Rodrigo Vieira, motorista de aplicativo desde 2016 em Recife, viu de perto as transformações do setor e aprendeu a se adaptar para continuar lucrando. Em entrevista, ele aborda a seletividade nas corridas, a necessidade de planejamento para evitar prejuízos e a realidade dos ganhos, que, segundo ele, não acompanham a inflação.
Com a experiência de quem já precisou mudar de carro para equilibrar custos e adotar estratégias para maximizar o faturamento, Rodrigo explica por que recomenda cautela para quem deseja ingressar na profissão. Além disso, ele compartilha a importância de trocar informações com outros motoristas e estudar o funcionamento das plataformas para não cair em armadilhas financeiras.Confira abaixo a entrevista completa:
Então, Rodrigo, o objetivo da nossa conversa é saber um pouco mais sobre a sua experiência como motorista de app. Minha primeira pergunta é mais pessoal: desde quando você começou com esse trabalho e o que te motivou a trabalhar com o serviço de transporte para aplicativo?
Rodrigo: Eu comecei a trabalhar, acho que foi entre 2016 e 2017, se não me engano. Não lembro exatamente. Na época, eu tinha um comércio, e ainda tenho hoje. Também tinha um carro para uso familiar. Meu pai, depois que soube que a Uber tinha chegado em Recife, se cadastrou para testar e ficava me falando sobre isso: “Arthur, me cadastrei na Uber para testar, é bom, não sei o quê”. Eu achava interessante, mas nunca tinha dirigido ou usado a plataforma.
Aí, um dia em que eu não estava fazendo nada, resolvi testar. Usei a plataforma para uma corrida, pois estava sem carro, e gostei muito do serviço e da ideia do negócio. Decidi então me cadastrar como motorista. Me cadastrei e achei muito bom. Sempre trabalhei em comércio, mas não gostava de ficar preso dentro de uma loja. Depois de anos nesse ambiente, ser motorista foi uma fuga para mim. Gostei da liberdade de estar na rua, vendo as coisas, conversando com as pessoas.
Com o tempo, percebi que conseguia pagar minhas despesas como motorista sem problemas. Então, decidi fechar minha loja e focar no transporte. Na época, também trabalhava com suporte de computadores, então conseguia conciliar os dois.
E como é a sua rotina nos apps hoje? De que horas a que horas você trabalha? Tira algum dia de folga? Você se guia por metas, tipo só voltar para casa depois de faturar um valor específico?
Rodrigo: Hoje, eu saio para cumprir um horário de trabalho. Recife é muito diferente de São Paulo e de outras cidades grandes. Se você for tentar seguir as mesmas metas de faturamento que o pessoal de São Paulo, vai acabar passando muito tempo dentro do carro.
Minha meta é baseada no tempo de trabalho. Eu saio e, dentro desse tempo, faço o que for possível. Se conseguir R$ 200, ótimo. Se for R$ 300, R$ 600, também está bom. Uso os aplicativos como uso minha loja: dedico um período de trabalho, mas não foco só no valor. Faço o que for viável dentro do tempo disponível.
Quantos dias por semana você trabalha? Folga algum dia?
Rodrigo: Geralmente, não trabalho aos domingos, mas de segunda a sábado estou na rua.
Trabalhando dessa forma, quanto você consegue faturar por semana e por mês? Essa é uma dúvida comum entre motoristas, pois eles gostam de comparar para entender a melhor forma de trabalhar.
Rodrigo: Não gosto muito de falar sobre ganhos. No meu caso, os aplicativos não são minha renda principal, graças a Deus. Hoje, divido meu tempo nos apps para cobrir os custos do carro e pagar algumas despesas extras.
Em momentos bons, consigo fazer R$ 2.000 na semana. Às vezes, R$ 1.500, ou um pouco menos. Isso varia bastante. Quando atinjo meu objetivo principal nos aplicativos, desacelero e trabalho menos.
E em relação aos custos? Como você lida com o abastecimento do carro? Você tem um valor fixo que coloca todo dia?
