de cobrar por quilômetro ou por hora.

Converso bastante, claro. Tenho contato com vários parceiros, principalmente através de grupos de WhatsApp, mensagens diretas no Instagram ou no próprio canal. Tenho contato pessoal com motoristas que realmente estão nas ruas e que me passam uma vasta quantidade de informações sobre o que está acontecendo no dia a dia da profissão, tá?

Mesmo que eu não trabalhe mais como motorista de aplicativo, o meu trabalho hoje é justamente esse: passar informação e também cobrar soluções para as dificuldades que os motoristas enfrentam nas ruas. Sempre vou bater nessa tecla — cobrar os aplicativos — porque esse é o meu objetivo, tá?

E, sim, as corridas precisam ser pagas por quilômetro rodado. Estamos acompanhando a tramitação da PL (Projeto de Lei), que está em andamento. Esse PL prevê o pagamento de R$ 32 por hora para o motorista, mas isso é um erro. Os motoristas não querem isso. Eles não são contra a existência de uma regulamentação, mas são contra essa proposta específica, que prejudica diretamente a categoria.

Muita gente não sabe, mas esses R$ 32 por hora são calculados apenas entre o momento do aceite até a finalização da corrida — não contam o tempo em que o motorista está online, aguardando chamada. E esse tempo de espera também é trabalho. O motorista está na rua, correndo riscos, muitas vezes parado em locais escuros ou até mesmo em áreas movimentadas, mas perigosas. A gente sempre fala que “a ocasião faz o ladrão”, né? Então, mesmo parado, ele está ali trabalhando.

Por isso, não é justo limitar o pagamento a esse período ativo da corrida. O motorista tem que ganhar por quilômetro. Há três anos a gente vem falando que o mínimo justo seria R$ 2,00 por km. Só que hoje isso já ficou para trás. O motorista está recebendo R$ 1,00, R$ 1,20 por km, dependendo da cidade. Existem lugares que pagam um pouco melhor, e outros que pagam muito mal.

Falando aqui do interior de Minas Gerais, especificamente de Uberaba, a situação é muito ruim. O aplicativo não paga nem R$ 1,20 por km, e isso não cobre mais os custos. Hoje em dia, nem R$ 2,00 por km seria suficiente. Tudo aumentou — combustível, manutenção, aluguel de carro, tudo está muito caro. E as tarifas estão defasadas há muitos anos. Estamos falando de 8, 9 anos com os mesmos valores, sem reajuste significativo.

Na minha opinião, o motorista de aplicativo precisa ganhar, no mínimo, R$ 3,00 por km. Aí muita gente pode dizer: “Ah, Alex, mas se aumentar para R$ 3,00 o quilômetro, os passageiros não vão usar.” Mas a verdade é que os passageiros já pagam esse valor. O problema está no repasse da Uber, que é muito, muito baixo.

O repasse da Uber passa de 30% a 40%. Em muitas corridas, por exemplo, o passageiro paga R$ 100, mas o motorista fica com R$ 60 e a Uber com R$ 40. Sendo que todo o operacional — o carro, o combustível, os riscos, o tempo — é do motorista. É ele quem arca com tudo. E não é um investimento barato. Para trabalhar, o motorista precisa ter um carro de pelo menos R$ 50 mil, R$ 60 mil. Dependendo da categoria, como o Uber Black ou veículos elétricos, esse valor pode ser ainda maior.

Então, o motorista precisa de uma tarifa mais justa. É isso que eu cobro constantemente no meu canal. Sempre vou defender uma tarifa que realmente seja digna, que cubra os custos e permita que o motorista tenha lucro. Porque é disso que ele vive.

O canal Driver da Quebrada VIP sempre vai estar do lado dos motoristas, sempre correndo atrás de melhorias para a categoria — seja na questão da tarifa, seja na segurança, que é extremamente importante. Porque, infelizmente, já perdemos muitos irmãos nas ruas desse Brasilzão afora. E não são poucos, são vários — são milhares.

