“Um app regional vale muito mais do que esses grandes como Uber e 99”, diz motorista 

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Motoristas e empresários defendem apps regionais sobre globais, citando como eles atendem melhor às necessidades específicas e às diferentes situações econômicas de cada região: “Qual é o valor que os motoristas aceitam receber?”

Nota de transparência: O portal 55content, assim como a Machine, pertencem à Gaudium, empresa citada na matéria.

Nos últimos anos, o Brasil tem testemunhado o nascimento e crescimento de uma nova tendência no setor de mobilidade urbana, apelidado carinhosamente como “Fábricas de Ubers”. Estas empresas se especializam em desenvolver e oferecer soluções tecnológicas que permitem a criação de aplicativos de transporte personalizados, atendendo às demandas específicas de diversas regiões do país. 

A equipe do 55content entrevistou Ricardo Góes, co-fundador e sócio-executivo da Gaudium. Esta empresa se especializa no desenvolvimento de soluções inovadoras para mobilidade. Seu produto principal, a Machine, é uma plataforma tecnológica que permite a empresários de todo o Brasil criarem seus próprios aplicativos de transporte, como táxi, moto táxi e carros particulares, ou de entregas por motoboys. A plataforma oferece a personalização com a logo da empresa, ajuste das tarifas e definição das próprias formas de operação. A conversa focou justamente no setor de mobilidade urbana.

Góes conta que a Gaudium começou como uma empresa de serviços, desenvolvendo muitos deles por encomenda. Clientes solicitavam softwares específicos e aplicativos variados, e a Gaudium atendia esses pedidos. No entanto, o desejo deles era encontrar um produto próprio, algo que se diferenciasse dos serviços prestados. 

“Começamos a fazer vários testes para encontrar o nosso produto, ou seja, algo que pudéssemos entregar para o mercado e que o mercado desejasse, que o mercado precisasse. O que chamamos de “tração” foi exatamente os aplicativos de mobilidade”, relembra o executivo. 

Ele relata que a oportunidade surgiu com os aplicativos de mobilidade, especialmente quando a Easy Taxi e a 99 Taxi começaram a operar no Brasil, por volta de 2012 e 2013. “As cooperativas de táxi sentiram a necessidade de competir com essas empresas e começaram a solicitar o desenvolvimento de aplicativos personalizados. Isso nos mostrou um nicho de mercado promissor, levando-nos a se especializar nessa área.”

O empreendedor explica que o principal desafio da área é entregar uma tecnologia de qualidade que compita com os grandes players do mercado, como a Uber e a 99. “Isso se deve à velocidade com que o mercado muda, à quantidade de recursos que eles têm para contratar desenvolvedores e à necessidade de acompanhar essa evolução rápida com uma tecnologia de ponta. Portanto, os aplicativos de transporte exigem uma tecnologia avançada, ou seja, não é um negócio simples de se fazer. A principal dificuldade que temos é como acompanhar essa velocidade com a qualidade necessária.”

“Quando você se propõe a entregar uma tecnologia para o seu cliente usar, permitindo que os passageiros façam corridas, isso não tem hora para acontecer. As corridas ocorrem a qualquer hora do dia ou da noite, então não há espaço para a tecnologia ficar fora do ar, nem para dizermos que vamos fazer uma manutenção e deixar o sistema inoperante durante uma hora. Não é possível fazer isso. O sistema não pode apresentar bugs, porque, se tiver bugs, afeta o relacionamento do nosso cliente com o cliente dele. Precisamos desenvolver em uma velocidade enorme, com bem menos recursos que os grandes players e com uma qualidade tão boa quanto a deles”, completa. 

Para mensurar a qualidade da tecnologia em relação a concorrência, Góes explica que há os concorrentes diretos da Machine, que são outras empresas, e há os concorrentes indiretos, como a Uber e a 99, que concorrem com o clientes da Machine. 