Rodrigo: Esse é um ponto interessante. Eu até comento sobre isso nas redes sociais. Hoje, trabalho com etanol. Antes, meu carro usava GNV, e eu nunca deixava o tanque passar de meio.
Com o etanol, mantenho o mesmo hábito. Sempre completo o tanque quando ele está na metade, pois percebo que isso melhora a economia do carro. Às vezes, um meio tanque dura o dia todo. Em outras ocasiões, não chego a gastar um tanque inteiro. Isso depende do trânsito e da demanda dos apps.
Quando a demanda está alta e os aplicativos pagam mais, acabo rodando menos. Essa é minha estratégia: quando o aplicativo paga melhor, prefiro rodar menos e faturar mais por viagem.
Então, Rodrigo, minha próxima pergunta é em relação à sua maneira de trabalhar. Você é um motorista muito seletivo nas suas corridas? Só aceita viagens que pagam determinado valor por quilômetro? Como funciona isso para você?
Rodrigo: Essa é uma boa pergunta. Hoje, trabalho com um aplicativo da StopClub, que agora pertence ao Google. Desde que a StopClub idealizou esse aplicativo, achei a iniciativa e a proposta muito interessantes.
O que acontece? Temos um tempo muito curto para decidir se uma viagem vale a pena ou não, especialmente considerando a segurança. Graças a Deus, aqui em Recife, a questão da segurança não é tão crítica quanto em outras cidades, mas, mesmo assim, o tempo para decidir é muito curto. Antes, era preciso avaliar rapidamente o valor da viagem, se seria rentável, se o local de embarque permitia parar o carro com segurança e se haveria viagens disponíveis no destino para continuar trabalhando, ou se seria necessário se deslocar para outro ponto.
A complexidade de decidir sobre uma viagem em segundos é grande. Hoje, com os aplicativos, incluindo outros além do StopClub, temos ferramentas que fazem esses cálculos de ganhos automaticamente. Para o motorista, isso é essencial, pois permite economizar ao evitar viagens não rentáveis e tomar decisões mais rápidas. No UberX, por exemplo, o tempo para aceitar uma corrida é muito curto, enquanto no Comfort ou no Black é um pouco maior. No UberX, o card da corrida aparece e some rapidamente, então decidir rápido é fundamental.
Você trabalha com aplicativos desde 2016 ou 2017. Na sua opinião, antes era melhor? O aplicativo pagava melhor ou a diferença está nos gastos, como muitos motoristas alegam? Gostaria de ouvir sua opinião sobre isso.
Rodrigo: É exatamente isso. Quando comecei a dirigir por aplicativo, o trânsito em Recife já era caótico. Aqui, uma viagem de 2 km pode levar 30 a 40 minutos no horário de pico. Mas, naquela época, a gasolina custava cerca de R$ 3,00 e pouco.
Eu dirigia um Sandero Stepway com motor 1.6 e conseguia ganhar dinheiro com ele. Hoje, se eu tivesse o mesmo carro, não conseguiria. O combustível em Recife agora custa quase R$ 6,60. Então, provavelmente, eu estaria pagando para trabalhar. Se compararmos os ganhos de antes com os de hoje, eles praticamente não mudaram. Mas os custos aumentaram muito. Antes, dava para juntar dinheiro. Hoje, é mais difícil.
No início dos aplicativos, eu trabalhava menos e ainda conseguia um bom rendimento. Saía de manhã, voltava para casa à tarde, saía mais um pouco e depois voltava de novo. Não tinha o comprometimento que tenho hoje. Agora, saio de manhã e só volto à noite. Preciso trabalhar mais horas para ter um rendimento parecido com o de antes.
Por volta de 2019, cheguei ao meu limite financeiro. Eu tinha um Fiat Mobi e percebi que abastecia R$ 100 e mal conseguia rodar. Antes, R$ 50 eram suficientes para faturar R$ 100, mas, com o aumento dos custos, as contas não batiam mais. Foi aí que decidi vender o carro e comprar um Siena, que instalei com GNV. Com isso, comecei a respirar financeiramente e ver mais dinheiro entrando.