Nesses últimos 10 anos, pode colocar aí: mais de 1.000 motoristas — entre homens e mulheres — perderam a vida trabalhando, enfrentando os riscos diários do trânsito, da violência e da falta de proteção. É muito sério.

Por isso, a gente continua nessa luta, sempre cobrando os aplicativos, exigindo que eles paguem melhor, que valorizem o trabalho do motorista. Essa cobrança é constante. Os motoristas não querem trabalhar para ganhar por hora. Eles querem ganhar por quilômetro — e por um quilômetro justo. Não dá mais pra aceitar esse valor.

E o que você diria para quem está começando agora? Indicaria para quem está precisando de um emprego? Você acha que ainda vale a pena entrar para Uber, para 99?

Olha só, quem saiu do emprego, como foi o meu caso, precisa avaliar muito bem antes de entrar nesse mercado. Mas é importante dizer: cada época é uma época. Hoje estamos em 2025, e eu estou falando de 2017. Quando saí do meu emprego, eu só tinha a habilitação comum. A única exigência foi incluir o EAR. Meu único gasto inicial foi com o aluguel de um carro, que custava R$ 1.300 por mês naquela época.

Hoje, em 2025, se a pessoa sai do emprego e não tem carro — ou seja, não tem a principal ferramenta de trabalho — eu não recomendaria entrar nessa. O aluguel de um carro atualmente, mesmo em acordos particulares, está alto.

Hoje, para alugar um carro, a pessoa vai gastar pelo menos R$ 800 a R$ 900 por semana. Ao mesmo tempo, as corridas pagam em torno de R$ 1,00 por quilômetro. Além disso, ainda é preciso abastecer. A gasolina está beirando R$ 6,00 em muitos lugares, e aqui no Sudeste, especialmente em Minas Gerais, o ICMS é mais alto. Em alguns casos,  já vi o preço passar de R$ 7,00 por litro.

Colocando todos esses custos na ponta do lápis, é muito difícil ter lucro. A tendência é dor de cabeça. Ainda há o risco de acidentes, e o que acontece hoje é que o motorista precisa rodar cada vez mais. Na minha época, eu trabalhava 8 ou 9 horas por dia e batia a meta com rapidez. Hoje, para alcançar a mesma meta, é preciso ficar 15 ou 16 horas nas ruas — todos os dias.

Antes, eu conseguia folgar aos domingos ou às segundas-feiras. Às vezes trabalhava no fim de semana e folgava depois. Hoje isso se tornou raro. Claro que varia de cidade para cidade. Em conversas com motoristas de São Paulo, por exemplo, muitos ainda dizem que conseguem manter uma rotina razoável. O mesmo vale para o Rio de Janeiro e outras grandes metrópoles, onde há mais demanda. Mas em cidades pequenas, dificilmente a conta fecha.

Agora, se a pessoa tem o próprio carro e saiu do emprego, está desempregada e precisa gerar renda, tudo bem usar o aplicativo como alternativa temporária enquanto busca recolocação. Sou totalmente a favor de usar o aplicativo como complemento de renda. A pessoa tem um emprego fixo, de segunda a sexta, e usa o sábado ou o domingo para fazer algumas horas de corrida, pagar uma conta de luz, fazer a feira do mês. Nesse caso, o desgaste do carro é menor, o consumo de combustível é menor e a pessoa tem liberdade de escolha. Ela não está no desespero.

Quando existe um salário garantido, o motorista consegue usar o aplicativo com mais autonomia, como renda extra. Esse modelo eu apoio. Mas, para trabalhar em tempo integral, como vejo muita gente fazendo, a realidade é outra. Tenho visto muitos motoristas endividados, com carros sucateados, pneus carecas, para-choques caindo, veículos amassados.

Enquanto isso, infelizmente, há pessoas pintando um cenário cor-de-rosa, como se fosse simples. Dizem que basta entrar no aplicativo, alugar um carro, que o dinheiro vai entrar. Mas não é assim que funciona.

E a questão do carro elétrico? Acha que vale a pena pra motorista?