“Não procuramos avaliar nossa qualidade em relação aos nossos concorrentes diretos, mas sim aos indiretos, porque o padrão deles é muito mais alto. Se conseguirmos fazer com que nossa tecnologia seja tão boa ou melhor que a deles, nossos clientes terão sucesso. Avaliamos isso através do feedback do nosso próprio cliente. Ele chega para nós e diz: isso não está bom, isso está muito bom. Lembrando que desenvolvemos uma plataforma para aplicativos regionais; nosso compromisso não é seguir tudo que a Uber e a 99 lançam de tecnologia ou funcionalidade, porque às vezes isso não é útil para o nosso cliente regional. Da mesma forma, pode ser que nosso cliente regional precise de algo que só nós temos. Por exemplo, introduzimos uma funcionalidade de selecionar um motorista favorito muito antes da Uber e da 99 testarem isso”, afirma o empreendedor. 

Além disso, Góes diz que a Machine entrega funcionalidades que, embora negligenciadas pelos líderes de mercado, são importantes para seus clientes regionais. Segundo ele, esse desafio não é trivial nem fácil, considerando que a tecnologia em questão exige alta disponibilidade devido à grande demanda e ao volume substancial de requisições que não podem resultar em lentidão ou paralisações do sistema. 

“O maior desafio é como entregar tudo o que o mercado exige sem comprometer a qualidade. A Uber e a 99 possuem uma plataforma estável,  pois quando o passageiro precisar de um carro, ele não pode ser informado de que não é possível solicitar um carro naquele momento. Já o maior desafio da operação é contratar bons desenvolvedores e assegurar que trabalhem dentro de um processo de desenvolvimento adequado, que garanta a entrega de funcionalidades com qualidade. Esses são os desafios enfrentados”. 

Questionado sobre as tendências do setor, o executivo acredita que há várias tendências emergentes notáveis, tais como carros autônomos, carros elétricos e inteligência artificial, que estão chamando a atenção de todos: 

“É difícil avaliar terá mais impacto, mas é certo que elas transformarão o cenário e abrirão novas oportunidades. E ainda vou incluir mais uma inovação, que é essa questão da profissionalização do mercado. Estou me referindo especificamente à legislação em tramitação no Congresso Nacional, que busca profissionalizar o mercado de condutores e motoristas autônomos. Isso proporcionará segurança jurídica e, sem dúvida, atrairá mais investimentos para o setor. O cenário é positivo, na minha opinião, muita tecnologia bacana e uma profissionalização. Os motoristas estão se tornando cada vez mais profissionais, as centrais que trabalham conosco estão cada vez mais profissionais. Então eu vejo um futuro positivo em termos de inovação tecnológica e de negócios”, avalia.

Para finalizar, Góes afirma que gosta do modelo de apps regionais. “Eu acho que ele é um modelo mais forte que o modelo dos aplicativos globais. Porque eu entendo que cada região do país contém singularidades, necessidades 4 pequenas nuances que precisam ser endereçadas para que a gente tenha uma boa prestação de serviço. Por exemplo, determinadas regiões têm um padrão de vida mais caro. Outras regiões têm um padrão de vida menor. Qual é o valor que os motoristas aceitam receber?”, questiona. 

Ele explica que ao tentar estabelecer preços de maneira muito generalizada e definir modelos operacionais igualmente genéricos sem um conhecimento profundo sobre uma cidade, surgem desafios, especialmente no Brasil, que possui mais de 5 mil municípios. O empresário questiona como uma empresa global pode atender às necessidades específicas de cada um desses município

“O dono de um app regional consegue ser um canal de comunicação com os motoristas e com os passageiros da cidade dele. Ele entende as nuances e consegue configurar isso de uma maneira muito melhor para atender às necessidades daquela cidade. Então, eu acredito muito nos modelos de aplicativos regionais como sendo melhores, tanto para os passageiros quanto para os motoristas. Inclusive mantém a circulação do dinheiro dentro também daquela própria cidade, movimentando a economia local”, concluiu Góes. 