Mas não foi só isso. Eu também precisei entender melhor o funcionamento dos aplicativos. Hoje, considero um absurdo que um motorista precise de orientação para saber como trabalhar. No início, bastava ligar o app e dirigir. Agora, se você não entende como funciona o sistema, pode acabar tendo prejuízo. Os aplicativos mudaram de forma que, sem esse conhecimento, é fácil perder dinheiro.
Você recomenda a profissão para alguém que está pensando em começar como motorista de aplicativo?
Rodrigo: Recomendar, recomendar… Eu prefiro dizer que a pessoa deve estudar bem a possibilidade antes de mergulhar de cabeça nesse negócio. Algo que vejo muitos influenciadores falarem na internet, e com o qual concordo, é que se alguém quer entrar na atividade, o ideal é alugar um carro e fazer um teste. Assim, a pessoa pode avaliar se realmente vai se adaptar ao trabalho.
Muitos entram achando que vão ganhar R$ 1.000 por dia, mas, se chegarem com essa mentalidade, a frustração será grande. Alguns nem passam da primeira semana. Trabalhar como motorista de aplicativo não é tão fácil como muitos fazem parecer. Requer paciência, estratégia e um bom entendimento da cidade onde se trabalha. São muitos detalhes que precisam ser considerados para tomar boas decisões. Hoje, é muito difícil obter altos ganhos. O motorista acaba ralando muito para cobrir os custos e acaba com um lucro pequeno.
Para você, quais são as maiores dificuldades de ser motorista de aplicativo? E qual a sua maior dica para quem está começando?
Rodrigo: A maior dificuldade hoje é entender o funcionamento das plataformas. Cada aplicativo tem uma proposta diferente – Uber, 99 e outros – e o motorista precisa conhecer bem cada um.
Além disso, a segurança é uma grande preocupação. No carro ou na moto, ficamos muito vulneráveis. Pegamos passageiros sem saber quem são, e infelizmente há muitos casos de assaltos e até crimes mais graves. Esse é um risco constante na profissão.
Outra grande dificuldade são os ganhos. Como você mencionou, eles não acompanham a inflação. Os custos aumentam – combustível, manutenção, aluguel, plano de saúde, alimentação – mas os valores pagos pelos aplicativos continuam praticamente os mesmos. No Brasil, muitos motoristas usam os apps como renda principal, e isso torna o impacto dessa defasagem ainda maior.
E qual a sua dica para quem está começando nos aplicativos?
Rodrigo: Quando comecei, entrei de olhos fechados, sem um norte, sem ninguém para me orientar. Hoje, graças ao empenho de muitos motoristas, temos redes sociais repletas de informações úteis. Muitos compartilham experiências e dão dicas valiosas.
Minha recomendação para quem quer começar é pesquisar muito antes. No YouTube, no Instagram, há muitos motoristas que compartilham estratégias e explicam como funciona o dia a dia. Mas é importante lembrar que cada realidade é diferente. O que funciona para um motorista pode não funcionar para outro.
O fundamental é entender a sua cidade: quais horários têm mais movimento, quais áreas pagam melhor, onde há maior demanda. Por exemplo, aqui em Recife, ontem estava chovendo e uma região específica da cidade estava com um dinâmico alto. Como eu sabia que ainda havia empresas abertas por lá, concluí que havia demanda e me desloquei para essa área. Não dá para se iludir apenas com os valores dinâmicos, é preciso entender se realmente há passageiros na região.
Esses detalhes fazem toda a diferença. Você pode aprendê-los com o tempo ou trocando informações com outros motoristas. Assim como em qualquer profissão, é preciso estudar e se atualizar constantemente para se aperfeiçoar. Se eu voltasse a atuar na área de informática, precisaria estudar para me atualizar. O mesmo vale para ser motorista de aplicativo: quem não busca conhecimento acaba ficando para trás.