Não. O carro elétrico, infelizmente, não vale a pena para o motorista de aplicativo. Como eu já comentei, as tarifas estão muito defasadas. Por exemplo, neste exato momento, como ainda não há tantos carros elétricos rodando, existe até uma certa valorização, um estímulo inicial, assim como aconteceu quando os aplicativos chegaram ao Brasil — era fácil ganhar dinheiro no início, muito mais rápido. Mas, para o motorista investir em um carro elétrico, na minha visão, não compensa.

Não vale a pena porque o carro precisa ser carregado, tem custos de manutenção específicos e, no caso de um acidente, os prejuízos podem ser altíssimos. Você pega um BYD, por exemplo: se bater, está em apuros. Ainda não existe uma estrutura de assistência acessível. Não é como levar o carro num mecânico do bairro, que vai dar um jeito e no dia seguinte está pronto. Com carro elétrico é diferente — as peças vêm da China, demoram a chegar, o custo é alto, e a manutenção é complexa.

É um investimento muito caro para o motorista de aplicativo. O motorista merecia sim andar com um bom carro. Eu sempre digo nos meus vídeos, mesmo que seja de forma simbólica: o motorista deveria andar de Ferrari, de Mercedes, de Lamborghini, de McLaren, ou qualquer carro de alto padrão. Desde que ele recebesse para isso. Mas ele não recebe. O motorista investe muito em um carro elétrico e não tem retorno. Na prática, vai acabar endividado.

No meu canal, eu sempre digo: tenha o seu carro, mesmo que seja um Celtinha! Está quitado? Então arruma ele. Cuida dos pneus, da mecânica, faz uma revisão direitinho, deixa o carro confiável e continua trabalhando com ele. Não entre nessa de comprar um carro porque agora todo mundo está indo para o elétrico ou híbrido de duzentos mil reais. Isso vai te colocar em dívida e te deixar sempre nas mãos da plataforma.

No fim das contas, o motorista que se endivida fica refém das plataformas. E quanto mais endividado, pior. Não é à toa que estão oferecendo empréstimos aos motoristas — justamente para aumentar a dependência. E o motorista, preso a essas condições, entra numa espécie de corrida de ratos, como costumo dizer. Corre, corre e não sai do lugar.

Então, o carro elétrico não compensa hoje em dia para o motorista de aplicativo. Algumas pessoas interpretaram mal o que eu disse no meu último vídeo mas a minha opinião é essa e vai continuar sendo. É um investimento alto demais, e o retorno não cobre. Se o motorista não fizer esse investimento já tendo capital, por exemplo, dando um carro de entrada, não faz nem cócegas no valor. Ele vai se endividar e se tornar ainda mais dependente da plataforma.

Claro que existem exceções. Há pessoas com situação financeira mais estável, com casa própria, placas solares e uma estrutura familiar organizada. Para esses, pode até funcionar. Mas isso é a minoria. Eu diria que 99% dos motoristas não vivem essa realidade. 

Qual a maior dor que você observa em seus colegas motoristas?

O principal sofrimento do motorista hoje são, de fato, as tarifas defasadas. E, pior, elas continuam caindo. As plataformas lançam recursos como o “radar de viagens”, e as corridas, muitas vezes, simplesmente não valem a pena. O motorista passa 15 horas na rua e, mesmo assim, acaba recusando a maioria das chamadas.

Já mostrei muitos prints sobre isso. Quando você fecha o resumo mensal, por exemplo, aparece: tocaram 20.000 corridas, o motorista aceitou 1.000. Isso mostra o nível de seleção que os motoristas estão sendo obrigados a fazer. Essa é a maior dor hoje: não poder aceitar tudo. Na minha época, em 2017, 2018, até 2019 e 2020, eu nem olhava a corrida. Estava dirigindo, tocava, eu já apertava o dedo aceitando. Eu sabia que era boa. Hoje, não dá mais pra fazer isso. O motorista precisa escolher, e isso torna o trabalho muito mais desgastante e lento.