Márcio Milani é um dos clientes da Machine e dono de um aplicativo regional de mobilidade. O empreendedor foi entrevistado pela equipe do 55content e nos contou a história da sua plataforma, WIN CARS: 

“Sou advogado há mais de 20 anos, e além da minha prática jurídica, também atendo pequenos e médios empresários. Em 2019, um de meus clientes me propôs criar um negócio na área de tecnologia, que não apenas nos proporcionasse uma aposentadoria no futuro, mas que também beneficiasse a população de alguma forma. Aceitei o desafio e comecei a pesquisar possíveis oportunidades. Nessa busca, percebi que a mobilidade urbana era um problema, especialmente porque os serviços existentes, como Uber e 99, cobravam taxas muito altas dos motoristas, chegando a 30% ou 40%”, explica Milani. 

“Diante disso, tive a ideia de criar um negócio que poderia ser uma franquia focada em tecnologia para ajudar na mobilidade e ao mesmo tempo ser economicamente viável para os motoristas. Apresentei a proposta para meu cliente e começamos a trabalhar com a Machine. Tentei estabelecer uma parceria com Fernando Uber Floripa, um influenciador conhecido no setor, e até nos encontramos em Florianópolis no final de 2019 para discutir a colaboração. Infelizmente, por questões comerciais e a chegada da pandemia, a parceria não se concretizou. Mesmo com esses obstáculos, já tínhamos o projeto do aplicativo pronto e decidimos lançá-lo em Santa Catarina. Foi assim que nasceu a WIN CARS, uma iniciativa que visava transformar o mercado de mobilidade urbana, oferecendo melhores condições para os motoristas e serviços de qualidade para a população”, conclui. 

No entanto, ele disse que enfrentou e enfrenta desafios para manter o app em operação. Ele afirma que cobra uma taxa de 9% dos motoristas e para captar passageiros, investiu em marketing digital, promovendo preços competitivos para eles e uma taxa vantajosa para os motoristas, buscando o equilíbrio entre oferta e demanda. 

“A realidade mostrou-se mais complexa. Os motoristas, percebendo que não estamos entre os gigantes como Uber ou 99, pedem mais benefícios do que aquelas que não têm nesses serviços já estabelecidos. Essa expectativa contínua de mais benefícios se tornou um desafio. Por mais que tentemos agradá-los, parece nunca ser suficiente. Embora ofereçamos um atendimento humano e suporte próximos, competir com a notoriedade de aplicativos como Uber e 99 é uma luta devido à resistência dos usuários em adotar um novo aplicativo”, lamenta. 

“Outro desafio é equilibrar os interesses divergentes dos motoristas e passageiros, algo que seria menos problemático em negócios simples, como vender lanches. Aqui, lidamos com duas partes com expectativas diferentes, e encontrar um meio termo é desafiador. Além disso, a colaboração com a Machine, nossa plataforma de mobilidade, exige investimentos que ainda não geraram lucro. O projeto é de longo prazo, e reinvestimos toda a receita em melhorias, com o lucro ficando em segundo plano, mas esperamos estabelecer um negócio rentável e sustentável”, explica. 

O CEO reafirma que é complicado equilibrar os interesses dos motoristas e dos passageiros. Ele ressalta que no caso da Uber, eles oferecem preços muito baixos que, embora agradem os passageiros, acabam sendo desfavoráveis para os motoristas. A abordagem da WIN CARS é cobrar mais dos passageiros para ser uma plataforma mais justa com os motoristas: 

“Por exemplo, numa corrida curta onde a Uber cobra R$ 8,00 e o motorista recebe R$ 6,00, nós teríamos que cobrar algo como R$ 12,00 para poder pagar ao motorista cerca de R$ 11,00 ou R$ 10,00. Isso cria um desafio constante de encontrar um meio termo: não podemos cobrar tão barato quanto a Uber, o que frequentemente deixa os passageiros um pouco insatisfeitos, mesmo que ressaltamos a qualidade do serviço e a atenção dos nossos motoristas”, exemplifica o advogado. 

Porém, Milani sabe que muitos de seus motoristas também trabalham com a Uber e a 99: “nossos motoristas também dirigem para a Uber e a 99, e não têm tempo para oferecer diferenciais além de uma balinha, que fornecemos. Os passageiros, muitas vezes, preferem pagar menos a receber pequenos mimos como balas. Eles veem o transporte simplesmente como um meio de ir do ponto A ao ponto B.”

Para mitigar isso, Milani diz que negocia com os motoristas para que não cancelem corridas, já que os passageiros estão pagando mais. Segundo ele, o índice de cancelamento é baixo, e isso é um ponto positivo, mas é também uma concessão para fazer com que o sistema funcione sem aumentar muito os preços. “Em São Francisco, por exemplo,  onde a WIN CARS tem mais de 150 motoristas para uma população de 50 mil, a resposta e o atendimento da plataforma são rápidos, o que é uma vantagem para o passageiro que valoriza a rapidez”, revela.

“Somos a segunda opção. Se a Uber demora, os passageiros recorrem à WIN CARS como alternativa. Portanto, enquanto tentamos equilibrar os preços para manter os motoristas satisfeitos e garantir a viabilidade do nosso aplicativo, continuamos enfrentando o desafio de ser vistos como uma alternativa secundária em comparação com os grandes nomes do mercado”, conclui Milani. 

Milani também conta que outro desafio é determinar a cidade que irá operar. Inicialmente, o empreendedor pensou que seria mais fácil entrar em grandes cidades, mas a realidade mostrou que é necessária uma abordagem mais robusta para ter sucesso: “hoje, com a existência de várias outras plataformas de mobilidade, mesmo em cidades menores, a competição é intensa, dificultando tanto para nós quanto para os passageiros escolherem entre as opções disponíveis.”

Inicialmente, Márcio e seu sócio contavam com um investidor que contribuiu com um montante para tentar se estabelecer simultaneamente em Joinville, Blumenau e Florianópolis. Apesar do grande investimento, não conseguiram consolidar o aplicativo nessas cidades maiores como esperavam. 

A virada ocorreu quando um motorista de São Francisco do Sul, uma cidade menor no interior, entrou em contato com eles após ver a publicidade em Joinville. Ele propôs trazer o aplicativo para sua cidade, comprometendo-se a reunir outros motoristas que usariam exclusivamente o serviço deles. Essa experiência mostrou que o ideal seria focar em cidades menores, onde poderiam realmente competir com os grandes do mercado.

“Hoje, se alguém me perguntasse sobre os próximos passos da WIN CARS, eu diria que não estão em expansão para cidades maiores. Planejamos entrar em cidades similares a São Francisco do Sul, com populações entre 50 mil e 80 mil habitantes. Esse tamanho permite um consumo e investimento moderados, além de podermos contar com o apoio ativo dos motoristas. Eles teriam o papel crucial de informar a população local sobre a chegada da WIN CARS, consolidando nossa presença de maneira eficaz. Essa é a estratégia que estamos seguindo para expandir nosso alcance e fortalecer nossa marca”, planeja Milani. 

A equipe do 55content conversou com Paulo Cesar Pires, de São Francisco do Sul, e que é motorista da WIN CARS. Ele afirma que é um ótimo aplicativo: 

“As outras plataformas, como a 99 e Uber, não oferecem para nós — e estou falando no plural — o que muitos motoristas da cidade consideram importante. Já estou há mais de dois anos trabalhando com eles e, sinceramente, não há como não afirmar que o aplicativo é muito bom. Ele oferece uma ótima remuneração, mas não se trata apenas disso. O atendimento é excelente. É a primeira vez que vejo um aplicativo no Brasil que possui um setor operacional na cidade, com uma equipe que faz chamadas via WhatsApp. Eles lançam as corridas para nós e isso ajuda demais na divulgação. Aqui em São Francisco do Sul, onde trabalho, não preciso ir para outra cidade. Se eu levar um passageiro para uma cidade vizinha, posso retornar para minha cidade sem esperar por outra corrida. Como dizemos, “batendo lata”, há sempre mais corridas disponíveis para mim aqui. Também atendemos em outras cidades, se necessário”. 