Existe também o que chamamos de “bloqueio branco”. Isso acontece quando o motorista rejeita muitas corridas seguidas. Ele pensa: “Essa não compensa”, e deixa tocando. Só que uma hora a plataforma — seja a Uber ou a 99 — percebe e simplesmente para de enviar corridas para aquele motorista. A leitura que o sistema faz é: “Esse motorista não quer trabalhar”, quando, na verdade, ele só está tentando escolher corridas que paguem de forma justa.

O problema é que as plataformas não querem que o motorista escolha. Elas querem que ele aceite tudo, sem questionar. Querem que ele seja refém do sistema. E quando esse bloqueio branco acontece, o motorista pode passar uma, duas horas sem receber nenhuma corrida.

Depois de um longo tempo sem corrida, ela vai lá e oferece uma viagem a R$ 0,80 o quilômetro. E o motorista, já exausto, no desespero por estar parado, acaba aceitando. Cai na armadilha. Infelizmente, essa é uma das maiores dores da categoria hoje.

Outro ponto muito sério é a insegurança, algo que sempre abordo no meu canal. Dou muitas dicas sobre isso porque, no fim das contas, o principal objetivo do motorista deve ser voltar para casa vivo e bem. Ganhar dinheiro é importante, claro. Mas nada é mais valioso do que a vida.

O que está acontecendo hoje nas ruas é uma atrocidade. Quando um motorista cai nas mãos de um criminoso se sair vivo, já é muita sorte. É preciso levantar as mãos para o céu e agradecer a Deus.

Olha o absurdo: o motorista perde o carro, um bem que ele está pagando com muito esforço, muitas vezes já endividado, com a corda no pescoço, e ainda assim precisa agradecer por ter sobrevivido. Isso mostra o nível de insegurança em que vivemos.

E  você tem alguma dica pra deixar pra quem trabalha nos aplicativos?

Seria muito interessante que os motoristas de aplicativo também passassem por um processo de conscientização nas ruas. Digo isso porque está acontecendo uma verdadeira canibalização entre os próprios motoristas. E o que é essa canibalização? Muitos estão aceitando todos os tipos de corrida, sem critério. E não é assim que se trabalha.

É preciso aprender a trabalhar com estratégia. É necessário escolher as melhores corridas, dar valor ao próprio trabalho, dar valor ao bem que você usa para trabalhar — que é o carro, um bem caro e difícil de manter. E o investimento não é apenas o valor do veículo. Existem outros custos: IPVA, licenciamento, multas, manutenção… São vários fatores que, quando ignorados, acabam levando muitos motoristas ao endividamento.

O que quero reiterar aqui é um pedido para que os motoristas se unam mais, que sejam mais solidários uns com os outros e comecem a reivindicar melhorias, como é justamente o foco do meu canal: reivindicar, cobrar, questionar.

Muita gente diz: “Ah, cara, tu só reclama, só chora.” E eu respondo: “Não. Eu reivindico melhorias.” E se meu trabalho não fosse essencial, não teria o retorno que tenho. Mas é essencial, e os próprios motoristas me dão esse feedback constantemente. Sou grato por isso, e é por isso que continuo fazendo o que faço: cobrando melhorias.

Também peço que os motoristas parem de aceitar corridas a R$ 1,00, R$ 1,10, R$ 1,15, R$ 1,20 por quilômetro. Esses valores não cobrem seus custos. Pode parecer um dinheiro rápido, que entra na mão na hora, mas a cobrança vem depois. Lá na frente, o desgaste do carro, o combustível e a manutenção, tudo isso pesa. No fim, o motorista está rodando mais e ganhando menos.

Hoje em dia, recebo relatos preocupantes. Muitos motoristas estão enfrentando depressão, estão tristes, sem perspectiva. Já recebi mensagens de motoristas pensando em tirar a própria vida. E eu passei horas conversando, aconselhando, dizendo: “Pelo amor de Deus, não faça isso.” Isso é muito sério.

O motorista de aplicativo precisa entender que quem faz a roda girar é ele. Quem move o sistema são os motoristas. Quando essa consciência surgir, quando houver união real entre os profissionais e cobrança efetiva das plataformas, a vida do motorista de aplicativo vai melhorar e muito.

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