“Em relação à Uber e à 99, acho que o grande diferencial da WIN CARS não é apenas a taxa baixa que eles cobram, mas o valor que o cliente paga. A maioria dos clientes, se não todos, em São Francisco do Sul dizem que é justo, porque há um atendimento muito melhor e, em contrapartida, o motorista é bem remunerado, algo que é raro nas outras plataformas”, completa Pires. 

O motorista diz que os trabalhadores sempre dirigem tranquilos. Segundo ele, na Uber e na 99, “você tem que se esticar ao máximo”. Na WIN CARS eles conseguem fazer corridas prazerosas, atender bem o cliente e ganhar sua confiança. Paulo diz ainda que muitos clientes pedem especificamente por motoristas que os atenderam bem anteriormente.

“Atualmente, para ser sincero, acho que a melhor coisa que a WIN CARS oferece é a flexibilidade e a versatilidade tanto para atender o cliente quanto o motorista. Agora, sabemos que haverá uma iniciativa de inclusão social que atrai mais clientes e proporcionará descontos no aplicativo, o que nos beneficiará muito. Hoje em dia, a WIN CARS é a nossa primeira opção aqui em São Francisco do Sul. Quase todos os clientes que atendemos têm empatia pelo serviço. Além disso, temos vários canais de comunicação como WhatsApp para diferentes departamentos, o que facilita muito e nos faz sentir tratados como pessoas, não como robôs, diferentemente de outros aplicativos. Portanto, para mim, um aplicativo regional vale muito mais do que esses grandes aplicativos internacionais como Uber e 99”, conclui o motorista.

Já Oseias Santana, dono do aplicativo regional Rota 77, é outro cliente da Machine. Ele relembra o começo de sua história em Belém do Pará, contando sobre suas experiências nas chamadas “profissões de orelha”, que não são formalmente reconhecidas. Nascido em Belém, Oseias não possui diploma em muitas das áreas em que atua, mas tem vasto conhecimento adquirido através de vários cursos. Apesar de ser formado em administração, ele também é operador de máquinas pesadas e eletricista, entre outras habilidades.

Sua jornada profissional o levou a viajar extensivamente pelo Brasil, resultando em uma mudança para Nova Mutum, no Mato Grosso, onde ele foi testado e posteriormente assumiu a gestão de uma fábrica de silos e secadores de grãos. Lá, ele ficou satisfeito com o salário oferecido, mas hoje brinca que subvalorizava essa profissão, agora mais reconhecida. Antes de embarcar na criação do Rota 77, Oseias frequentemente utilizava aplicativos como a Uber e até provocava seu antigo chefe sobre a dependência da plataforma.

Trabalhando como motorista de rua por cerca de três a quatro meses, Oseias e sua esposa exploraram a ideia de que dirigir poderia ser lucrativo. Consequentemente, ele se juntou a dois rapazes para entender como funcionava a plataforma de transportes, levando à criação do Rota 77. Um desses colegas, que tinha mais tempo livre e formação em administração no sul do Brasil, ajudou significativamente no processo, tornando-se cofundador.

Juntos, eles escolheram e implementaram a plataforma adequada para o Rota 77, comprando os direitos e contratando um profissional para criar o logo. Hoje, o Rota 77 opera não apenas em Nova Mutum, mas também nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, com planos de expansão para mais regiões do Mato Grosso.

Questionado sobre as maiores dificuldades em administrar um app de mobilidade, Oseias Santana, explica que além de expandir a marca, foi fazer com que a própria população entendesse como funciona o serviço. “Há uma resistência cultural significativa porque, muitas vezes, o brasileiro prefere o ‘jeitinho brasileiro'”. Ele explica que há pessoas que pensam que chamar pelo WhatsApp seja mais barato e não entendem a mecânica da plataforma. “Querem ligar diretamente para o motorista esperando que ele faça a corrida fora do app, o que não é como nosso serviço funciona”, relata Oseias. Ele destaca que é crucial “educar os motoristas para que eles orientem os passageiros a usar o aplicativo”.

Oseias também relembra os desafios do timing do lançamento. “Outra grande dificuldade foi o timing do lançamento em torno de outubro ou novembro de 2019, pois em 2020 a pandemia explodiu.” Ele questiona, “Como crescer em um período onde o conselho geral era para as pessoas ficarem em casa, enquanto nosso trabalho depende justamente do movimento delas?” Para driblar essa dificuldade, eles incentivaram as pessoas, de forma responsável, a ficarem em casa, mas também atenderam àqueles que precisavam sair, seja para ir ao mercado ou para viagens essenciais a cidades vizinhas. “Apesar de pequenos na época, tentamos fazer o máximo para evitar conflitos com as recomendações de saúde pública, adotando uma política de cuidados que refletia a seriedade da situação”, enfatiza.

“A nossa ideia era ser um diferencial”, afirma Oseias. Ele menciona que o passageiro que usa o aplicativo já conhece outras opções como a Uber e o 99, que são as duas grandes plataformas na cidade. “A dificuldade é fazer entender o que diferencia o nosso serviço desses outros, já que muitos dos nossos motoristas também trabalham nessas plataformas. O que ofereço de diferente para fazer um passageiro escolher nosso aplicativo ao invés de outro?” Ele pondera que essa é a grande questão e o desafio que enfrentam, especialmente agora que existem cerca de 30 aplicativos diferentes na cidade.

Perguntamos para Oseias qual seria o benefício para um motorista rodar pelo Rota 77: “o principal benefício para o motorista seria o sistema humanizado, que ele consegue falar conosco quando quiser, e essa transparência sobre o que ele está pagando para a plataforma, certo?” destaca Oseias. Ele ressalta que, diferentemente de grandes plataformas como a Uber e o 99, onde a proximidade ou transparência são limitadas, a Rota 77 oferece um serviço pré-pago claro e direto. “Isso permite ao motorista saber exatamente o que está pagando e ter a garantia de suporte sempre que necessário. Valorizamos bastante um sistema humanizado onde o motorista não se sente apenas mais um número.”

Reflectindo sobre as experiências em grandes cidades e filiais em Balsas, no Maranhão, e Brusque, no sul do Brasil, Oseias observa que muitos motoristas, apesar das reclamações, parecem se acomodar à dinâmica das grandes plataformas, aceitando uma relação que pode parecer exploratória. “Isso torna ainda mais desafiador para nós convencê-los a mudar para um sistema que consideramos mais justo e vantajoso.”

Um dos principais diferenciais que Oseias oferece aos passageiros é a diversidade de motoristas, alinhada com suas preferências pessoais. Ele também possui uma empresa de proteção veicular, beneficiando diretamente os motoristas que colaboram com a Rota 77. “Isso garante a segurança e o rastreamento de seus veículos”, explica. “Isso também reflete na qualidade do serviço que oferecemos aos passageiros, pois temos um compromisso com valores éticos, como não explorar nossos motoristas e sempre garantir que haja um veículo disponível perto do passageiro.”

Além disso, ele enfatiza a importância da segurança. “Na nossa plataforma, exigimos que cada motorista inclua o seguro APP em sua apólice, que é um seguro de vida também para o passageiro. Isso garante a segurança de todos em caso de acidentes graves, protegendo o motorista de perder sua ferramenta de trabalho, o carro, e cobrindo eventuais despesas.”

O CEO ainda explica que como os motoristas são cobrados: “bom, quando abrimos uma filial em uma nova cidade inicialmente não cobramos nada do motorista até que haja um fluxo de corridas suficiente para justificar a cobrança”, explica Oseias Santana. “A ideia é que o motorista só comece a pagar quando o movimento de corridas for estabelecido. Mas isso se aplica apenas à abertura de uma cidade. Se o motorista entrar em uma cidade onde o aplicativo já está operando, ele precisa começar a pagar imediatamente.”

A cobrança, conforme Oseias detalha, seria de cerca de 100 reais, que inclui custos de divulgação e manutenção da plataforma. “Utilizamos o sistema do banco Asas, que permite cobranças recorrentes, e monitoramos os pagamentos através do dashboard do grupo Asas. Se um motorista se tornar inadimplente, damos a ele 30 dias para regularizar sua situação. Em algumas cidades, ele paga 400 reais e tem 30 dias para trabalhar livremente com todo o valor arrecadado nas corridas sendo dele.”

Oseias também menciona que essa taxa varia de cidade para cidade e destaca a proximidade do vencimento: “Quando faltarem 5 dias para o vencimento do boleto, o banco envia um link para pagamento e emite um lembrete no dia do vencimento. Se o pagamento não for efetuado em 24 horas, suspendemos o cadastro.”

“Hoje, graças a Deus, estamos obtendo lucro. Estamos considerando a possibilidade de franquear o negócio, o que tornaria a gestão mais fácil para nós”, revela. “Chega um momento que o crescimento demanda que você delegue funções e divida responsabilidades para manter a qualidade de vida, como poder tirar férias, por exemplo.”

Ele menciona a parceria com o Sebrae: “Temos uma parceria com o Sebrae que nos auxilia nisso, o que é crucial pois as franquias geralmente têm um custo alto. Este ano, estamos planejando expandir por meio de franquias.”

“Estamos abertos a negociações com futuros parceiros. Hoje, trabalhamos com gestores locais em cada cidade, que atuam quase como franqueados, embora ainda não oficializamos franquias”, diz Oséias. “Eles recebem treinamento sobre como gerenciar a carteira de motoristas e têm um contrato de uso da marca conosco, que pode variar de um a dois anos, até 36 meses. Estamos no processo de formalizar franquias para centralizar ainda mais o sistema.” Ele finaliza, indicando que para mais detalhes ou para negociar, eles disponibilizam um e-mail específico para futuros parceiros.

A equipe da 55content entrevistou dois motoristas do Rota 77 para entender, na perspectiva de quem trabalha todos os dias, as vantagens de se trabalhar em um aplicativo regional.

“Trabalho em Nova Mutum e aqui não tem Uber e 99, mas fui informado que eles trabalham em cima das porcentagem das corridas. Dentre os apps regionais da cidade, eu prefiro o Rota 77. Um dos grandes diferencias da plataforma é o suporte 24 horas e escritório fixo para pequenas reuniões onde todas dúvidas são sanadas presencialmente. Minha única questão é em relação a quantidade de motoristas: se eles tivessem um limite no que se refere a quantidade de motoristas cadastrados seria bem melhor de acordo com a povoação da cidade”, relata José Cícero Tenório. 

“O Rota 77 é um patrimônio da cidade, nós, motoristas, trabalhamos bem e felizes. É possível viver com dignidade”, relata o motorista Vilson José da Silva.

Por fim, a equipe do 55content também entrou em contato com o especialista em mobilidade urbana, Diego Benegas sobre o impacto da proliferação dos apps de transporte nas cidades. O profissional fez alguns alertas: 

“A proliferação de aplicativos de transporte pode aumentar o tráfego de veículos, gerando congestionamentos nas vias, especialmente se não houver uma regulamentação adequada para limitar o número de veículos de transporte de passageiros nas ruas. Além disso, a competição acirrada entre os aplicativos pode resultar em uma corrida por preços mais baixos, afetando negativamente a renda dos motoristas e a qualidade do serviço. Também pode haver uma redução na utilização de transportes públicos, o que pode afetar a sustentabilidade financeira desses sistemas e aumentar a exclusão social para aqueles que dependem deles”, explica. 

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Giulia Lang

Giulia Lang é líder de conteúdo do 55content e graduada em jornalismo pela Fundação Cásper Líbero.

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